Posted by : Unknown junho 04, 2014

Capítulo 17


No final da tarde, poucos dias depois do Ano-Novo, Harry, Rony e Gina se enfileiraram ao lado do fogão da cozinha para regressar a Hogwarts. O Ministério providenciara essa conexão com a Rede de Flu para os estudantes poderem se transportar à escola com rapidez e segurança. Apenas a Sra. Weasley estava presente para se despedir, porque o marido, Fred, Jorge, Gui e Fleur estavam no trabalho. A Sra. Weasley debulhou-se em lágrimas no momento da separação. Nos últimos tempos, era preciso muito pouco para fazê-la chegar às lágrimas; andava chorando a toda hora desde que Percy se retirara bruscamente de casa no dia de Natal, com os óculos sujos de purê de pastinaca (pelo que Fred, Jorge e Gina se diziam responsáveis).
— Não chore, mamãe — consolava-a Gina, dando palmadinhas nas costas da mãe chorosa ao seu ombro. — Tá tudo bem.
— É, não se preocupe conosco — disse Rony, deixando a mãe plantar-lhe um beijo muito molhado na bochecha — nem com o Percy. Ele é tão babaca que não se perde grande coisa, não é?
A Sra. Weasley soluçou ainda mais forte ao abraçar Harry.
— Prometa que vai se cuidar... não se meta em confusões...
— Eu sempre me cuido, Sra. Weasley. Gosto de levar uma vida tranqüila, a senhora me conhece.
Ela deu uma risada lacrimosa e se afastou.
— Comportem-se, então, todos vocês...
Harry entrou nas chamas verde-esmeralda e gritou:
— Hogwarts! — Ele teve uma última e fugaz visão da cozinha da Sra. Weasley e do seu rosto molhado de lágrimas antes de ser envolvido pelas chamas; rodopiando velozmente, captou vislumbres difusos de outros aposentos de bruxos, que sumiam de vista antes que ele pudesse vê-los direito; por fim desacelerou e parou alinhado com a lareira da sala da professora McGonagall. Ela mal ergueu os olhos do seu trabalho quando ele saiu engatinhando da lareira.
— Noite, Potter. Procure não deixar muita cinza no tapete.
— Sim, professora.
Harry ajeitou os óculos e achatou os cabelos na hora em que Rony surgiu, rodopiando. Quando Gina chegou, os três saíram da sala de McGonagall e tomaram a direção da Torre da Grifinória. No caminho, Harry espiou pelas janelas do corredor; o sol já estava se pondo nos terrenos da escola cobertos por um tapete de neve mais alto do que o d’A Toca. Ao longe, viu Hagrid alimentando Bicuço na frente da cabana.
— Bolas festivas — disse Rony, confiante, quando chegaram ao quadro da Mulher Gorda, que estava bem mais pálida do que o normal e fez uma careta à voz alta do garoto.
— Não — respondeu ela.
— Como assim “não”?
— Há uma nova senha. E, por favor, não grite.
— Mas estivemos fora, como é que...?
— Harry! Gina!
Hermione corria em sua direção, de rosto muito corado, trajando capa, chapéu e luvas.
— Cheguei há umas duas horas, dei um pulinho lá embaixo para visitar Hagrid e Bicuço, quero dizer, Asafugaz — disse sem fôlego. — Tiveram um bom Natal?
— Tivemos — respondeu Rony na mesma hora —, bem movimentado, Rufo Scrimgeour...
— Tenho uma coisa para você, Harry — falou Hermione sem olhar para Rony, nem dar sinal de que o ouvira. — Ah, calma aí, a senha. Abstinência.
— Exatamente — confirmou a Mulher Gorda com voz fraca, e girou abrindo o buraco do retrato.
— Que é que ela tem? — perguntou Harry.
— Aparentemente exagerou no Natal — informou Hermione, olhando para o teto e abrindo caminho para a sala comunal repleta de alunos. — Ela e a amiga Violeta acabaram com aquele vinho no quadro dos monges bêbados junto ao corredor de Feitiços. Então...
Ela remexeu no bolso um instante e tirou um rolo de pergaminho com a caligrafia de Dumbledore.
— Legal — exclamou Harry, desenrolando-o imediatamente e descobrindo que sua próxima aula com Dumbledore estava marcada para a noite seguinte. — Tenho um monte de coisas para contar a ele... e a você. Vamos sentar...
Mas naquele momento ouviram um guincho de “Uon-Uon!”, e Lilá Brown apareceu correndo, ninguém sabe de onde, e atirou-se nos braços de Rony. Muitas pessoas ao redor abafaram risinhos. Hermione soltou uma risada tilintante e disse:
— Tem uma mesa ali adiante... você vem, Gina?
— Não, obrigada, prometi me encontrar com o Dino — respondeu a garota, embora Harry não pudesse deixar de notar que não parecia muito entusiasmada. Deixando Rony e Lilá atracados em uma espécie de luta livre vertical, Harry conduziu Hermione para a mesa vazia.
— Então, como foi o Natal?
— Ah, bom — ela sacudiu os ombros. — Nada especial. E como foi na casa do Uon-Uon?
— Conto num minuto — disse Harry. — Olhe, Hermione, será que você não pode...
