Posted by : Unknown junho 06, 2014

Capítulo 5


Harry acordou cedo na manhã seguinte. Embora soubesse que já era dia, continuou com os olhos bem fechados.
“Foi um sonho", disse a si mesmo com firmeza. “Sonhei que um gigante chamado Rúbeo Hagrid veio me dizer que eu ia para uma escola de magia. Quando abrir os olhos estarei em casa no meu armário.”
De repente ouviu um ruído alto de batidas.
"É a tia Petúnia batendo na porta", pensou Harry, desanimando. Mas, ainda assim, não abriu os olhos. Tinha sido um sonho tão bom.
Bum. Bum. Bum.
— Está bem — resmungou Harry — já estou levantando.
Sentou-se e o pesado casaco de Hagrid escorregou de seu corpo. O casebre estava inundado de sol, a tempestade passara, o próprio Hagrid estava dormindo no sofá desmontado e havia uma coruja batendo com a garra na janela, trazendo um jornal no bico.
Harry ergueu-se de um pulo, sentia-se feliz como se houvesse um grande balão crescendo dentro dele. Foi direto à janela e abriu-a com um puxão. A coruja entrou voando e deixou cair o jornal em cima de Hagrid, que nem acordou. A coruja então voou pelo chão e começou a atacar o casaco do gigante Hagrid.
— Não faça isso.
Harry tentou espantar a coruja, mas ela o ameaçou com o bico e continuou a atacar ferozmente o casaco.
— Rúbeo! — chamou Harry alto. — Tem uma coruja...
— Pague a ela — resmungou Hagrid dentro do sofá.
— Quê?
— Ela quer receber o pagamento pela entrega do jornal. Procure nos bolsos
O casaco de Hagrid parecia ser feito só de bolsos, molhos de chaves, fichas de metal, rolinhos de barbante, balas de hortelã, saquinhos de chá... E finalmente, Harry puxou um punhado de moedas estranhas.
— Dê a ela cinco Nuques — disse Hagrid sonolento.
— Nuques?
— As moedinhas de bronze.
Harry contou cinco moedinhas de bronze e a coruja esticou a perna para ele enfiar o dinheiro numa carteirinha de couro que trazia presa. Em seguida saiu voando pela janela aberta.
Hagrid bocejou alto, sentou-se, espreguiçou-se.
— É melhor nos despacharmos, Harry, temos muito que fazer hoje, temos que ir a Londres comprar todo o seu material escolar.
Harry revirava as moedas mágicas para examiná-las. Acabara de pensar em uma coisa que o fez se sentir como se o balão da felicidade que havia dentro dele tivesse furado.
— Hum... Hagrid?
— Hum? — respondeu Rúbeo, calçando as enormes botas.
— Não tenho dinheiro nenhum, e você ouviu tio Válter à noite passada, ele não vai pagar para eu aprender magia.
— Não se preocupe com isso — disse Hagrid, coçando a cabeça enquanto se levantava. — Você acha que seus pais não lhe deixaram nada?
— Mas se a casa foi destruída...
— Eles não guardavam o ouro que tinham em casa, garoto! Não, nossa primeira parada vai ser em Gringotes. O banco dos bruxos. Coma uma salsicha, elas não são ruins frias, e eu não deixaria de comer uma fatia do seu bolo de aniversário.
— Bruxos têm bancos?
— Só este. Gringotes. É administrado por duendes.
Harry deixou cair o pedaço de salsicha que tinha na mão.
— Duendes?
— É, e por isso que só um louco tentaria roubar o banco, é o que lhe digo. Nunca se meta com duendes, Harry, Gringotes é o lugar mais seguro do mundo para qualquer coisa que você queira guardar bem, com exceção de Hogwarts, talvez. Aliás, preciso mesmo ir a Gringotes. Para Dumbledore. Negócios de Hogwarts. — Hagrid se endireitou, orgulhoso. — Ele sempre me manda tratar de assuntos que acha importante. Buscar você, pegar coisas em Gringotes, sabe que pode confiar em mim, entende? Apanhou tudo? Vamos, então.
Harry seguiu Hagrid em direção ao rochedo. O céu estava bem claro agora e o mar cintilava ao sol. O barco que o Válter alugara continuava lá, com muita água no fundo depois da tempestade.
— Como foi que você chegou aqui? — perguntou Harry, procurando um segundo barco.
— Voando — respondeu Hagrid.
— Voando?
— É... Mas vamos voltar nisso ai. Não tenho permissão de usar mágica depois de apanhar você.
Eles se acomodaram no barco, Harry ainda de olhos arregalados para Hagrid, tentando imaginá-lo voando.
— Mas parece um desperdício remar — disse Hagrid, lançando a Harry um dos seus olhares de esguelha. — Se eu quisesse... Hum... Apressar um pouco as coisas, você se importaria de não dizer nada em Hogwarts?
— Claro que não — falou Harry ansioso para ver mais mágicas.
Hagrid puxou outra vez o guarda-chuva cor-de-rosa, deu duas pancadinhas no lado do barco e eles dispararam em direção ao continente.
— Por que só um louco tentaria roubar Gringotes? — perguntou Harry.
— Feitiços... Encantamentos — disse Hagrid desdobrando o seu jornal. — Dizem que há dragões guardando os cofres de segurança. E depois é preciso conhecer o caminho. Gringotes fica embaixo de Londres, centenas de quilômetros abaixo, entenda. Mais fundo que o metrô. Você morreria de fome tentando sair de lá, mesmo que conseguisse pôr as mãos em alguma coisa.
