Posted by : Unknown junho 05, 2014

Capítulo 29


— A coisa se resume no seguinte — disse Hermione esfregando a testa —, ou o Sr. Crouch atacou Vítor ou outra pessoa atacou os dois, quando Vítor não estava olhando.
— Deve ter sido o Crouch — disse Rony na mesma hora. — por isso que ele já tinha desaparecido quando Harry e Dumbledore chegaram lá. Deu no pé.
— Acho que não — disse Harry balançando a cabeça. — Ele parecia realmente fraco, acho que não tinha forças para desaparatar nem nada.
— Ninguém pode desaparatar nas terras de Hogwarts, já não disse isso a vocês um montão de vezes? — reclamou Hermione.
— OK... Então que tal esta outra teoria — propôs Rony excitado:
— Krum atacou Crouch, não, peraí, então se estuporou!
— E o Sr. Crouch se evaporou, não é mesmo? — disse Hermione com frieza.
— Ah, é...
O dia estava amanhecendo. Harry, Rony e Hermione tinham saído muito cedo dos seus dormitórios e corrido até o corujal, juntos, a despachar um bilhete para Sirius. Agora estavam parados contemplando os jardins cobertos de névoa.
Os três estavam pálidos, os olhos inchados, porque ficaram conversando até tarde sobre o Sr. Crouch.
— Vamos recapitular, Harry — disse Hermione. — Que foi que o Sr. Crouch realmente disse?
— Já falei que ele não estava fazendo muito sentido — repetiu Harry. — Disse que queria prevenir Dumbledore sobre alguma coisa. Tenho certeza de que ele mencionou Berta Jorkins e parecia achar que ela estava morta. Não parava de repetir que muita coisa era culpa dele... Mencionou o filho.
— Bem, isso foi culpa dele — disse Hermione irritada.
— Ele estava delirando — continuou Harry. — Metade do tempo dava a impressão de acreditar que a mulher e o filho ainda estavam vivos, e ele não parava de falar com Percy sobre serviço e de lhe dar instruções.
— E... O que foi mesmo que ele disse sobre Você-Sabe-Quem? — perguntou Rony inseguro.
— Eu já contei — respondeu Harry chateado. — Disse que ele está ficando mais forte.
Houve uma pausa. Então Rony num tom de falsa segurança disse:
— Mas ele estava delirando, conforme você falou, portanto metade disso provavelmente era só delírio...
— Ele ficava mais sensato quando tentava falar de Voldemort — disse Harry, não dando atenção à careta de Rony. — Estava realmente com dificuldade para formar frases, mas isso era quando parecia que sabia onde estava e o que queria fazer. Ele não parava de dizer que queria ver Dumbledore.
Harry se afastou da janela e olhou para os caibros do telhado. Metade dos numerosos poleiros estava vazia, de vez em quando, mais uma coruja entrava voando por uma das janelas, voltando de uma caçada noturna com um rato no bico.
— Se Snape não tivesse me atrasado — comentou Harry — talvez a gente tivesse chegado lá a tempo. "O diretor está ocupado Potter... que tolice é essa, Potter?" Por que ele simplesmente não saiu do caminho?
— Talvez não quisesse que vocês chegassem lá! — disse Rony depressa. — Talvez, calma aí, com que rapidez você acha que ele poderia ter ido até a Floresta? Você acha que ele podia ter chegado lá antes de você e Dumbledore?
— Não, a não ser que ele seja capaz de se transformar num morcego ou outra coisa do gênero.
— Eu não duvido nada — murmurou Rony.
— Precisamos ver o Professor Moody — disse Hermione. — Precisamos descobrir se ele encontrou o Sr. Crouch.
— Se tivesse levado o Mapa do Maroto com ele, teria sido fácil — disse Harry.
— A não ser que Crouch já tivesse saído de Hogwarts — lembrou Rony — porque o mapa só mostra o que está dentro dos limites, não...
— Psiu! — exclamou Hermione de repente.
Alguém estava subindo a escada para o corujal. Harry ouviu duas vozes discutindo, cada vez mais próximas.
—... Isso é chantagem, é o que é, e poderíamos nos meter em uma baita enrascada por causa disso... Tentamos ser gentis, está na hora de jogar sujo com o cara. Ele não ia gostar que o Ministério da Magia soubesse o que ele fez...
— Estou falando, se você puser isto por escrito, será chantagem!
— É, mas você não ia reclamar se conseguíssemos um bom pagamento por isso, ia?
A porta do corujal se abriu com estrondo. Fred e Jorge apareceram no portal e em seguida congelaram ao verem Harry, Rony e Hermione.
— Que é que vocês estão fazendo aqui? — perguntaram Rony e Fred ao mesmo tempo.
— Despachando uma carta — responderam Harry e Jorge em uníssono.
— Quê, a esta hora? — se admiraram Hermione e Fred. Fred sorriu.