— Não, não posso — respondeu ela taxativamente. — Por isso nem me peça.
— Pensei que talvez, sabe, durante as férias de Natal...
— Foi a Mulher Gorda que bebeu um barril de vinho de quinhentos anos, Harry, e não eu. Então, que notícias importantes eram essas que você queria me contar?
No momento ela parecia agressiva demais para discussões, então Harry deixou de lado o assunto Rony e relatou o que escutara Malfoy e Snape dizerem.
Quando ele terminou, Hermione refletiu por um instante e disse:
— Você não acha...?
— ...que ele estava fingindo oferecer ajuda para poder induzir Malfoy a lhe contar o que estava fazendo?
— Bem, é isso.
— O pai de Rony e Lupin acham que sim — concedeu Harry de má vontade. — Mas isto só prova que Malfoy está tramando alguma coisa, isto você não pode negar.
— Não, não posso — respondeu ela lentamente.
— E ele está agindo por ordens de Voldemort, exatamente como falei!
— Hum... algum dos dois chegou a mencionar o nome de Voldemort? — Harry franziu a testa, tentando lembrar.
— Não tenho certeza... Snape disse “o seu senhor”, quem mais poderia ser?
— Não sei — respondeu Hermione mordendo o lábio. — Talvez o pai dele?
Ela fixou o olhar do lado oposto da sala, aparentemente perdida em pensamentos, sem sequer reparar que Lilá fazia cócegas em Rony.
— Como vai o Lupin?
— Nenhuma maravilha — respondeu Harry contando-lhe a missão de Lupin entre os lobisomens e as dificuldades que estava enfrentando. — Você já ouviu falar de Lobo Greyback?
— Já! — exclamou Hermione levando um susto. — E você também, Harry!
— Quando, em História da Magia? Você sabe muito bem que nunca prestei atenção...
— Não, não, não foi em História da Magia: Malfoy usou o Lobo para ameaçar Borgin! Lá na travessa do Tranco, não se lembra? Ele disse que o Lobo Greyback era um velho amigo da família e que iria verificar o andamento do serviço!
Harry ficou boquiaberto.
— Eu tinha me esquecido! Mas isto comprova que Malfoy é um Comensal da Morte, de que outro modo ele poderia estar em contato com Greyback, e lhe dizer o que fazer?
— É muito suspeito — sussurrou Hermione. — A não ser que...
— Ah, fala sério — exclamou Harry exasperado —, não dá para você justificar essa!
— Bem... há uma possibilidade de que tenha sido uma falsa ameaça.
— Você é inacreditável, ah, é — disse Harry balançando a cabeça. — Você vai ver quem tem razão... você vai engolir o que está dizendo, Hermione, como fez o Ministério. Ah, sim, e também tive uma briga com Rufo Scrimgeour...
E o resto da noite se passou amigavelmente, com os dois xingando o ministro da Magia, porque Hermione, tal como Rony, achou que, depois de tudo que o Ministério tinha feito Harry sofrer no ano anterior, era muita cara-de-pau agora lhe pedir ajuda.
O novo trimestre começou na manhã seguinte com uma surpresa agradável para o sexto ano: um grande aviso fora pregado durante a noite nos quadros da sala comunal.

AULAS DE APARATAÇÃO
Se você tem dezessete anos, ou vai completá-los até 31 de agosto, inclusive, poderá se inscrever em um curso de Aparatação de doze aulas semanais com um instrutor do Ministério da Magia.
Se quiser participar, assine abaixo, por favor.
Custo: 12 galeões

Harry e Rony se juntaram à multidão que se acotovelava em volta do aviso, revezando-se para se inscrever no local indicado. Rony ia apanhando a caneta para assinar em seguida a Hermione quando Lilá se aproximou sorrateiramente pelas costas dele, cobriu seus olhos com as mãos e cantarolou “Adivinha quem é, Uon-Uon?”. Harry virou-se e viu Hermione se afastar discretamente; foi em seu encalço porque não tinha o menor desejo de ficar para trás com Rony e Lilá, mas, para sua surpresa, Rony os alcançou um pouco adiante do buraco do retrato, com as orelhas em fogo e uma expressão aborrecida no rosto. Sem dizer uma palavra, Hermione se apressou para caminhar com Neville.
— Então, Aparatação — começou Rony, deixando perfeitamente claro pelo seu tom de voz que Harry não devia mencionar o que acabara de acontecer. — Deve ser maneiro, eh?
— Não sei, não — disse Harry. — Talvez seja melhor quando a gente aparata sozinho, eu não gostei muito quando Dumbledore me levou de carona.
— Esqueci que você já aparatou... É bom eu passar no teste da primeira vez — comentou Rony parecendo ansioso. — Fred e Jorge passaram.
— Mas Carlinhos levou bomba, não foi?
— É, mas Carlinhos é maior do que eu — Rony esticou os braços para os lados como se fosse um gorila —, e com isso Fred e Jorge não gozaram muito com a cara dele... pelo menos não pela frente...
— Quando é que podemos fazer o teste real?
— Assim que completarmos dezessete anos. Para mim, isto quer dizer em março!
— É, mas você não poderia aparatar aqui, não no castelo...
