Posted by : Unknown junho 06, 2014

Capítulo 8


Não demorou nada e a Defesa contra as Artes das Trevas se tornou a matéria favorita da maioria dos estudantes. Somente Draco Malfoy e sua patota de alunos da Sonserina tinham alguma coisa de ruim a dizer do Profº. Lupin.
— Olha só as vestes dele — Malfoy dizia num sussurro bem audível quando o professor passava. — Ele se veste como um velho elfo doméstico.
Mas ninguém mais se importava se as vestes de Lupin eram remendadas e esfiapadas. Suas aulas seguintes tinham sido tão interessantes quanto a primeira. Depois dos bichos-papões, eles estudaram os "barretes vermelhos", criaturinhas malvadas que lembravam duendes e rondavam os lugares onde houvera derramamento de sangue, masmorras de castelos e valas dos campos de batalha desertos à espera de abater a porrete os que se perdiam. Dos barretes vermelhos eles passaram aos kappas, seres rastejantes das águas, que lembravam macacos com escamas, palmípedes cujas mãos comichavam para estrangular os banhistas desavisados que penetravam seus domínios.
Harry só desejava que fosse tão feliz com outras matérias. A pior delas era Poções. Snape andava com uma disposição bem vingativa ultimamente, e ninguém tinha dúvidas do que motivara isso. A história do bicho-papão que assumira a forma dele, e a maneira com que Neville o vestira com as roupas da avó, correra a escola como fogo espontâneo. Snape não parecia ter achado graça. Seus olhos faiscavam ameaçadoramente à simples menção do nome de Lupin e ele andava implicando com Neville mais do que nunca.
Harry também estava começando a temer as horas que passava na sala sufocante da Profª. Sibila, decifrando formas e símbolos enviesados, tentando fingir que não via os olhos da professora se encherem de lágrimas todas as vezes que olhava para ele. Não conseguia gostar de Sibila, embora ela fosse tratada, por muitos alunos da turma, com um respeito que beirava a reverência. Parvati Patil e Lilá Brown passaram a rondar a torre da professora na hora do almoço, e sempre voltavam com irritantes ares de superioridade, como se soubessem de coisas que os outros desconheciam. Tinham começado também a usar um tom de voz abafado sempre que falavam com Harry, como se estivessem em seu velório.
Ninguém gostava realmente de Trato das Criaturas Mágicas que, depois da primeira aula repleta de ação, tornara-se extremamente monótona. Hagrid parecia ter perdido a confiança em si mesmo. Os alunos agora passavam aula após aula aprendendo a cuidar de vermes, que eram uma das espécies de bichos mais chatas que existem no mundo, e não era por acaso.
— Por que alguém se daria o trabalho de cuidar deles? — exclamou Rony, depois de mais de uma hora enfiando alface fresca picada pela goela escorregadia dos vermes.
No início de outubro, porém, Harry teve algo com que se ocupar, algo tão prazeroso que mais do que compensou as aulas chatas. A temporada de Quadribol se aproximava e Olívio Wood, capitão do time da Grifinória, convocou uma reunião para uma noite de quinta-feira com a finalidade de discutirem as táticas que adotariam na nova temporada.
Havia sete jogadores num time de Quadribol: três artilheiros, cuja função é marcar gol fazendo a goles (uma bola vermelha do tamanho de uma bola de futebol) passar por um aro no alto de uma baliza de quinze metros de altura fincada em cada extremidade do campo; dois batedores, armados com pesados bastões para repelir os balaços (duas bolas pretas maciças que voavam para todos os lados tentando atacar os jogadores); um goleiro, que defendia as balizas e um apanhador, que tinha a função mais difícil de todas, a de capturar o pomo de ouro, uma bolinha alada do tamanho de uma noz, cuja captura encerrava o jogo, e garantia para o time do apanhador cento e cinqüenta pontos a mais.
Olívio era um rapaz forte de dezessete anos, agora no sétimo e último ano de Hogwarts. Tinha uma espécie de desespero silencioso na voz quando se dirigiu aos seis companheiros de equipe nos gelados vestiários, localizados nas pontas do campo de Quadribol, agora quase escuro.