Harry ficou sentado pensando no que ouvira enquanto Hagrid lia o jornal, O Profeta Diário. Harry aprendera com o tio Válter que as pessoas gostavam de ser deixadas em paz quando faziam isso, mas era muito difícil, nunca tivera tantas perguntas para fazer na vida.
— O Ministério da Magia anda aprontando as trapalhadas de sempre — resmungou Hagrid, virando a página.
— Tem um ministro da Magia? — perguntou Harry antes que conseguisse se conter.
— Claro. Queriam nomear Dumbledore ministro, é claro, mas ele nunca ia largar Hogwarts, então o velho Cornelius Fudge ficou com o cargo. Trapalhão como ele só. Por isso ele bombardeia Dumbledore com corujas, toda manhã, pedindo conselhos.
— Mas o que é que o Ministério da Magia faz?
— Bom, a principal tarefa é esconder dos trouxas que ainda existem bruxas e bruxos andando pelo país.
— Por quê?
— Por quê? Ora, Harry, todo o mundo ia querer solucionar os problemas com mágicas. Não, é melhor que nos deixem em paz.
Nesse instante o barco bateu suavemente na parede do cais.
Hagrid dobrou o jornal e eles subiram os degraus de pedra que levavam a rua.
As pessoas que passavam olhavam muito para Hagrid enquanto os dois atravessaram a cidadezinha até a estação. Harry não podia culpá-los. Não só Hagrid era duas vezes mais alto do que todo o mundo, como também não parava de apontar para coisas absolutamente comuns como parquímetros e comentar em voz alta:
— Está vendo isso, Harry? As coisas que esses trouxas inventam, hein?
— Rúbeo — disse Harry, meio ofegante de correr para acompanhar o passo dele. — Você disse que há dragões em Gringotes?
— Bem, é o que dizem — Calou Hagrid. — Maneiro, eu gostaria de ter um dragão.
— Você gostaria de ter um?
— Sempre quis ter um desde pequeno, é aqui que vamos.
Tinham chegado à estação. Havia um trem para Londres dali a cinco minutos. Hagrid, que não entendia o dinheiro dos trouxas, como o chamava, entregou as notas a Harry para comprar as passagens.
No trem as pessoas ficaram olhando ainda mais Hagrid quando ocupou dois lugares e se pós a tricotar uma coisa amarelo-canário que lembrava uma lona de circo.
— Você guardou sua carta, Harry? — perguntou enquanto contava as malhas do tricô.
Harry tirou o envelope de pergaminho do bolso.
— Ótimo. Aí tem uma lista de tudo que você vai precisar.
Harry desdobrou um segundo pedaço de papel em que não reparara na noite anterior e leu:

ESCOLA DE MAGIA E BRUXARIA DE HOGWARTS

Uniforme:
Os estudantes do primeiro ano precisam de:
1. Três conjuntos de vestes comuns de trabalho (pretas)
2. Um chapéu pontudo simples (preto) para uso diário
3. Um par de luvas protetoras (couro de dragão ou similar)
4. Uma capa de inverno (preta com fechos prateados)
As roupas do aluno devem ter etiquetas com seu nome.
Livros:
Os alunos devem comprar um exemplar de cada um dos seguintes:
• Livro padrão de feitiços (1ª série) de Miranda Goshawk
• História da magia de Batilda Bagshot
• Teoria da magia de Adalberto Waffing
• Guia de transfiguração para iniciantes de Emerico Ewitch
• Mil ervas e Fungos mágicos de Fílida Spore
• Bebidas e poções mágicas de Arsênio Jigger.
• Animais fantásticos e seu habitat de Newton Scamander
• As Corças das trevas: Um guia de autoproteção de Quintino Trimble.
Outros Equipamentos:
• 1 varinha mágica
• 1 caldeirão (estanho, tamanho padrão 2)
• 1 conjunto de frascos
• 1 telescópio
• 1 balança de latão
Os alunos podem ainda trazer uma coruja ou um gato ou um sapo.

LEMBREMOS AOS PAIS QUE OS ALUNOS DO PRIMEIRO ANO NÃO PODEM USAR VASSOURAS PESSOAIS.

— Podemos comprar tudo isso em Londres? — perguntou-se Harry em voz alta.
— Se você souber aonde ir — respondeu Hagrid.
Harry nunca estivera em Londres antes, Hagrid, embora parecesse saber aonde ia, obviamente não estava acostumado a chegar lá pelos meios comuns. Ficou entalado na roleta do metrô e queixou-se em voz alta que os assentos eram demasiado pequenos e os trens demasiado lentos.
— Não sei como os trouxas conseguem se arranjar sem mágica — disse, quando subiam uma escada rolante gasta que levava a uma rua movimentada com saídas dos dois lados.
Hagrid era tão grande que abria caminho pela multidão sem esforço, Harry só precisava segui-lo de perto. Passaram por livrarias e lojas de música, lanchonetes e cinemas, mas nenhuma loja parecia vender varinhas mágicas. Aquela era apenas uma rua comum cheia de gente comum. Seria realmente possível que houvesse montes de ouro dos bruxos enterrados quilômetros abaixo dali? Haveria realmente lojas que vendessem livros de feitiços e vassouras? Não seria talvez uma grande peça que os Dursley tinham pregado? Se Harry não soubesse que os Dursley não tinham senso de humor, poderia ter tirado uma dessas conclusões, mas, por alguma razão, embora tudo que Hagrid tivesse dito até ali fosse inacreditável, Harry não podia deixar de confiar nele.
— É aqui — disse Hagrid parando. — O Caldeirão Furado. É um lugar famoso.