— Não é o que está em jogo. Todo o mundo ia ficar sabendo que eu poderia aparatar se quisesse.
Rony não foi o único a ficar excitado com a perspectiva de aparatar. Durante todo o dia falou-se muito sobre as futuras aulas; deu-se muita importância à habilidade de desaparecer e reaparecer à vontade.
— Vai ser maneiro quando a gente puder... — Simas estalou os dedos para indicar sumiço. — Meu primo Fergus faz isso só para implicar comigo, espere até eu poder fazer o mesmo... ele nunca mais vai ter um momento de paz na vida...
Perdido em visões dessa feliz perspectiva, ele agitou a varinha com excessivo entusiasmo, e em vez de produzir a fonte de água pura que era o objeto da aula de Feitiços daquele dia, materializou um jato de mangueira que ricocheteou no teto e derrubou o professor Flitwick de cara no chão.
— Harry já aparatou — Rony contou ao espantado Simas, depois que o professor se enxugou com um aceno da varinha e mandou-o escrever uma frase várias vezes (“Sou um bruxo e não um babuíno empunhando uma varinha.”)— Dum... ah... uma pessoa fez uma Aparatação-acompanhada com ele, sabe.
— Pô! — sussurrou Simas, e ele, Dino e Neville juntaram as cabeças para escutar como era uma Aparatação. Pelo resto do dia, Harry foi assediado com pedidos de outros sextanistas para descrever como alguém se sentia quando aparatava. Todos manifestavam assombro em vez de desapontamento quando contava o desconforto que era, e, ele ainda respondia a perguntas detalhadas às dez para as oito da noite, quando foi obrigado a inventar que precisava devolver um livro à biblioteca, para se livrar em tempo de ir à aula de Dumbledore.
Os lampiões no escritório do diretor estavam acesos, os retratos dos diretores anteriores roncavam suavemente em suas molduras e a Penseira estava mais uma vez pronta sobre a escrivaninha. As mãos de Dumbledore estavam dos lados da Penseira, a direita escura e queimada como sempre. Não parecia ter sarado, e Harry ficou imaginando, talvez pela centésima vez, o que teria causado aquele ferimento singular, mas não perguntou nada; Dumbledore dissera que lhe contaria no momento certo e, seja como for, havia outro assunto que ele queria discutir. Antes, porém, que Harry pudesse mencionar qualquer coisa sobre Snape e Malfoy, Dumbledore falou:
— Ouvi dizer que você se encontrou com o ministro da Magia no Natal.
— Verdade — respondeu Harry. — Ele não ficou muito satisfeito comigo.
— Não — suspirou Dumbledore. — Ele também não está muito satisfeito comigo. É preciso tentar não sucumbir sob o peso de nossas angústias, Harry, e continuar a lutar.
O garoto sorriu.
— Ele queria que eu dissesse à comunidade bruxa que o Ministério está fazendo um trabalho maravilhoso.
Dumbledore sorriu.
— Originalmente, essa idéia foi de Fudge, sabe. Nos últimos dias de Ministério, quando ele ainda tentava desesperadamente se manter no cargo, quis se encontrar com você, na esperança de receber seu apoio...
— Depois de tudo que ele fez no ano passado? — exclamou Harry irritado. — Depois da Umbridge?
— Eu disse ao Cornélio que não havia a menor chance, mas a idéia não morreu quando ele deixou o cargo. Horas depois de Scrimgeour ser nomeado, nos encontramos e ele exigiu que eu marcasse uma reunião com você...
— Então foi por isso que os senhores se desentenderam! — deixou escapar Harry. — Deu no Profeta Diário.
— O Profeta Diário às vezes acaba noticiando a verdade, ainda que por acaso. Certo, foi por isso que discutimos.
Bem, parece que finalmente Rufo descobriu um jeito de encurralar você.
— Ele me acusou de ser “por inteiro um homem de Dumbledore”.
— Que grosseria a dele.
— Eu respondi a ele que era.
Dumbledore abriu a boca para falar e tornou a fechá-la. Às costas de Harry, Fawkes, a fênix, soltou um pio baixo, suave e melodioso. Para seu intenso constrangimento, Harry percebeu repentinamente que os olhos muito azuis de Dumbledore pareciam marejados, e depressa começou a encarar os próprios joelhos. Quando o diretor falou, porém, sua voz estava bem firme.
— Fico muito comovido, Harry.
— Scrimgeour queria saber aonde o senhor vai quando não está em Hogwarts — tornou Harry, ainda fixando os joelhos.
— É, ele anda muito curioso a respeito disso — disse Dumbledore, agora com a voz animada, e Harry achou que já era seguro erguer os olhos. — Chegou a tentar mandar me seguir. Na realidade, é engraçado. Pôs Dawlish no meu rastro. Não foi nada gentil. Já fui obrigado a azarar Dawlish uma vez; tive de fazer isto outra vez, lamentando muito.
— Então eles continuam sem saber aonde o senhor vai? — perguntou Harry esperando obter mais informações sobre sua intrigante ausência, mas os olhos de Dumbledore meramente sorriram por cima dos oclinhos de meia-lua.