— Esta é a nossa última chance, minha última chance, de ganhar a Taça de Quadribol — disse andando para lá e para cá diante dos colegas. — Vou-me embora no fim deste ano. Nunca mais terei outra oportunidade. Grifinória não ganha a taça há sete anos. Tudo bem, tivemos o maior azar do mundo, acidentes, depois o cancelamento do torneio no ano passado... — Olívio engoliu em seco como se aquela lembrança ainda lhe desse um nó na garganta. — Mas também sabemos que temos o time... Melhor... Mais irado... Da escola — disse ele, dando um soco na palma da mão, o velho brilho obsessivo nos olhos. — Temos três artilheiros da melhor qualidade.
Olívio apontou para Alicia Spinnet, Angelina Johnson e Katie Bell. — Temos dois batedores imbatíveis.
— Pode parar, Olívio, você está encabulando a gente — disseram Fred e Jorge juntos, fingindo corar.
— E temos um apanhador que até hoje nunca deixou de nos levar à vitória nas partidas que jogamos — falou Olívio em tom retumbante, encarando Harry com uma espécie de orgulho ardoroso. — E temos a mim — acrescentou, pensando melhor.
— Nós também achamos você muito bom Olívio. — disse Jorge.
— Um goleiro do caramba! — disse Fred.
— A questão é — continuou Olívio retomando a caminhada — que a Taça de Quadribol devia ter tido o nome do nosso time gravado, nesses dois últimos anos. Desde que Harry se juntou a nós, achei que a taça já estava no papo. Mas não ganhamos, e este ano é a última chance que teremos de finalmente ver o nosso nome na taça...
Olívio falou tão desolado que até Fred e Jorge o olharam com simpatia.
— Olívio, este ano é o nosso ano — animou-o Fred.
— Vamos conseguir, Olívio! — disse Angelina.
— Sem a menor dúvida — confirmou Harry.
Cheio de determinação, o time começou os treinos, três noites por semana. O tempo estava ficando mais frio e mais úmido, as noites mais escuras, mas não havia lama nem vento nem chuva que pudesse empanar a visão maravilhosa de Harry de finalmente ganhar a enorme Taça de Quadribol de prata.
Harry voltou à sala comunal da Grifinória certa noite depois do treino, enregelado, os músculos endurecidos, mas satisfeito com o aproveitamento do treino, e encontrou a sala mergulhada num vozerio excitado.
— Que foi que aconteceu?— perguntou ele a Rony e Hermione, que estavam sentados em duas das melhores poltronas ao lado da lareira terminando uns mapas estelares para a aula de Astronomia.
— Primeiro fim de semana em Hogsmeade — respondeu Rony, apontando para uma nota que aparecera no escalavrado quadro de avisos. — Fim de outubro. Dia das Bruxas.
— Ótimo — comentou Fred que seguira Harry na passagem pelo buraco do quadro. — Preciso visitar a Zonko"s. Meus chumbinhos fedorentos estão quase no fim.
Harry se atirou em uma cadeira ao lado de Rony, sua animação esfriando. Hermione pareceu ler seus pensamentos.
— Harry tenho certeza de que você vai poder ir na próxima visita — disse a garota. — Vão acabar pegando o Black logo. Ele já foi avistado uma vez.
— Black não é louco de tentar alguma coisa em Hogsmeade — argumentou Rony. — Pergunte a McGonagall se você pode ir Harry, a próxima vez talvez demore um tempão para acontecer...
— Rony! — exclamou a garota. — Harry tem que ficar na escola...
— Ele não pode ser o único aluno de terceiro ano que vai ficar — disse Rony. — Pergunta a McGonagall, anda, Harry...
— É, acho que vou perguntar — disse Harry se decidindo. Hermione abriu a boca para protestar, mas naquele instante Bichento pulou com leveza em seu colo. Trazia uma enorme aranha morta pendurada na boca.
— Ele tem que comer isso na frente da gente? — perguntou Rony aborrecido.
— Bichento inteligente, você apanhou a aranha sozinho? — perguntou Hermione.
Bichento mastigou a aranha vagarosamente, os olhos amarelos fixos insolentemente em Rony.
— Vê se ao menos segura ele aí — disse Rony irritado, voltando a atenção para o seu mapa estelar. — Perebas está dormindo na minha mochila.
Harry bocejou. Queria realmente ir se deitar, mas ainda tinha o mapa para terminar. Puxou a mochila para perto, tirou um pergaminho, tinta e caneta e começou a trabalhar.
— Pode copiar o meu, se quiser — ofereceu Rony, escrevendo o nome da última estrela com um floreio e empurrando o mapa para Harry.
Hermione, que desaprovava colas, contraiu os lábios, mas não disse nada. Bichento continuava a mirar Rony sem piscar, agitando a ponta do rabo peludo. Então, sem aviso, atacou.