Era um barzinho sujo. Se Hagrid não o tivesse apontado, Harry nem teria reparado que existia. As pessoas que passavam apressadas nem olhavam para aquele lado. Os olhos delas corriam da grande livraria a um lado a loja de discos no outro como se nem conseguissem ver O Caldeirão Furado. Na verdade Harry teve a sensação muito estranha de que somente ele e Hagrid eram capazes de vê-lo. Antes que pudesse comentar isto, Hagrid o empurrou para dentro.
Para um lugar famoso, o Caldeirão era muito escuro e miserável. Havia umas velhas sentadas a um canto, bebendo pequenos cálices de xerez. Uma delas fumava um longo cachimbo.
Um homenzinho de cartola conversava com o velho garçom do bar, que era bem careca e parecia uma noz viscosa. O zunzum das conversas parou quando eles entraram. Todos pareciam conhecer Hagrid, acenaram e sorriram para ele, e o garçom apanhou um copo, perguntando:
— O de sempre, Hagrid?
— Não posso, Tom, estou a serviço de Hogwarts — disse Hagrid, dando uma palmada com a manzorra no ombro de Harry, o que fez joelhos do garoto dobrarem.
— Meu Deus — exclamou o garçom, fitando Harry. — É... Será possível?
O Caldeirão Furado repentinamente parou e fez-se um silêncio total.
— Valha-me Deus — murmurou o velho garçom. — Harry Potter... Que honra.
E saiu correndo de trás do balcão, precipitou-se para Harry e agarrou suas mãos, as lágrimas nos olhos.
— Seja bem-vindo, Sr. Potter, seja bem-vindo.
Harry não sabia o que dizer. Todos tinham os olhos nele. A velha com o cachimbo puxava o fumo sem se dar conta de que o cachimbo apagara. Hagrid sorria radiante.
Logo houve um grande arrastar de cadeiras e no momento seguinte Harry se viu apertando as mãos de todos no Caldeirão Furado.
— Dóris Crockford, Sr. Potter não acredito que finalmente posso conhecê-lo.
— Estou tão orgulhosa, Sr. Potter, tão orgulhosa.
— Sempre quis apertar sua mão estou nas nuvens. Encantado, Sr. Potter, nem sei lhe dizer o quanto, Diggle é o meu nome, Dédalo Diggle.
— Já o vi senhor antes! — disse Harry, e a cartola de Diggle caiu de tanta excitação. — O senhor se curvou para mim uma vez numa loja.
— Ele se lembra! — exclamou Dédalo Diggle, olhando todos à volta. — Vocês ouviram isso? Ele se lembra de mim!
Harry apertou muitas mãos. Dóris Crockford não parava de voltar para um novo aperto.
Um rapaz pálido adiantou-se, muito nervoso. Um olho trêmulo.
— Professor Quirrell! — disse Hagrid. — Harry, o Professor Quirrell vai ser um dos seus professores em Hogwarts.
— P... P... Potter. — gaguejou o Professor Quirrell, apertando a mão de Harry — N... n... nem sei o que d... d... dizer que p... p... p... Ppazer enorme em c... c... conhecê-lo.
— Que tipo de mágica o senhor ensina, Professor Quirrell?
— D... defesa c... c... contra as a... artes das t... trevas — murmurou o Professor Quirrell, como se preferisse não pensar no assunto. — não que você p... p... precise, hein, Potter? — Ele riu nervoso. – V... Você veio c... comprar o material, suponho? Tenho que c... comprar um livro n... novo sobre vampiros — Parecia aterrorizado só de pensar.
Mas os outros não queriam deixar o Professor Quirrell ficar com Harry só para ele. Levou bem uns dez minutos para o menino se livrar de todos. Finalmente, Hagrid conseguiu se fazer ouvir naquela balbúrdia.
— Precisamos nos apressar. Temos muitas compras a fazer. Vamos, Harry.
Dóris Crockford apertou a mão de Harry uma última vez e eles passaram pelo bar e saíram num pequeno pátio murado, onde não havia nada exceto uma lata de lixo e um pouco de mato.
Hagrid sorriu para Harry.
— Eu lhe falei, não foi? Falei que você era famoso. Até o professor Quirinus Quirrell ficou tremendo de emoção de conhecê-lo, mas, em geral, ele está sempre tremendo.
— Ele é sempre tão nervoso?
— Ah, é, coitado. Uma cabeça brilhante. Foi bem enquanto estudou em livros, mas quando tirou um ano para aprender na prática... Dizem que encontrou vampiros na Floresta Negra e teve um problema feio com uma feiticeira, nunca mais foi o mesmo. Tem pavor dos alunos, tem pavor da matéria que ensina, agora, cadê o meu guarda-chuva?
Vampiros? Feiticeiras? A cabeça de Harry estava girando.
Entrementes, Hagrid contava tijolos na parede por cima da lata de lixo.
— Três para cima... Dois para o lado... — murmurou. — Certo, chegue para trás, Harry.
Ele bateu na parede três vezes com a ponta do guarda-chuva. E o tijolo que tocou estremeceu, torceu-se. No meio apareceu um buraquinho, que se foi alargando cada vez mais. Um segundo depois se viram diante de um arco bastante grande até para Hagrid, um arco que abria para uma rua de pedras irregulares, serpeava e desaparecia de vista.
— Bem-vindo — disse Hagrid — ao Beco Diagonal.
Ele riu do espanto de Harry. Atravessaram o arco. Harry deu uma espiada rápida por cima do ombro e viu o arco encolher instantaneamente e virar uma parede sólida.
O sol refulgia numa pilha de caldeirões à porta da loja mais, próxima. “Caldeirões — Todos os Tamanhos — Cobre, Latão, Estanho, Prata”, dizia um letreiro acima.