— Continuam, e ainda não chegou a hora de você saber. Agora sugiro que nos apressemos, a não ser que tenha mais alguma coisa...?
— Na realidade tenho, sim, senhor. E sobre Malfoy e Snape.
— Professor Snape, Harry.
— Sim, senhor. Eu escutei os dois durante a festa do professor Slughorn... bem, para dizer a verdade, eu os segui...
Dumbledore ouviu impassível a história de Harry. Quando o garoto terminou, ele permaneceu calado por alguns momentos, depois disse:
— Obrigado por me contar, Harry, mas sugiro que você esqueça esse assunto. Acho que não tem grande importância.
— Não tem grande importância? — repetiu Harry incrédulo. — Professor, o senhor entendeu...?
— Claro, Harry, abençoado como sou com uma extraordinária capacidade intelectual, entendi tudo que me contou — disse Dumbledore, com uma certa rispidez. — Acho mesmo que você talvez devesse considerar a possibilidade de eu ter entendido mais do que você. Mais uma vez fico satisfeito que tenha confiado em mim, mas asseguro que você não me disse nada que possa me inquietar.
Harry ficou parado em furioso silêncio, olhando zangado para Dumbledore. Que estava acontecendo? Será que isto significava que, de fato, o diretor dera ordem a Snape para descobrir o que Malfoy estava fazendo, caso em que já teria sabido de tudo que Harry acabava de lhe contar pela boca do próprio Snape? Ou será que estava realmente preocupado com o que ouvira e fingia não estar?
— Então, senhor — perguntou Harry num tom que desejava que fosse educado e calmo —, o senhor decididamente ainda confia...?
— Já fui bastante tolerante em ter respondido a essa pergunta — replicou Dumbledore, mas sua voz já não parecia muito tolerante. — Minha resposta não mudou.
— Eu acharia que não — falou uma voz irônica; evidentemente era Fineus Nigellus que apenas fingia estar dormindo. Dumbledore não lhe deu atenção.
— E agora, Harry, devo insistir que nos apressemos. Tenho coisas mais importantes a discutir com você hoje à noite.
Harry sentiu-se revoltado. Que aconteceria se ele não permitisse a mudança de assunto, se insistisse em sua suspeita contra Malfoy? Como se tivesse lido a mente de Harry, Dumbledore balançou a cabeça.
— Ah, Harry, com que freqüência isso ocorre até entre os melhores amigos! Cada qual acredita que o que tem a dizer é muito mais importante do que qualquer coisa que o outro tenha a contribuir!
— Eu não acho que seja pouco importante o que o senhor tem a dizer — disse Harry, formal.
— Bem, você tem toda razão, porque não é — respondeu o diretor com energia. — Tenho mais duas lembranças para lhe mostrar esta noite, ambas obtidas com enorme dificuldade, e creio que a segunda seja a mais importante que já recolhi.
Harry não fez comentários; ainda sentia raiva pela reação de Dumbledore às suas confidencias, mas não via o que poderia ganhar se continuasse a discutir.
— Então — disse o diretor em tom ressonante —, na reunião desta noite daremos prosseguimento à história de Tom Riddle, que na última aula deixamos no limiar de sua entrada em Hogwarts. Você lembrará como ele ficou excitado ao ouvir que era bruxo, que recusou a minha companhia para ir ao Beco Diagonal e que eu, por minha vez, o alertei contra a prática de furtos quando chegasse à escola.
“Bem, chegou o início do ano escolar e com ele veio Tom Riddle, um garoto quieto, com vestes de segunda mão, que se enfileirou com os outros calouros para a Seleção. Quase no instante em que o Chapéu Seletor tocou sua cabeça, ele foi colocado na Sonserina — continuou Dumbledore, indicando com a mão escurecida a prateleira acima de sua cabeça onde estava o Chapéu Seletor, antigo e imóvel. — Não sei em que momento Riddle soube que o famoso fundador da Casa era capaz de falar com as cobras, talvez naquela mesma noite. Este conhecimento só pode tê-lo alvoroçado e incentivado o seu senso de importância.
“Contudo, se estava assustando ou impressionando os colegas da Sonserina com demonstrações de ofidioglossia na sala comunal, os professores de nada souberam. Ele não manifestava nenhum sinal de arrogância ou agressividade. Sendo um órfão talentoso e muito bonito, é claro que atraiu a atenção e a solidariedade dos professores quase na hora em que chegou. Parecia educado, quieto e sedento de saber. Deixou praticamente todos bem impressionados.”
— O senhor não contou a eles como era o Tom quando o conheceu no orfanato? — perguntou Harry.
— Não, não contei. Embora ele não tivesse demonstrado o menor remorso, era possível que estivesse arrependido pelo seu comportamento anterior e resolvido a virar a página. Preferi lhe dar essa oportunidade.
Dumbledore fez uma pausa e olhou curioso para Harry, que abrira a boca para falar. Ali estava novamente a sua tendência a confiar nas pessoas, apesar dos indícios avassaladores de que não mereciam sua confiança! Mas Harry então se lembrou de uma coisa...
— Mas o senhor não confiava nele realmente, não é? Ele me disse... o Riddle que saiu daquele diário disse: “Dumbledore nunca pareceu gostar tanto de mim quanto os outros professores.”