— AI! — berrou Rony, agarrando a mochila na hora em que Bichento enterrava nela as garras das quatro patas e começava a sacudi-la furiosamente. – DÊ O FORA DAI SEU BICHO BURRO!
Rony tentou arrancar a mochila das garras de Bichento, mas o gato não a largava, bufando e unhando.
— Rony, não machuca ele! — gritou Hermione; toda a sala observava; Rony girou a mochila, Bichento continuou agarrado, e Perebas saiu voando pela abertura...
— SEGURE ESSE GATO! — berrou Rony quando Bichento se desvencilhou dos restos da mochila e saltou para a mesa perseguindo o aterrorizado Perebas.
Jorge Weasley deu um salto na direção de Bichento mas errou; Perebas disparou entre vinte pares de pernas e sumiu embaixo de uma velha cômoda. Bichento parou derrapando, se abaixou o mais que pôde nas pernas arqueadas e começou a fazer furiosas investidas com a pata dianteira no vão da cômoda.
Rony e Hermione correram para acudir; Hermione agarrou Bichento pelo meio e carregou-o para longe; Rony se atirou no chão de barriga para baixo e, com grande dificuldade, puxou Perebas para fora pelo rabo.
— Olha só para ele! — gritou o garoto furioso para Hermione, balançando Perebas diante da amiga. — Está pele e osso! Segura esse gato longe dele!
— Bichento não entende que isso é errado! — defendeu-o Hermione, a voz trêmula. — Todos os gatos caçam ratos, Rony!
— Tem uma coisa esquisita nesse animal! — acusou Rony, que estava tentando persuadir um Perebas, que se contorcia freneticamente, a voltar para dentro do seu bolso. — Ele me ouviu dizer que Perebas estava na mochila!
— Ah, deixa de bobagem — retrucou a garota. — Bichento sabe farejar, Rony, de que outro modo você acha...
— Esse gato está perseguindo o Perebas! — disse Rony, fingindo não ver os colegas em volta, que começavam a dar risadinhas abafadas. — E Perebas estava aqui primeiro, e está doente!
Rony atravessou a sala decidido e desapareceu na subida da escada para os dormitórios dos garotos.
Rony continuou de mal com Hermione no dia seguinte. Quase não falou com a garota durante a aula de Herbologia, embora ele, Harry e Hermione estivessem trabalhando juntos na mesma tarefa.
— Como é que vai o Perebas? — perguntou Hermione timidamente enquanto colhiam gordas vagens rosadas das plantas e esvaziavam seus feijões luzidios em um balde de madeira.
— Está escondido no fundo da minha cama tremendo — respondeu Rony com raiva, errando o balde e espalhando feijões pelo chão da estufa.
— Cuidado, Weasley, cuidado! — exclamou a Profª. Sprout quando os feijões desabrocharam diante dos olhos de todos.
A aula seguinte era Transformação. Harry, que resolvera perguntar à Profª. McGonagall depois da aula se podia ir a Hogsmeade com os colegas, entrou na fila do lado de fora da sala tentando decidir como é que iria defender o seu caso. Foi distraído, porém, por uma confusão no início da fila.
Pelo jeito, Lilá Brown estava chorando. Parvati abraçava-a, e explicava algo a Simas e Dino, que pareciam muito sérios.
— Que foi que aconteceu, Lilá? — perguntou Hermione, ansiosa, quando ela, Harry e Rony se reuniram ao grupo.
— Ela recebeu uma carta de casa hoje de manhã — sussurrou Parvati. — Foi o coelho dela, Bínqui. Foi morto por uma raposa.
— Ah — disse Hermione sinto muito, Lilá.
— Eu devia ter imaginado! — exclamou Lilá, tragicamente. — Você sabe que dia é hoje?
— Hum...
— Dezesseis de outubro! "Essa coisa que você receia, vai acontecer na sexta-feira, 16 de outubro!" Lembram? Ela estava certa, ela estava certa!
A turma inteira agora rodeava Lilá. Simas sacudia a cabeça, sério. Mione hesitou; em seguida perguntou:
— Você receava que Bínqui fosse morto por uma raposa?
— Bem, não necessariamente por uma raposa — respondeu Lilá, erguendo os olhos, dos quais as lágrimas escorriam sem parar —, mas obviamente eu receava que ele morresse, não é?