— É você vai precisar de um — disse Hagrid —, mas temos de apanhar o seu dinheiro primeiro.
Harry desejou ter oito olhos. Virava a cabeça para todo o lado enquanto caminhavam pela rua, tentando ver tudo ao mesmo tempo: as lojas, as coisas as portas, as pessoas fazendo compras.
Uma mulher gorducha do lado de fora de uma farmácia abanou a cabeça quando passaram por ela e disse:
— Fígado de dragão, dezessete sicles trinta gramas, eles endoidaram...
Um pio baixo e suave veio de uma loja escura com um letreiro onde se lia "Empório de Corujas — douradas, das torres, do campo, marrons e brancas".
Vários garotos mais ou menos da idade de Harry espremiam os narizes contra a vitrine que tinha vassouras.
— Olhe — Harry, ouviu um deles dizer — a nova Nimbus 2000, mais veloz que nunca.
Havia lojas que vendiam vestes, lojas que vendiam telescópios e estranhos instrumentos de prata que Harry nunca vira antes, janelas com pilhas de barris contendo baços de morcegos e olhos de enguias, pilhas mal equilibradas de livros de feitiços, penas de aves para escrever e rolos de pergaminhos, vidros de poções, globos de...
— Gringotes — anunciou Hagrid.
Tinham chegado a um edifício muito branco que se erguia acima das lojinhas. Parado diante das portas de bronze polido, usando um uniforme vermelho e dourado, havia...
— É, é um duende — disse Hagrid baixinho, enquanto subiam os degraus de pedra branca até o duende. Ele era uma cabeça mais baixa do que Harry. Tinha uma cara escura e inteligente, uma barba em ponta e, Harry reparou, mãos e pés muito compridos. O duende os cumprimentou com uma reverência quando entraram.
Em seguida depararam com um segundo par de portas, desta vez de prata, onde havia gravado o seguinte:

Entrem, estranhos, mas prestem atenção,
Ao que espera o pecado da ambição,
Porque os que tiram o que não ganharam
Terão é que pagar muito caro,
Assim, se procuram sob o nosso chão,
Um tesouro que nunca enterraram,
Ladrão, você foi avisado,
Cuidado, pois vai encontrar mais do que procurou.

— Não te disse? Só um louco tentaria roubar o banco — lembrou Hagrid.
Dois duendes se curvaram quando eles passaram pelas portas de prata e desembocaram em um grande saguão de mármore.
Havia mais de cem duendes sentados em banquinhos altos atrás de um longo balcão, escrevendo em grandes livros-caixas, pesando moedas em balanças de latão, examinando pedras preciosas com óculos de joalheira. Havia ao redor do saguão portas demais para contar, e outros tantos duendes acompanhavam as pessoas que entravam e saiam por elas. Hagrid e Harry se dirigiram ao balcão.
— Bom dia — disse Hagrid a um duende desocupado. Viemos sacar algum dinheiro do cofre do Sr. Harry Potter.
— O senhor tem a chave?
— Tenho em algum lugar — disse Hagrid e começou a esvaziar os bolsos em cima do balcão, espalhando um punhado de biscoitos de cachorro mofados em cima do livro-caixa do duende. O duende franziu o nariz. Harry observou o duende do lado direito pesar um monte de rubis do tamanho de carvões em brasa.
— Achei — exclamou Hagrid finalmente, mostrando uma chavinha de ouro.
O duende examinou-a cuidadosamente.
— Parece estar em ordem.
— E tenho aqui também uma carta do professor Dumbledore — falou Hagrid com ar importante, tirando-a do bolso do casaco.
— É sobre Você-Sabe-O-Quê que está no cofre setecentos e treze.
O duende leu a carta com atenção.
— Muito bem! — Calou, devolvendo a carta a Hagrid. — Vou mandar alguém levá-lo aos dois cofres. Grampo!
Grampo era outro duende. Depois que Hagrid enfiou todos os biscoitos de cachorro de volta nos bolsos, ele e Harry acompanharam Grampo a uma das portas que havia no saguão.
— O que é o Você-Sabe-O-Quê no cofre setecentos e treze? — perguntou Harry.
— Não posso lhe contar — respondeu Hagrid misterioso — Muito secreto. Negócios de Hogwarts. Dumbledore me confiou. Meu emprego vale mais do que à vontade de lhe contar.
Grampo segurou a porta aberta para eles passarem. Harry, que esperara mais mármore, surpreendeu-se. Encontravam-se em uma passagem estreita de pedra, iluminada por archotes chamejantes.
Era uma descida íngreme, em que havia pequenos trilhos. Grampo assobiou e um vagonete disparou pelos trilhos em sua direção.
Eles embarcaram Hagrid com alguma dificuldade e partiram.
A princípio eles apenas viajaram em alta velocidade por um labirinto de passagens cheias de curvas. Harry tentou memorizar, esquerda, direita, direita, esquerda, em frente no entroncamento, direita, esquerda, mas era impossível. O vagonete barulhento parecia conhecer o caminho, porque Grampo não o estava dirigindo.
Os olhos de Harry ardiam no ar frio que passava rápido por eles, mas mantinha-os bem abertos. Uma vez, ele pensou ter visto uma labareda no fim da passagem e se virou para conferir se era um dragão, mas foi tarde demais, eles mergulharam ainda mais fundo, passaram por um lago subterrâneo onde se acumulavam no teto e no chão enormes estalactites e estalagmites.
— Eu nunca sei — gritou Harry para Hagrid poder ouvi-lo — qual é a diferença entre uma estalactite e uma estalagmite.
— Estalagmite tem um "m" — disse Hagrid — E não me faça perguntas agora acho que vou enjoar.