— Digamos que eu não pressupus que ele fosse confiável — respondeu Dumbledore. — Conforme já mencionei, eu tinha decidido vigiá-lo de perto, e foi o que fiz. Não posso fingir que, a princípio, tenha conseguido grande coisa com as minhas observações. Ele era muito reservado comigo; percebia, sem dúvida, que, na emoção de descobrir sua verdadeira identidade falara demais. Cuidava-se para não tornar a revelar tanto, mas não podia retirar o que deixara escapar em sua empolgação nem o que a Sra. Cole me confidenciara. Tinha, no entanto, o bom senso de jamais tentar me cativar como fazia com tantos colegas meus.
“À medida que progredia na vida escolar, ele foi reunindo ao seu redor um grupo de ‘amigos dedicados’; eu os chamo assim, na falta de um termo melhor, embora eu já tenha mencionado que inegavelmente Riddle não sentia afeto por nenhum deles. O grupo exercia uma espécie de fascinação sombria no castelo. Era urna coleção variada; uma mistura de fracos em busca de proteção, ambiciosos em busca de partilhar sua glória, e violentos que gravitavam em torno de um líder capaz de ensinar formas mais requintadas de crueldade. Em outras palavras, eles foram os precursores dos Comensais da Morte, e, na verdade, quando terminaram Hogwarts, alguns deles se tornaram os primeiros Comensais.
“Controlados com rigor por Riddle, nunca foram apanhados agindo mal abertamente, embora os sete anos que passaram em Hogwarts tivessem sido marcados por numerosos incidentes desagradáveis a que eles jamais foram comprovadamente ligados, entre os quais a abertura da Câmara Secreta — sem dúvida, o mais sério deles — que resultou na morte de uma garota. Hagrid, como você sabe, foi injustamente acusado desse crime.
“Não consegui encontrar muitas lembranças de Riddle em Hogwarts — disse Dumbledore, pousando a mão murcha na Penseira. — Poucos que o conheceram naquele tempo querem falar sobre ele; estão aterrorizados demais. Descobri o que sei depois de sua saída de Hogwarts, depois de penosos esforços, depois de localizar os poucos que poderiam ser induzidos a falar, depois de pesquisar em registros antigos e interrogar testemunhas bruxas e trouxas.
“Aqueles que consegui convencer a falar me contaram que Riddle tinha obsessão por sua ascendência. O que, naturalmente, é compreensível; tinha sido criado em um orfanato e naturalmente queria saber como fora parar lá. Parece que procurou em vão algum vestígio de Tom Riddle pai nos brasões da sala de troféus, nas listas de monitores nos antigos registros da escola, e até mesmo em livros de história bruxa. Por fim, foi forçado a aceitar que seu pai jamais pusera os pés em Hogwarts. Creio ter sido então que ele abandonou o seu nome para sempre, assumiu a identidade de Lord Voldemort e começou a investigar a família de sua desprezada mãe — a mulher que, você lembrará, ele achava que não podia ser bruxa porque sucumbira à vergonhosa fraqueza humana da morte.
“Sua única pista era o nome ‘Servolo’, que, segundo soubera pelos que dirigiam o orfanato, era o nome do pai de sua mãe. Finalmente, depois de penosas pesquisas em velhos livros de famílias bruxas, ele descobriu a existência do ramo sobrevivente da família Slytherin. No verão de seu décimo sexto aniversário, saiu do orfanato ao qual retornava todo ano e foi procurar seus parentes Gaunt. E agora, Harry, se você se levantar...”
Dumbledore ergueu-se, e Harry viu que de novo segurava um frasquinho de cristal em que revolvia uma lembrança perolada.
— Tive muita sorte em recolher esta — disse, despejando a massa refulgente na Penseira.
— Você entenderá a razão quando a tiver vivenciado. Vamos?
Harry se aproximou da bacia de pedra e se inclinou obedientemente até seu rosto afundar na superfície da lembrança; teve a conhecida sensação de cair no vácuo, e em seguida aterrissou em um piso de pedra suja envolto em quase total escuridão.
Ele precisou de vários segundos para reconhecer o lugar, tempo que levou para Dumbledore aterrissar ao seu lado. A casa dos Gaunt agora estava indescritivelmente mais imunda do que qualquer lugar que Harry já vira. O teto estava coalhado de teias de aranha, o chão coberto por uma camada de sujeira; havia comida mofada e podre sobre a mesa, em meio a várias panelas com crostas. A única luz vinha de uma vela derretida, colocada aos pés de um homem com cabelos e barba tão crescidos que Harry não conseguia distinguir nem olhos nem boca. Ele estava largado em uma poltrona junto à lareira, e o garoto se perguntou por um momento se estaria morto. Ouviu-se, então, uma forte batida na porta e o homem despertou instantaneamente, empunhando uma varinha na mão direita e uma faca curta na esquerda.
A porta se entreabriu, rangendo. Na soleira, segurando um lampião antiquado, encontrava-se um garoto que Harry reconheceu na hora: alto, pálido, os cabelos escuros, bonito — o Voldemort adolescente.