— Ah — exclamou Hermione. Ela fez outra pausa. E depois... — Bínqui era um coelho velho?
— N... Não! — soluçou Lilá. — A... Ainda era um bebezinho!
Parvati apertou o abraço que dava em Lilá.
— Mas, então, por que você tinha receio que ele morresse? — perguntou Hermione.
Parvati fez uma cara feia para a colega.
— Bem, vamos encarar isso logicamente — falou Hermione, virando-se para o restante do grupo. — Quero dizer, Bínqui nem ao menos morreu hoje, não é? Lilá foi que recebeu a notícia hoje... — Lilá abriu um berreiro — e ela não podia estar receando isso, porque a notícia foi um choque para ela...
— Não ligue para Hermione, Lilá — disse Rony em voz alta —, ela não acha que os bichos de estimação dos outros têm muita importância.
A Profª. Minerva abriu a porta da sala de aula naquele momento, o que talvez tenha sido uma sorte; Hermione e Rony estavam se fuzilando com os olhos e quando entraram na sala se sentaram um de cada lado de Harry, e passaram a aula inteira sem se falar.
Harry ainda não decidira o que ia dizer à professora quando a sineta tocou anunciando o fim da aula, mas foi ela quem levantou o assunto de Hogsmeade primeiro.
— Um momento, por favor! — pediu quando a turma se preparava para sair. — Como vocês todos fazem parte da minha Casa, deverão entregar os formulários de autorização para ir à Hogsmeade a mim, antes do Dia das Bruxas. Sem formulário não há visita, por isso não se esqueçam.
Neville levantou a mão.
— Por favor, professora, eu... Eu acho que perdi...
— Sua avó mandou o seu diretamente a mim, Longbottom — disse Minerva. — Parece que ela achou mais seguro. Bem, é só isso, podem ir.
— Pergunta a ela agora — sibilou Rony a Harry.
— Ah, mas... — começou Hermione.
— Manda ver — disse Rony insistindo.
Harry esperou o resto da turma desaparecer e se dirigiu, nervoso, à escrivaninha da professora.
— Que foi, Potter?
Harry inspirou profundamente.
— Professora, minha tia e meu tio... Hum... Se esqueceram de assinar a minha autorização.
A Profª. Minerva olhou-o por cima dos óculos quadrados e não disse nada.
— Então... Hum... A senhora acha que haveria algum problema... Quero dizer, que estaria Ok se eu... Se eu fosse a Hogsmeade?
Minerva baixou os olhos e começou a mexer nos papéis em cima da escrivaninha.
— Receio que não, Potter. Você ouviu o que eu disse. Não tem formulário, não tem visita ao povoado. Essa é a regra.
— Mas, professora, minha tia e meu tio... A senhora sabe, eles são trouxas, não entendem realmente para que servem... Os formulários de Hogwarts e outras coisas daqui — explicou Harry, enquanto Rony o animava a prosseguir com vigorosos acenos de cabeça. — Se a senhora disser que eu posso ir...
— Mas eu não vou dizer — falou a professora se levantando e arrumando os papéis na gaveta. — O formulário diz claramente que o pai ou guardião precisa dar permissão. — Minerva se virou para olhá-lo, com uma estranha expressão no rosto. Seria pena? — Sinto muito, Potter, mas esta é a minha palavra final. É melhor você se apressar ou vai se atrasar para a próxima aula.
Não restava nada a fazer. Rony xingou a Profª. Minerva de uma porção de nomes, o que deixou Hermione muito aborrecida; a garota assumiu um ar de "foi-melhor-assim” que fez Rony ficar com mais raiva e Harry teve que suportar os colegas na aula discutindo, alegres e em altas vozes, o que iam fazer primeiro, quando chegassem a Hogsmeade.
— Sempre tem a festa — disse Rony, num esforço para animar Harry.
— Sabe, a festa do Dia das Bruxas, à noite.
— Sei — respondeu Harry, deprimido —, que ótimo.
A festa do Dia das Bruxas era sempre boa, mas teria um sabor muito melhor se fosse depois de uma visita a Hogsmeade com os colegas. Nada que ninguém disse fez Harry se sentir melhor com relação à idéia de ser deixado para trás.
Dino Thomas, que era jeitoso com uma caneta, se oferecera para falsificar a assinatura do tio Válter no formulário, mas como Harry já dissera à Profª. Minerva que os tios não haviam assinado, não adiantava nada. Rony, meio desanimado, sugeriu a Capa da Invisibilidade, mas Hermione eliminou essa possibilidade, lembrando a Rony que Dumbledore avisara que os dementadores podiam ver através da capa. Possivelmente foi Percy quem disse as palavras que menos consolaram.