Ele realmente estava muito verde e quando o vagonete afinal parou ao lado de uma portinhola na passagem, Hagrid saltou e precisou se apoiar na parede para os joelhos pararem de tremer.
Grampo destrancou a porta. Saiu uma grande nuvem de fumaça verde e enquanto ela se dissipava, Harry ficou sem respirar. Dentro havia montes de moedas de ouro. Colunas de prata. Pilhas de pequenos nuques de bronze.
— É tudo seu — sorriu Hagrid.
Tudo de Harry — era inacreditável. Os Dursley com certeza não sabiam da existência daquilo ou teriam tirado tudo mais rápido do que uma piscadela. Quantas vezes tinham se queixado do quanto lhes custava criar Harry? E durante todo aquele tempo havia uma pequena fortuna que lhe pertencia, enterrada no subsolo de Londres.
Hagrid ajudou Harry a guardar um pouco do dinheiro em uma saca.
— As moedas de ouro são galeões — explicou ele. — Dezessete sicles de prata fazem um galeão e vinte e nove nuques fazem um sicle, é bem simples. Certo, isto deverá ser suficiente para uns dois períodos letivos, guardaremos o resto bem guardado para você. — Hagrid virou-se para Grampo. — O cofre setecentos e treze agora, por favor, e será que podemos ir mais devagar.
— Só tem uma velocidade — falou Grampo.
Viajaram mais para o fundo agora e ganharam velocidade. O ar foi se tornando cada vez mais frio enquanto disparavam pelas curvas fechadas.
Sacolejavam por uma ravina subterrânea e Harry debruçou-se para um lado para tentar ver o que havia no fundo, mas Hagrid gemeu e o puxou para trás pelo cangote.
O cofre setecentos e treze não tinha fechadura.
— Para trás disse Grampo com ar de importância. Alisou a porta devagarinho com o seu dedo comprido e ela simplesmente se dissolveu.
— Se alguém que não fosse um duende de Gringotes tentasse o mesmo, seria engolido pela porta e ficaria preso lá dentro — explicou Grampo.
— Com que freqüência você vem ver se tem alguém lá dentro? — perguntou Harry.
— Uma vez a cada dez anos — disse Grampo, com um sorriso maldoso.
Devia haver alguma coisa realmente extraordinária nesse cofre de segurança máxima, Harry tinha certeza, e se curvou para frente pressuroso, esperando ver no mínimo jóias fabulosas, mas no primeiro momento achou que estava vazio. Depois notou um embrulhinho encardido no chão. Hagrid apanhou-o e o guardou muito bem no casaco.
Harry tinha muita vontade de saber o que era, mas sentia que era melhor não perguntar.
— Vamos voltar para esse vagonete infernal, e não fale no caminho de volta. É melhor eu ficar de boca fechada — comentou Hagrid.
Depois de mais uma viagem no vagonete descontrolado, eles chegaram à claridade do sol do lado de fora de Gringotes. Harry não sabia aonde correr primeiro agora que tinha uma saca cheia de dinheiro. Não precisava saber quantos galeões perfaziam uma libra para saber que estava carregando mais dinheiro do que jamais tivera na vida inteira mais dinheiro até do que Duda jamais tivera.
— Vamos comprar logo o seu uniforme — falou Hagrid, indicando com a cabeça a loja Madame Malkin — Roupas para Todas as Ocasiões. — Escute aqui, Harry, você se importa se eu der uma corrida no Caldeirão Furado para tomar um tônico? Detesto esses vagonetes de Gringotes. — Ele realmente parecia meio enjoado, por isso Harry entrou na loja Madame Malkin sozinho, um pouco nervoso.
Madame Malkin era uma bruxa baixa, gorda e sorridente, toda vestida de lilás.
— Hogwarts, querido? — perguntou quando Harry começou a falar. — Tenho tudo aqui. Para falar a verdade, tem outro rapazinho agora ajustando uma roupa.
Nos fundos da loja, um garoto de rosto pálido e pontudo estava em pé em cima de um banquinho enquanto uma segunda bruxa encurtava suas compridas vestes pretas. Madame Malkin colocou Harry num banquinho ao lado do outro, enfiou-lhe uma veste comprida pela cabeça e começou a marcar a bainha na altura certa.
— Alô — cumprimentou o garoto. — Hogwarts também?
— É — confirmou Harry.
— Meu pai está na loja ao lado comprando meus livros e minha mãe está mais adiante procurando varinhas — disse o garoto. Tinha uma voz de tédio arrastada. — Depois vou levar os dois para dar uma olhada nas vassouras de corridas. Não vejo por que os alunos de primeira série não podem ter vassouras individuais. Acho que vou obrigar papai a me comprar uma e vou contrabandeá-la para a escola às escondidas.
O garoto lhe lembrou muito o Duda.
— Você tem vassoura? — perguntou o garoto.
— Não.
— Sabe jogar Quadribol?
— Não — respondeu novamente Harry, perguntando-se que diabo seria esse tal de Quadribol.
— Eu sei, meu pai falou que vai ser um crime se não me escolherem para jogar pela minha casa, e sou obrigado a dizer que concordo. Já sabe em que casa você vai ficar?
— Não — respondeu Harry, sentindo-se a cada minuto mais idiota.
— Bom ninguém sabe mesmo até chegar lá, não é, mas sei que vou ficar na Sonserina, toda a nossa família ficou lá, imagine ficar na Lufa-Lufa, acho que eu saia da escola, você não?
— Hum-hum — concordou Harry, desejando que pudesse responder algo um pouquinho mais interessante.