Seu olhar percorreu lentamente o casebre e deparou com o homem na poltrona. Por alguns segundos eles se encararam, então o homem se pôs de pé com dificuldade, as muitas garrafas a seus pés tombaram e reuniram no chão.
— VOCÊ! — berrou ele. — VOCÊ!
E ele se arremessou ebriamente contra Riddle, a varinha e a faca erguidas.
— Pare.
Riddle falou em linguagem de cobra. O homem derrapou e bateu na mesa, lançando as panelas emboloradas no chão, onde caíram com estrepito. Ele encarou Riddle. Fez-se um longo silêncio enquanto se estudavam. O homem perguntou:
— Você sabe falar?
— Sei falar — respondeu Riddle. Ele entrou na sala permitindo que a porta se fechasse às suas costas. Harry não pôde deixar de sentir uma admiração mesclada de ressentimento pelo completo destemor de Voldemort. Seu rosto expressava apenas desagrado e, talvez, desapontamento.
— Onde está Servolo? — perguntou ele.
— Morreu. Morreu há anos, não foi? — Riddle franziu a testa.
— Quem é você, então?
— Sou Morfino, não sou?
— O filho de Servolo?
— Claro que sou, então...
Morfino afastou os cabelos do rosto sujo, para enxergar Riddle melhor, e Harry notou que ele usava o anel de pedra negra na mão direita.
— Pensei que você fosse aquele trouxa — sussurrou Morfino. — Você é a cara daquele trouxa.
— Que trouxa? — perguntou Riddle com rispidez.
— Aquele trouxa que minha irmã gostava, aquele trouxa que mora na casa grande mais adiante na estrada — respondeu Morfino, e inesperadamente cuspiu no chão entre os dois. — Você é igualzinho a ele. Riddle. Mas ele está mais velho agora, não é? Mais velho do que você, agora que estou pensando...
Morfino pareceu ligeiramente atordoado e oscilou um pouco, ainda se apoiando na borda da mesa.
— Ele voltou, sabe — acrescentou tolamente.
Voldemort mirava Morfino como se avaliasse suas possibilidades. Aproximou-se um pouco mais e perguntou:
— Riddle voltou?
— Ai, deixou ela, e foi bem feito, casar com ralé! — explicou Morfino, e tornou a cuspir no chão. — E roubou a gente, veja bem, antes de fugir! Onde está o medalhão, eh, onde está o medalhão de Slytherin?
Voldemort não respondeu. Morfino foi se enraivecendo outra vez; brandiu a faca e gritou:
— Ela desonrou a gente, foi o que ela fez, a vadia! E quem é você para entrar aqui e ficar fazendo perguntas sobre isso? Já acabou, não é... acabou...
Ele desviou o olhar, cambaleando um pouco, e Voldemort se adiantou. Ao fazer isso, sobreveio uma escuridão anormal, que apagou a luz do lampião de Voldemort e a vela de Morfino, apagou tudo...
Os dedos de Dumbledore apertaram o braço de Harry e eles tornaram a voar para o presente. A claridade suave e dourada do escritório de Dumbledore pareceu ofuscar os olhos de Harry depois daquela escuridão impenetrável.
— É só isso? — perguntou o garoto imediatamente. — Por que ficou escuro, que aconteceu?
— Porque Morfino não conseguiu lembrar mais nada daquele ponto em diante — respondeu Dumbledore, fazendo um gesto para que Harry tornasse a sentar. — Quando ele acordou na manhã seguinte, estava deitado no chão, sozinho. O anel de Servolo desaparecera.
“Nesse meio-tempo, na aldeia de Little Hangleton, uma empregada corria pela rua principal gritando que havia três corpos caídos na sala de visitas da casa grande: Tom Riddle pai, e a mãe e o pai dele.
“As autoridades trouxas ficaram perplexas. Pelo que sei, até hoje não sabem como os Riddle morreram, porque a Maldição Avada Kedavra normalmente não produz dano visível... a exceção acha-se à minha frente — acrescentou Dumbledore, indicando a cicatriz de Harry. — Por outro lado, o Ministério percebeu na mesma hora que se tratava de um homicídio bruxo. Percebeu também que um sentenciado que odiava trouxas morava no vale do lado oposto à casa dos Riddle, um bruxo que já fora preso por atacar uma das pessoas assassinadas.
“Então o Ministério fez uma visita a Morfino. Não precisaram interrogá-lo nem usarVeritaserum nem Legilimência. Ele confessou o homicídio imediatamente, fornecendo detalhes que somente o assassino poderia conhecer. Disse que sentia orgulho de ter matado os trouxas, havia anos que esperava essa oportunidade. Ele entregou a varinha, e logo se comprovou que fora usada para matar os Riddle. E Morfino se deixou levar para Azkaban sem resistir. A única coisa que o perturbava era que o anel de seu pai desaparecera. ‘Ele vai me matar por ter perdido o anel’, repetia, sem parar, aos seus captores. E, aparentemente, isso foi tudo que voltou a dizer. Ele viveu o resto da vida em Azkaban, lamentando a perda da última peça herdada por Servolo, e foi enterrado ao lado da prisão com outros pobres coitados que expiraram em seu interior.”
— Então Voldemort roubou a varinha de Morfino e a usou? — perguntou Harry, sentando-se ereto.