— O pessoal faz um estardalhaço sobre Hogsmeade, mas eu garanto, Harry, o povoado não é tão fantástico quanto dizem — falou ele, sério. — Tudo bem, a loja de doces é bastante boa e a Zonko"s — Logros e Brincadeiras é francamente perigosa e, ah, sim, a Casa dos Gritos sempre vale a pena visitar, mas, verdade, Harry, tirando isso, você não vai perder nada.
Na manhã do Dia das Bruxas, Harry acordou com os colegas e desceu para tomar café, sentindo-se totalmente arrasado, embora se esforçasse ao máximo para agir normalmente.
— Vamos lhe trazer um monte de doces da Dedosdemel — prometeu Hermione, sentindo uma pena desesperada do amigo.
— É, montes — concordou Rony. Ele e Hermione tinham finalmente esquecido a briga por causa do Bichento diante do descontentamento de Harry.
— Não se preocupem comigo — disse Harry no que ele imaginava ser uma voz displicente. — Vejo vocês na festa. Divirtam-se.
Ele acompanhou os amigos até o saguão da escola, onde Filch, o zelador, estava postado à porta de entrada, verificando se os nomes constavam de uma longa lista, examinando cada rosto cheio de desconfiança, e certificando-se de que ninguém que não devia ir estivesse saindo escondido da escola.
— Vai ficar na escola, Potter? — gritou Malfoy, que estava na fila com Crabbe e Goyle. — Medinho de passar pelos dementadores?
Harry não lhe deu atenção e se dirigiu, solitário, para a escadaria de mármore, seguiu pelos corredores desertos e voltou à Torre da Grifinória.
— Senha? — perguntou a Mulher Gorda, acordando assustada de um cochilo.
— Fortuna Major — disse Harry apático.
O retrato se afastou e ele passou pelo buraco que levava à sala comunal que estava repleto de alunos do primeiro e segundo ano que tagarelavam e de alguns alunos mais velhos, que obviamente já tinham visitado Hogsmeade tantas vezes que a novidade se desgastara.
— Harry! Harry! Oi, Harry!
Era Colin Creevey, um colega do segundo ano que tinha uma profunda admiração por Harry e nunca perdia uma oportunidade de falar com o seu ídolo.
— Você não vai a Hogsmeade, Harry? Por que não? Ei, — Colin olhou com ansiedade para os amigos — pode vir se sentar conosco, se quiser, Harry!
— Hum... Não, obrigado, Colin — disse Harry que não estava a fim de ter um bandão de gente olhando, curiosa, para a cicatriz em sua testa. — Tenho... Tenho que ir à biblioteca, preciso fazer um trabalho.
Depois disso, ele não teve escolha senão dar meia-volta e se dirigir ao buraco do retrato para sair.
— Para o que foi então que me acordou? — comentou rabugenta, a Mulher Gorda quando ele, depois de passar, foi se afastando.
Harry caminhou, desalentado, em direção à biblioteca, mas no meio do caminho mudou de idéia; não estava com vontade de trabalhar. Deu meia-volta e deparou com Filch, que obviamente acabara de despachar o último visitante para Hogsmeade.
— Que é que você está fazendo? — rosnou Filch, desconfiado.
— Nada — respondeu Harry com sinceridade.
— Nada! — bufou Filch, a queixada tremendo desagradavelmente. — Que coisa improvável! Andando, sorrateiro, sozinho, por que é que você não está em Hogsmeade comprando chumbinho fedorento, pó de arroto e minhocas de apito como os seus outros amiguinhos intragáveis?
Harry sacudiu os ombros.
— Muito bem, volte para sua sala comunal que é o seu lugar! — mandou Filch, com rispidez e ficou parado olhando até Harry desaparecer de vista.
Mas o garoto não voltou à sala comunal; ele subiu uma escada, pensando vagamente em visitar o corujal para ver Edwiges, e estava andando por outro corredor quando uma voz que vinha de uma das salas o chamou:
— Harry?
O garoto se virou para ver quem o chamara e deparou com o Profº. Lupin, que espiava para os lados à porta de sua sala.
— Que é que você está fazendo? — perguntou Lupin, embora num tom de voz diferente do de Filch. — Onde estão Rony e Hermione?