— Caramba, olha aquele homem! — falou o garoto de repente indicando com a cabeça a vitrine. Rúbeo estava parado diante dela, rindo para Harry e apontando para dois grandes sorvetes para explicar que não podia entrar.
— É o Rúbeo — disse Harry, contente por saber alguma coisa que o garoto não sabia. — Ele trabalha em Hogwarts.
— Ah ouvi falar dele. E uma espécie de empregado, não é?
— É o guarda-caça — explicou Harry. A cada segundo gostava menos do garoto.
— É, isso mesmo. Ouvi falar que é uma espécie de selvagem. Mora num barraco no terreno da escola e de vez em quando toma um pileque, tenta fazer mágicas e acaba tocando fogo na cama.
— Acho que ele é brilhante — retorquiu Harry com frieza.
— Ah, é? — disse o garoto com um leve desdém. — Porque é que ele está acompanhando você? Onde estão os seus pais?
— Estão mortos — respondeu Harry secamente. Não tinha muita vontade de alongar o assunto com esse garoto.
— Ah, lamento — disse o outro, sem parecer lamentar nada.
— Mas eram do nosso povo, não eram?
— Eram bruxos, se é isso que você está perguntando.
— Eu realmente acho que não deviam deixar outro tipo de gente entrar, e você? Não são iguais a nós, nunca foram educados para conhecer o nosso modo de viver. Alguns nunca sequer ouviram falar de Hogwarts até receberem a carta, imagine. Acho que deviam manter a coisa entre as famílias de bruxos. Por falar nisso, como é o seu sobrenome?
Mas antes que Harry pudesse responder, Madame Malkin anunciou:
— Terminei com você, querido.
E, Harry, nada frustrado com a desculpa para interromper a conversa com o garoto, pulou do banquinho para o chão.
— Bom, vejo você em Hogwarts, suponho — disse o garoto de voz arrastada.
Harry ficou muito quieto enquanto comia o sorvete que Hagrid trouxera (chocolate e amora com nozes picadas).
— Que foi? — perguntou Hagrid.
— Nada — mentiu Harry.
Eles pararam para comprar pergaminho e penas. Harry se animou um pouco quando descobriu um vidro de tinta que mudava de cor enquanto a pessoa escrevia. Quando saíram da loja, perguntou:
— Rúbeo, o que é Quadribol?
— Caramba, Harry, vivo me esquecendo que você não sabe quase nada, raios, não saber o que é Quadribol!
— Não faça eu me sentir pior, — e contou a Hagrid sobre o garoto pálido na loja de Madame Malkin. —... E ele disse que nem deviam permitir a gente que pertence à família de trouxas...
— Você não pertence a uma família de trouxas. Se ele soubesse quem você é... Ele cresceu sabendo o seu nome se os pais dele forem bruxos. Você viu o pessoal do Caldeirão Furado. Em todo o caso, o que é que ele sabe das coisas, alguns dos melhores bruxos que já conheci vinham de uma longa linhagem de trouxas. Veja a sua mãe! Veja só quem é irmã dela!
— Então, o que é Quadribol?
— É o nosso esporte. Esporte de bruxos. É como o futebol no mundo dos trouxas. Todos praticam Quadribol. A gente joga no ar montado em vassouras com quatro bolas. É meio difícil explicar as regras.
— E o que são Sonserina e Lufa-Lufa?
— Casas na escola. São quatro. Todo mundo diz que Lufa-Lufa só tem panacas, mas...
— Aposto que estou na Lufa-Lufa — disse Harry — deprimido.
— É melhor a Lufa-Lufa do que a Sonserina — sentenciou Hagrid, misterioso. — Não tem um único bruxo nem uma única bruxa desencaminhados que não tenham passado por Sonserina. Você-Sabe-Quem foi um deles.
— Vol... Desculpe... Você-Sabe-Quem esteve em Hogwarts?
— Há muitos e muitos anos.
Eles compraram os livros escolares de Harry em uma loja chamada Floreios e Borrões, onde as prateleiras estavam abarrotadas até o teto com livros do tamanho de paralelepípedos encadernados em couro, livros do tamanho de selos postais com capas de seda, livros cobertos de símbolos curiosos e alguns livros sem nada. Até Duda, que nunca lia nada, teria ficado doído para pôr as mãos em alguns desses livros. Hagrid quase teve de arrastar Harry para longe do “Pragas e Contrapragas (Encante os seus amigos e confunda os seus inimigos com as últimas vinganças: perda de cabelos, pernas bambas, língua presa e muitas, muitas mais) do Professor Vindicto Viridiano.”
— Eu estava tentando descobrir como rogar uma praga para o Duda.
— Não vou dizer que não é uma boa idéia, mas você não pode usar mágica no mundo dos trouxas a não ser em situações muito especiais — disse Hagrid — De qualquer modo, você ainda não poderia lançar nenhuma dessas pragas, vai precisar de muito estudo antes de chegar a esse nível.
Hagrid não deixou Harry comprar um caldeirão de ouro maciço tampouco ("Diz estanho na sua lista”), mas compraram uma balança bonita para pesar os ingredientes das poções e um telescópio desmontável de latão. Visitaram a farmácia, que era bem fascinante para compensar seu cheiro horrível, uma mistura de ovo estragado e repolho podre. Havia no chão barricas de coisas viscosas, frascos com ervas, raízes secas e pós coloridos cobriam as paredes, feixes de penas, fieiras de dentes e garras retorcidas pendiam do teto. Enquanto Hagrid pedia ao homem atrás do balcão um conjunto de ingredientes básicos para preparar poções para Harry, o próprio Harry examinava chifres de prata de unicórnios, a vinte e um galeões cada, e minúsculos olhos faiscantes de besouros (cinco nuques uma concha).