— Exatamente — respondeu Dumbledore. — Não temos lembranças para confirmar isto, mas acho que podemos ter razoável certeza do que aconteceu. Voldemort estuporou o tio, apanhou sua varinha e atravessou o vale em direção “à casa grande mais adiante na estrada”. Lá, ele matou o trouxa que abandonara sua mãe bruxa, e, por precaução, os avós trouxas, suprimindo, assim, os últimos membros da indigna família Riddle e vingando-se do pai que jamais o quisera. Voltou, então, ao casebre dos Gaunt, realizou o complexo feitiço de implantar uma falsa lembrança na mente do tio, colocou a varinha de Morfino ao lado do seu dono inconsciente, guardou o anel antigo que ele usava e partiu.
— E Morfino nunca percebeu que não tinha sido ele?
— Nunca. Como digo, ele fez uma confissão vaidosa e completa.
— Mas durante todo esse tempo guardou a lembrança verdadeira!
— Guardou, mas foi necessária uma boa dose de competente Legilimência para fazê-la aflorar. E por que alguém iria se deter mais tempo examinando a mente de Morfino se ele já confessara o crime? Contudo, consegui permissão para visitá-lo em suas últimas semanas de vida, época em que eu estava tentando descobrir o máximo possível sobre o passado de Voldemort. Extraí a lembrança com dificuldade. Quando vi o que continha, tentei usá-la para obter a libertação de Morfino de Azkaban. Mas, antes que o Ministério tomasse uma decisão, ele morreu.
— Mas por que o Ministério não percebeu que Voldemort tinha feito tudo isso a Morfino? — perguntou Harry indignado. — Ele era menor de idade à época, não era? Pensei que fossem capazes de detectar o uso de magia por menores.
— Você está certo... eles podem detectar a magia, mas não o seu autor: você está lembrado que o Ministério o culpou pelo Feitiço de Levitação que na verdade foi realizado por...
— Dobby — resmungou Harry; a injustiça ainda o exasperava. — Então, se um menor de idade usa a magia em um bruxo adulto ou na casa de um bruxo, o Ministério não fica sabendo?
— Certamente não saberá dizer quem realizou o feitiço — respondeu Dumbledore com ar de riso ao ver a grande indignação no rosto de Harry. — O Ministério confia que os pais bruxos exijam dos filhos que moram sob seu teto o cumprimento das leis.
— Ora que bobagem — retorquiu Harry. — Veja o que aconteceu neste caso, veja o que aconteceu a Morfino!
— Concordo. Por pior que fosse Morfino, ele não merecia morrer como morreu, culpado por crimes que não tinha cometido. Mas está ficando tarde, e quero que você veja mais uma lembrança antes de nos separarmos...
Dumbledore tirou de um bolso interno outro frasquinho de cristal, e Harry se calou mais uma vez, lembrando que o diretor lhe dissera que era a lembrança mais importante que tinha recolhido. O garoto reparou que foi difícil esvaziar o conteúdo do frasco na Penseira, como se estivesse levemente congelado; será que as lembranças talhavam?
— Esta vai ser rápida — disse Dumbledore, quando finalmente esvaziou o frasco. — Estaremos de volta antes que você perceba. Mais uma vez, mergulhe na Penseira, então...
E Harry atravessou mais uma vez a superfície prateada, aterrissando desta vez diante de um homem que ele reconheceu imediatamente.
Era um Horácio Slughorn mais jovem. Harry estava tão habituado a vê-lo careca que achou a visão de Slughorn com uma vasta e brilhante cabeleira cor de palha muito desconcertante; dava a impressão de que mandara cobrir a cabeça de sapê, embora no topo já fosse visível uma tonsura calva e reluzente. Os bigodes, menos compactos do que os atuais, eram louro-avermelhados. Ele não era tão gordo quanto o Slughorn que Harry conhecia, embora os botões dourados do seu colete ricamente bordado já estivessem sob tensão. Com os pezinhos apoiados sobre um pufe de veludo, ele se encontrava sentado em uma confortável bergère, tendo um cálice de vinho em uma das mãos e a outra enfiada em uma caixa de abacaxi cristalizado.
Harry olhou ao redor quando Dumbledore apareceu ao seu lado e percebeu que estavam no escritório de Slughorn. Havia meia dúzia de garotos sentados ao redor do professor, todos em cadeiras mais duras e baixas do que a dele, e todos aparentando uns dezesseis anos. Harry reconheceu Riddle imediatamente. Tinha o rosto mais bonito, e parecia o mais descontraído dos garotos. Sua mão direita estava pousada negligentemente sobre o braço da cadeira; com um sobressalto, Harry viu que ele estava usando o anel ouro e negro de Servolo; já tinha matado o pai.
— Senhor, é verdade que a professora Merrythought está se aposentando? — perguntou Riddle.
— Tom, Tom, se eu soubesse não poderia lhe dizer — respondeu Slughorn, sacudindo um dedo açucarado para Riddle, num gesto de censura, embora estragasse esse efeito com uma ligeira piscadela. — Confesso que gostaria de saber onde você obtém suas informações, rapaz; sabe mais do que metade dos professores.