— Hogsmeade — respondeu Harry num tom que ele pretendia que fosse descontraído.
— Ah — comentou Lupin. Ele observou o garoto por um momento. — Por que você não entra? Estive aguardando a entrega de um grindylow para a nossa próxima aula.
— De um o quê? — perguntou Harry.
Ele entrou na sala de Lupin com o professor. A um canto havia uma enorme caixa de água. Um bicho de cor verde-bile e chifrinhos pontiagudos comprimia a cara contra o vidro, fazendo caretas e agitando os dedos longos e afilados.
— Demônio aquático — explicou Lupin, examinando o grindlow pensativamente. — Não deve nos dar muito trabalho, não depois dos kappas. O truque é deixar as mãos deles sem ação. Reparou nos dedos anormalmente compridos? Fortes mas muito quebradiços.
O grindylow arreganhou os dentes verdes e em seguida se enterrou num emaranhado de ervas a um canto.
— Aceita uma xícara de chá? — ofereceu Lupin, procurando a chaleira. — Eu estava mesmo pensando em preparar uma.
— Tudo bem — aceitou Harry sem jeito.
Lupin deu alguns golpes de varinha na chaleira e na mesma hora saiu do bico uma baforada de vapor quente.
— Sente-se — convidou Lupin, tirando a tampa de uma lata empoeirada. — Receio que só tenha chá em saquinhos... Mas eu diria que você já bebeu chá em folhas que chegue.
Harry olhou para ele. Os olhos do professor cintilavam.
— Como foi que o senhor soube disso? — perguntou Harry.
— A Profª. McGonagall me contou — respondeu Lupin, passando a Harry uma caneca lascada cheia de chá. — Você não está preocupado, está?
— Não.
Por um instante Harry pensou em contar a Lupin a história do cão que ele vira na Rua Magnólia, mas decidiu não fazê-lo. Não queria que Lupin pensasse que era covarde, principalmente porque o professor já parecia pensar que ele não era capaz de enfrentar um bicho-papão.
Alguma coisa dos pensamentos de Harry devia ter transparecido em seu rosto, porque Lupin perguntou:
— Tem alguma coisa preocupando-o, Harry?
— Não — mentiu o garoto. Depois bebeu um pouco de chá observando o grindylow que o ameaçava com o punho. — Tem — disse ele de repente, pousando a xícara de chá na mesa do professor — O senhor se lembra daquele dia em que lutamos contra o bicho-papão?
— Claro.
— Por que o senhor não me deixou enfrentar o bicho? — perguntou Harry abruptamente.
Lupin ergueu as sobrancelhas.
— Eu teria pensado que isto era óbvio, Harry — disse ele parecendo surpreso.
Harry, que esperara que o professor negasse ter feito uma coisa dessas, ficou perplexo.
— Por quê? — tornou ele a perguntar.
— Bem — falou Lupin, franzindo de leve a testa —, presumi que se o bicho-papão o enfrentasse, ele assumiria a forma de Lord Voldemort.
Harry arregalou os olhos. Não somente esta era a última resposta que poderia esperar, como também Lupin dissera o nome de Voldemort. A única pessoa que Harry já ouvira dizer esse nome em voz alta (além dele próprio) fora o Profº. Dumbledore.
— Pelo visto eu me enganei — desculpou-se o professor, ainda franzindo a testa. — Mas eu não achei uma boa idéia Lord Voldemort se materializar na sala dos professores. Imaginei que os alunos entrariam em pânico.
— Logo no começo, eu realmente pensei em Voldemort — disse Harry honestamente. — Mas depois, eu... Eu me lembrei daqueles dementadores.
— Entendo — falou o professor, pensativo. — Bem, bem... Estou impressionado. — Ele sorriu brevemente ao ver a expressão de surpresa no rosto do garoto. — Isto sugere que o que você mais teme é o medo. Muito sensato, Harry.
Harry não soube o que dizer ao professor, por isso bebeu mais chá.
— Então você andou pensando que eu não acreditava que você tivesse capacidade para enfrentar o bicho-papão? — perguntou Lupin astutamente.
— Bem... É. — Harry de repente estava se sentindo muito mais feliz. — Profº. Lupin, o senhor sabe que os dementadores...
O garoto foi interrompido por uma batida na porta.
— Entre — convidou o professor.
A porta se abriu e Snape entrou. Trazia um cálice ligeiramente fumegante e parou, apertando os olhos negros, ao ver Harry.