Ao saírem da farmácia, Hagrid verificou a lista de Harry mais uma vez.
— Só falta a varinha. Ah é, e ainda não comprei o seu presente de aniversário.
Harry sentiu o rosto corar.
— Você não precisa..
— Eu sei que não preciso. Vamos fazer o seguinte, vou comprar um bicho para você. Não vai ser sapo, os sapos saíram de moda há muitos anos, todo mundo ia rir de você, e não gosto de gatos, eles me fazem espirrar. Vou-lhe comprar uma coruja. Todos os garotos querem corujas, são muito úteis, levam cartas e tudo o mais.
Vinte minutos depois, eles saíram do Empório de Corujas, que era escuro e cheio de ruídos e brilhos e olhos que cintilavam como jóias. Harry agora carregava uma grande gaiola com uma bela coruja branca como a neve, que dormia profundamente, a cabeça debaixo da asa. Ele não parava de agradecer, parecia até o Professor Quirrell.
— Não tem do quê — respondia Hagrid rouco. — Acho que você nunca ganhou muitos presentes dos Dursley. Agora só falta Olivaras, a única loja de varinhas, Olivaras, e você precisa ter a melhor varinha do mundo.
Uma varinha mágica... Era realmente o que Harry andara desejando.
A última loja era estreita e feiosa. Letras de ouro descascadas sobre a porta diziam “Olivaras Artesãos de Varinhas de Qualidade desde 382 A.C.” Havia uma única varinha sobre uma almofada púrpura desbotada, na vitrine empoeirada.
Um sininho tocou em algum lugar no fundo da loja quando eles entraram. Era uma lojinha mínima, vazia, exceto por uma única cadeira alta e estreita em que Hagrid se sentou para esperar.
Harry teve uma sensação esquisita como se tivesse entrado em uma biblioteca muito exclusiva, engoliu um monte de perguntas novas que tinham acabado de lhe ocorrer e ficou espiando os milhares de caixas estreitas arrumadas com cuidado até o teto. Por alguma razão, sentiu um arrepio na nuca. A própria poeira e o silêncio ali pareciam retinir com uma magia secreta.
— Boa tarde — disse uma voz suave. Harry se assustou. Hagrid devia ter-se assustado também, porque se ouviu um rangido alto e ele se levantou rapidamente da cadeira alta e estreita.
Havia um velho parado diante deles, os olhos grandes e muito claros brilhando como duas luas na penumbra da loja.
— Alô — disse Harry sem jeito.
— Ah, sim — disse o homem. — Sim, sim. Achei que ia vê-lo em breve. Harry Potter. — Não era uma pergunta. — Você tem os olhos de sua mãe. Parece que foi ontem que ela esteve aqui, comprando a primeira varinha. Vinte e seis centímetros de comprimento, farfalhante, feita de salgueiro. Uma boa varinha para encantamentos.
O Sr. Olivaras chegou mais perto de Harry. Harry desejou que ele piscasse. Aqueles olhos prateados lhe davam um pouco de medo.
— Já o seu pai, deu preferência a uma varinha de mogno. Vinte e oito centímetros. Flexível. Um pouco mais de poder e excelente para transformações. Bom, digo que seu pai deu preferência, na realidade é a varinha que escolhe o bruxo, é claro.
O Sr. Olivaras chegara tão perto que ele e Harry estavam quase encostando os narizes. Harry viu-se refletido naqueles olhos.
— E foi aí que...
O Sr. Olivaras tocou a cicatriz feita pelo relâmpago na testa de Harry com um dedo branco e longo.
— Lamento dizer que vendi a varinha que fez isso — disse ele suavemente. — Trinta e cinco centímetros. Nossa. Uma varinha poderosa, muito poderosa nas mãos erradas... Bom, se eu tivesse sabido o que a varinha ia sair por aí fazendo...
Ele sacudiu a cabeça e então, para alivio de Harry, viu Hagrid.
— Hagrid! Hagrid, Hagrid! Que bom ver você de novo... Carvalho, quarenta centímetros, meio mole, não era?
— Era, sim senhor.
— Boa varinha, aquela. Mas suponho que a tenham partido ao meio quando o expulsaram? — disse o Sr. Olivaras repentinamente sério.
— Hum... Partiram, é verdade — disse Hagrid, arrastando os pés. — Mas ainda guardo os pedaços — acrescentou animado.
— Mas você não os usa? — perguntou o Sr. Olivaras severo.
— Ah, não senhor — respondeu depressa Hagrid. Harry reparou que ele apertou o guarda-chuva cor-de-rosa com força ao responder — Hum — resmungou o Sr. Olivaras, lançando um olhar penetrante a Hagrid. — Bom agora, Sr. Potter vamos ver. — E tirou uma longa fita métrica com números prateados do bolso. — Qual é o braço da varinha?
— Hum... Bom, sou destro — respondeu Harry.
— Estique o braço. Isso. — Ele mediu Harry do ombro ao dedo, depois do pulso ao cotovelo, do ombro ao chão, do joelho à axila e ao redor da cabeça. Enquanto media, disse, — Toda varinha Olivaras tem o miolo feito de uma poderosa substância mágica, Sr. Potter. Usamos pelos de unicórnio, penas de cauda de fênix e cordas de coração de dragão. Não há duas varinhas Olivaras iguais como não há unicórnios, dragões nem fênix iguais. E é claro, o senhor jamais conseguirá resultados tão bons com a varinha de outro bruxo.
Harry de repente percebeu que a fita métrica, que o media entre as narinas, estava medindo sozinha. O Sr. Olivaras andava rapidamente em volta das prateleiras, descendo caixas.