Riddle sorriu; os outros garotos riram e lhe lançaram olhares de admiração.
— Com a sua fantástica habilidade para saber o que não deve e a sua cuidadosa bajulação das pessoas certas... aliás, obrigado pelo abacaxi, você acertou, é o meu preferido...
Enquanto vários garotos abafavam risinhos, aconteceu algo muito estranho. A sala foi repentinamente tomada por uma densa névoa branca, impedindo Harry de ver outra coisa além do rosto de Dumbledore, que estava parado ao seu lado. Então, a voz de Slughorn ecoou através da névoa, anormalmente alta:
— ...você vai acabar mal, rapaz, escute bem o que estou dizendo.
A névoa desapareceu tão repentinamente quanto surgira, embora ninguém fizesse qualquer alusão nem parecesse ter visto nada diferente acontecer. Intrigado, Harry correu os olhos pela sala no mesmo instante em que um pequeno relógio de ouro em cima da escrivaninha de Slughorn batia onze horas.
— Santo Deus, já é tão tarde assim? — exclamou o professor. — É melhor irem andando, rapazes, ou vamos todos nos meter em confusão. Lestrange, quero o seu trabalho até amanhã ou receberá uma detenção. O mesmo se aplica a você, Avery.
Slughorn levantou-se da poltrona com esforço e levou seu cálice vazio até a escrivaninha enquanto os garotos saíam. Riddle, no entanto, ficou para trás. Harry percebeu que o garoto se demorava de propósito, querendo ser o último na sala com o professor.
— Ande logo, Tom — disse Slughorn se virando e ainda encontrando-o ali. — Você não quer ser apanhado fora da cama depois da hora, ainda mais sendo monitor...
— Senhor, eu queria lhe perguntar uma coisa.
— Pois pergunte, meu rapaz, pergunte...
— Senhor, estive me perguntando o que o senhor sabe sobre... sobre Horcruxes?
E o mesmo fenômeno tornou a acontecer: o denso nevoeiro invadiu a sala de modo que Harry não pôde mais ver Slughorn nem Riddle; apenas Dumbledore sorrindo serenamente ao seu lado. Então a voz do professor ecoou exatamente como acontecera antes.
— Não sei nada sobre Horcruxes e não lhe diria se soubesse! Agora saia daqui imediatamente e não me deixe apanhá-lo mencionando isso outra vez!
— Bem, é só — anunciou Dumbledore placidamente ao lado de Harry. — Hora de partir.
E os pés de Harry saíram do chão e bateram, segundos depois, no tapete defronte à escrivaninha de Dumbledore.
— A lembrança é só isso? — perguntou Harry sem entender. Dumbledore dissera que essa lembrança era a mais importante de todas, mas ele não conseguia ver o que tinha de tão significativo. Sem dúvida, o nevoeiro e o fato de que ninguém parecia tê-lo percebido eram esquisitos, mas afora isso nada mais acontecera além de Riddle ter feito uma pergunta e não ter recebido resposta.
— Você talvez tenha notado — disse Dumbledore tornando a se sentar à escrivaninha — que essa lembrança foi alterada.
— Alterada? — repetiu Harry, sentando-se também.
— Certamente. O professor Slughorn modificou as próprias recordações.
— Mas por que faria isso?
— Porque, em minha opinião, tem vergonha do que lembra. E tentou retrabalhar a lembrança para aparecer sob uma luz mais favorável, apagando as partes que não quer que eu veja. Fez isto, como você deve ter reparado, de modo muito tosco, o que foi muito bom, porque mostra que a lembrança verdadeira persiste sob as alterações.
“Então, pela primeira vez, vou lhe passar um dever de casa, Harry. Você deverá persuadir o professor Slughorn a revelar a lembrança verdadeira, que sem dúvida será a nossa informação mais crucial.”
Harry arregalou os olhos para o diretor.
— Mas, com certeza, senhor — respondeu no tom de voz mais respeitoso possível —, o senhor não precisa de mim... o senhor pode usar Legilimência... ou Veritaserum...
— O professor Slughorn é um bruxo extremamente competente que estará prevenido contra ambos os recursos. Ele é muito mais competente em Oclumência do que o pobre Morfino Gaunt, e eu não me espantaria se estivesse carregando um antídoto contra o soro da verdade desde que o obriguei a me contar este arremedo de recordação.
“Não, acho que seria tolice tentar extrair a verdade do professor Slughorn à força, faria mais mal do que bem; não quero que ele abandone Hogwarts. Contudo, ele tem fraquezas como todos nós, e acredito que você seja o único que talvez possa penetrar suas defesas. É muito importante obtermos a lembrança verdadeira, Harry... e sua real importância nós só saberemos quando virmos o que de fato aconteceu. Então, boa sorte... e boa-noite.”
Um pouco surpreso ante a dispensa abrupta, Harry se pôs de pé ligeiro.
— Boa-noite, senhor.
Ao fechar a porta atrás de si, ouviu distintamente o comentário de Fineus Nigellus:
— Não vejo por que o garoto seria capaz de fazer isso melhor que você, Dumbledore.
— Eu não esperaria que visse, Fineus — replicou Dumbledore, e Fawkes soltou outro pio baixo e melodioso.

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