— Ah, Severo — exclamou Lupin sorridente. — Muito obrigado. Podia deixar aí na mesa para mim?
Snape pousou o cálice fumegante, os olhos indo de Harry para Lupin.
— Eu estava mostrando a Harry o meu grindylow — disse Lupin em tom agradável, indicando o tanque de água.
— Fascinante — comentou Snape sem sequer olhar para o tanque. — Você devia beber isso logo, Lupin.
— É, é, vou beber.
— Fiz um caldeirão cheio — continuou Snape. — Se precisar de mais...
— Provavelmente eu deveria tomar mais um pouco amanhã. Muito obrigado, Severo.
— De nada — disse o colega, mas havia uma expressão em seus olhos que não agradou a Harry. O professor se retirou de costas para a porta, sem sorrir, vigilante.
Harry olhou, curioso, para o cálice. Lupin sorriu.
— O Profº. Snape teve a bondade de preparar esta poção para mim — explicou ele. — Nunca fui um bom preparador de poções e esta aqui é particularmente complexa. — Ele apanhou o cálice e cheirou-o. — É pena que o açúcar estrague o efeito da poção — acrescentou, tomando um golinho e estremecendo.
— Por quê...? — começou Harry.
Lupin olhou para ele e respondeu à pergunta incompleta.
— Tenho me sentido meio indisposto. Esta poção é a única coisa que me ajuda. Tenho a sorte de estar trabalhando ao lado do Profº. Snape; não há muitos bruxos que saibam prepará-la.
O professor tomou mais um golinho e Harry teve um desejo incontrolável de derrubar o cálice de suas mãos.
— O Profº. Snape é muito interessado nas Artes das Trevas — disse o garoto sem pensar.
— É mesmo? — admirou-se Lupin, parecendo apenas levemente interessado, enquanto tomava mais um gole.
— Tem gente que supõe que ele faria qualquer coisa para ocupar o cargo de professor de Defesa contra as Artes das Trevas.
Lupin esvaziou o cálice e fez uma careta.
— Horrível — disse. — Bem, Harry é melhor eu voltar ao trabalho. Vejo você mais tarde na festa.
— Certo — concordou Harry, deixando na mesa sua xícara vazia. O cálice vazio continuava a fumegar.

— Segura aí — exclamou Rony. — Compramos o máximo que podíamos carregar.
Uma chuva de doces intensamente coloridos caiu no colo de Harry.
Anoitecia e Rony e Hermione tinham acabado de chegar à sala comunal, as faces rosadas do vento frio e a expressão de que tinham se divertido como nunca.
— Obrigado — disse Harry, pegando um pacote de minúsculos Diabinhos de Pimenta. — Como é que é Hogsmeade? Aonde é que vocês foram?
Pelo que diziam... A todos os lugares. Dervixes e Bangues, a loja de equipamento de bruxaria, Zonko"s — Logros e Brincadeiras, no Três Vassouras para tomar canecas espumantes de cerveja quente amanteigada, e outros tantos lugares.
— O Correio, Harry! Umas duzentas corujas, todas pousadas em prateleiras, todas com código de cores dependendo da urgência com que você quer que a carta chegue!
— A Dedosdemel tem um novo tipo de bombom estavam distribuindo amostras grátis, olha aí um pedacinho, olha...
— Achamos que vimos um ogro, juro, tem gente de todo o tipo no Três Vassouras...
— Gostaria que a gente pudesse ter trazido cerveja amanteigada para você, esquenta para valer...
— Que foi que você ficou fazendo? — perguntou Hermione, com ar preocupado. — Terminou algum dever?
— Não — respondeu Harry. — Lupin preparou uma xícara de chá para mim na sala dele. Então Snape entrou...
E Harry contou aos amigos tudo sobre o cálice. Rony ficou boquiaberto.
— E Lupin bebeu? Ele é maluco?
Hermione consultou o relógio de pulso.
— É melhor descermos, sabe, a festa vai começar dentro de cinco minutos...
— Os três atravessaram depressa o buraco do retrato e se misturaram à aglomeração de alunos, ainda discutindo Snape.
— Mas se ele... Sabe... — Hermione baixou a voz, olhando, nervosa, para os lados — se ele estivesse tentando... Envenenar Lupin... Não teria feito isso na frente de Harry.
— É talvez — disse Harry quando chegavam ao saguão de entrada e o atravessavam para entrar no Salão Principal. Este fora decorado com centenas de abóboras iluminadas por dentro com velas, uma nuvem de morcegos, muitas serpentinas laranja-vivo que esvoaçavam lentamente pelo teto tempestuoso como parecendo luzidias cobras de água.