— Já chega — falou, e a fita métrica afrouxou e caiu formando um montinho no chão. — Certo, então, Sr. Potter. Experimente esta. Faia e corda de coração de dragão. Vinte e três centímetros. Boa e flexível. Apanhe e experimente.
Harry apanhou a varinha e (sentindo-se bobo) fez alguns movimentos com ela, mas o Sr. Olivaras a tirou de sua mão quase imediatamente.
— Bordo e pena de fênix. Dezoito centímetros. Bem elástica. Experimente.
Harry experimentou, mas mal erguera a varinha quando, mais uma vez, o Sr. Olivaras a tirou de sua mão.
— Não, não. Tome, ébano e pêlo de unicórnio, vinte e dois centímetros, flexíveis. Vamos, vamos, experimente.
Harry experimentou. E experimentou. Não fazia idéia do que é que o Sr. Olivaras estava esperando. A pilha de varinhas experimentadas estava cada vez maior em cima da cadeira alta e estreita, mas, quanto mais varinhas o Sr. Olivaras tirava das prateleiras, mais feliz parecia ficar.
— Freguês difícil, hein? Não se preocupe, vamos encontrar a varinha perfeita para o senhor em algum lugar, estou em duvida, agora... É, por que não? Uma combinação incomum, azevinho e pena de fênix, vinte e oito centímetros, boa e maleável.
Harry apanhou a varinha. Sentiu um repentino calor nos dedos. Ergueu a varinha acima da cabeça, baixou-a cortando o ar empoeirado com um zunido, e uma torrente de faíscas douradas e vermelhas saíram da ponta como um fogo de artifício, atirando fagulhas luminosas que dançavam nas paredes. Hagrid gritou entusiasmado e bateu palmas e o Sr. Olivaras exclamou:
— Bravo! Mesmo, ah, muito bom. Ora, ora, ora... Que curioso... Curiosíssimo...
Repôs a varinha de Harry na caixa e embrulhou-a em papel pardo, ainda resmungando:
— Curioso... Curioso...
— O senhor me desculpe — disse Harry —, mas o que é curioso?
O Sr. Olivaras encarou Harry com aqueles olhos claros.
— Lembro-me de cada varinha que vendi, Sr. Potter. De cada uma. Acontece que a fênix cuja pena está na sua varinha produziu mais uma pena, apenas mais uma. É muito curioso que o senhor tenha sido destinado para esta varinha porque a irmã dela, ora, a irmã dela produziu a sua cicatriz.
Harry engoliu em seco.
— E, tinha trinta e quatro centímetros. Puxa. É realmente curioso como essas coisas acontecem. A varinha escolhe o bruxo, lembre-se... Acho que podemos esperar grandes feitos do senhor, Sr. Potter. Afinal, Aquele-Que-Não-Se-Deve-Nomear realizou grandes feitos, terríveis, sim, mas grandes.
Harry estremeceu. Não tinha muita certeza se gostava do Sr. Olivaras. Pagou sete galeões pela varinha e o Sr. Olivaras curvou-se à saída deles.
O sol de fim de tarde quase chegara ao horizonte quando Harry e Hagrid refizeram o caminho para sair do Beco Diagonal, atravessar a parede e passar novamente pelo Caldeirão Furado, agora vazio. Harry não disse uma palavra enquanto caminhavam pela rua, nem ao menos reparou quantas pessoas se boquiabriam para eles no metrô, carregados que estavam com todos aqueles pacotes de formatos esquisitos, a coruja branca adormecida no colo de Harry. Subiram a escada rolante para a estação de Paddington, Harry só percebeu onde estavam quando Hagrid bateu em seu ombro.
— Temos tempo para comer alguma coisa antes do trem sair — falou.
Comprou um hambúrguer para Harry e se sentaram em bancos de plástico para comê-los. Harry não parava de olhar a toda volta. Por alguma razão tudo parecia tão estranho.
— Você está bem, Harry? Está muito calado — comentou Hagrid.
Harry não tinha muita certeza de poder explicar. Tivera o melhor aniversário de sua vida, porém... E mastigava o hambúrguer, tentando encontrar as palavras.
— Todo o mundo acha que sou especial — disse finalmente. — Todas aquelas pessoas no Caldeirão Furado, o Professor Quirrell, o Sr. Olivaras... Mas eu não conheço nadinha de mágica. Como podem esperar grandes feitos de mim? Sou famoso e nem ao menos me lembro o porquê. Não sei o que aconteceu quando Vol... Desculpe... Quero dizer, na noite que meus pais morreram.
Hagrid se debruçou sobre a mesa. Por trás da barba e das sobrancelhas desgrenhadas tinha um sorriso bondoso.
— Não se preocupe, Harry. Você vai aprender bem depressa. Todos começaram pelo começo em Hogwarts, você vai se dar bem. Seja você mesmo. Sei que é difícil. Você vai ser discriminado e isso é muito duro. Mas vai se divertir a valer em Hogwarts. Eu me diverti: e ainda me divirto, para dizer a verdade.
Hagrid ajudou Harry a embarcar no trem que o levaria de volta aos Dursley, então lhe entregou um envelope.
— A sua passagem para Hogwarts. Primeiro de setembro, na estação de King's Cross, está tudo na passagem. Qualquer problema com os Dursley me mande uma carta pela coruja, ela saberá onde me encontrar... Vejo você em breve, Harry.
O trem parou na estação. Harry queria ficar espiando Hagrid até ele desaparecer de vista, levantou-se, espremeu o nariz contra o vidro da janela, mas quando piscou os olhos Hagrid tinha desaparecido.

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