A comida estava deliciosa; até Hermione e Rony, que já vinham empanturrados de doces da Dedosdemel, arranjaram lugar para repetir.
Harry olhava constantemente para a mesa dos professores. O Profº. Lupin parecia alegre e o mais saudável possível; conversava animadamente com o miúdo Flitwick, professor de Feitiços. O olhar de Harry percorreu a mesa até o lugar que Snape ocupava. Seria sua imaginação ou os olhos de Snape cintilavam na direção de Lupin com mais freqüência do que seria natural?
A festa terminou com um espetáculo apresentado pelos fantasmas de Hogwarts. Eles saltavam de repente das paredes e dos tampos das mesas e voavam em formação;
Nick Quase Sem Cabeça, o fantasma da Grifinória, fez grande sucesso com uma encenação de sua própria decapitação incompleta.
Foi uma noite tão agradável que o bom humor de Harry sequer foi afetado quando Malfoy gritou no meio dos colegas, quando deixavam o salão:
— Os dementadores mandaram lembranças, Potter!
Harry, Rony e Hermione acompanharam os colegas da Grifinória pelo caminho habitual para a sua Torre, mas quando chegaram ao corredor que terminava no retrato da Mulher Gorda, encontraram-no engarrafado pelos alunos.
— Por que ninguém está entrando? — perguntou Rony, curioso. Harry espiou por cima das cabeças à sua frente.
Aparentemente o retrato estava fechado.
— Me deixem passar — ouviu-se a voz de Percy, que passou cheio de importância e eficiência pelo ajuntamento. — Qual é o motivo da retenção aqui? Não é possível que todos tenham esquecido a senha, com licença, sou o monitor-chefe...
E então foi baixando um silêncio sobre os alunos a começar pelos que estavam na frente, dando a impressão de que uma friagem se espalhava pelo corredor.
Eles ouviram Percy dizer, numa voz repentinamente alta e esganiçada:
— Alguém vai chamar o Profº. Dumbledore. Depressa.
As cabeças dos alunos se viraram; os que estavam atrás se esticaram nas pontas dos pés.
— Que é que está acontecendo? — perguntou Gina, que acabara de chegar.
Instantes depois, o Profº. Dumbledore chegou deslizando, imponente, em direção ao retrato; os alunos da Grifínória se comprimiram para deixá-lo passar, e Harry, Rony e Hermione se aproximaram para ver qual era o problema.
— Essa, não... — a garota agarrou o braço de Harry.
A Mulher Gorda desaparecera do retrato, que fora cortado com tanta violência que as tiras de tela se amontoavam no chão; grandes pedaços do retrato haviam sido completamente arrancados.
Dumbledore deu uma olhada rápida no retrato destruído, virou-se, o olhar sombrio e viu os professores McGonagall, Lupin e Snape que vinham apressados ao seu encontro.
— Precisamos encontrá-la — disse Dumbledore. — Profª. McGonagall, por favor localize o Sr. Filch imediatamente e diga-lhe que procure a Mulher Gorda em todos os quadros do castelo.
— Vai precisar de sorte! — disse uma voz gargalhante.
Era Pirraça, o poltergeist, sobrevoando professores e alunos, encantado, como sempre, à vista de desastres e preocupações.
— Que é que você quer dizer com isso, Pirraça? — perguntou Dumbledore calmamente e o sorriso do poltergeist empalideceu um pouco. Ele não se atrevia a atormentar o diretor. Em vez disso, adotou uma voz untuosa que não era nada melhor do que a sua gargalhada escandalosa.
— Vergonha, Sr. Diretor. Não quer ser vista. Está horrorosa. Eu a vi correndo por uma paisagem no quarto andar, Sr. Diretor, se escondendo entre as árvores. Chorando de cortar o coração — informou ele, satisfeito. — Coitada — acrescentou em tom pouco convincente.
— Ela disse quem foi que fez isso? — perguntou Dumbledore em voz baixa.
— Ah, disse, Sr. Diretor — respondeu Pirraça com ar de quem carrega uma grande bomba nos braços. — Ele ficou furioso porque ela não quis deixá-lo entrar, entende. — Pirraça deu uma cambalhota no ar e sorriu para Dumbledore entre as próprias pernas. — Tem um gênio danado, esse tal de Sirius Black.

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