— Ótimo, nós não perguntamos o que vocês estão fazendo, se vocês não nos perguntarem — disse ele.
Ele segurava um envelope fechado na mão. Harry deu uma olhada, mas Fred, fosse por acaso ou de propósito, escorregou a mão, tampando o nome do destinatário.
— Bem, não se prendam por nós — disse ele, fazendo uma reverência cômica e indicando a porta. Rony não se mexeu.
— Quem é que vocês estão chantageando? — perguntou.
O sorriso desapareceu do rosto de Fred. Harry viu Jorge olhar Fred de relance antes de sorrir para Rony.
— Não seja idiota, eu só estava brincando — disse ele à vontade.
— Não parecia — insistiu Rony.
Fred e Jorge se entreolharam. Então Fred disse abruptamente:
— Já lhe avisamos antes, Rony, não meta o nariz se gosta do feitio que ele tem. Não vejo por que você iria meter, mas...
— Mas é da minha conta se vocês estiverem chantageando alguém. Jorge tem razão, vocês poderiam acabar numa baita enrascada.
— Já lhe disse, eu estava brincando — disse Jorge. Ele foi até Fred, tirou a carta das mãos do irmão e começou a prendê-la à perna da coruja-de-igreja mais próxima. — Você está começando a falar como o nosso querido irmão mais velho, sabe, Rony. Continue assim e vai acabar monitor-chefe.
— Não, não vou, não! — protestou Rony indignado.
Jorge levou a coruja até a janela e deixou-a levantar vôo. Ele se virou e sorriu para Rony.
— Bem, então pare de dizer às pessoas o que fazer. Até mais tarde.
Ele e Fred saíram do corujal. Harry, Rony e Hermione ficaram se entreolhando.
— Vocês não acham que eles sabem alguma coisa dessa história toda, acham? — sussurrou Hermione. — Do Crouch e todo o resto?
— Não — disse Harry. — Se fosse uma coisa séria assim eles contariam a alguém. Contariam a Dumbledore.
Rony, no entanto, estava com um ar constrangido.
— Que foi? — perguntou Hermione.
— Bem... — respondeu Rony lentamente — não sei se contariam. Eles... Ultimamente estão obcecados com a idéia de fazer dinheiro, notei isso quando estava andando com eles, quando... Vocês sabem...
— Nós dois não estávamos nos falando — Harry terminou a frase para ele. — É, mas chantagem...
— É essa idéia deles de abrirem uma loja de logros. Pensei que estivessem falando nisso só para aborrecer mamãe, mas estão realmente falando sério, querem abrir uma loja. Só falta um ano para eles terminarem Hogwarts, eles não param de falar que está na hora de pensar no futuro e papai não pode ajudá-los, precisam de ouro para começar um negocio.
Agora era Hermione que estava com um ar constrangido.
— Sei, mas... Eles não fariam nada contra a lei para conseguir ouro. Fariam?
— Se fariam? — disse Rony com uma expressão de ceticismo. — Não sei... Eles não se importam muito de desrespeitar o regulamento, não é mesmo?
— É, mas estamos falando da Lei — disse Hermione, parecendo amedrontada. — Não é de um simples regulamento de escola... Vão receber mais que detenção por uma chantagem! Rony... Talvez seja melhor contar ao Percy...
— Você ficou maluca? — exclamou Rony. — Contar ao Percy? Ele provavelmente ia fazer como o Crouch, e entregaria os dois. — Ele ficou olhando a janela por onde partira a coruja de Fred e Jorge, depois disse: — Vamos gente, vamos tomar café.
— Vocês acham que é muito cedo para procurar o Professor Moody? — perguntou Hermione quando desciam a escada circular.
— Acho — respondeu Harry. — Ele provavelmente nos detonaria pela porta se nós o acordássemos com o dia nascendo. Ia pensar que estamos querendo atacá-lo dormindo. Vamos esperar até a hora do intervalo.
A aula de História da Magia jamais transcorrera tão lentamente. Harry não parava de consultar o relógio de Rony, tendo finalmente jogado fora o seu, mas o do amigo estava andando tão devagar que ele poderia jurar que parara de funcionar também. Os três garotos estavam tão cansados que teriam gostado de descansar as cabeças nas carteiras e dormir; nem Hermione estava fazendo as anotações de costume, sentava-se com a cabeça apoiada na mão, mirando o Professor Binns com os olhos fora de foco.
Quando a sineta finalmente tocou, eles saíram correndo pelo corredor em direção à sala de Defesa das Artes das Trevas e encontraram o Professor Moody de saída. Ele parecia tão cansado quanto os três se sentiam. A pálpebra do seu olho normal estava caída, dando ao seu rosto uma aparência ainda mais torta do que a habitual.
— Professor Moody? — chamou Harry, enquanto atravessavam o ajuntamento de alunos até o professor.
— Olá, Potter — rosnou Moody. Seu olho mágico acompanhou uns alunos de primeiro ano que iam passando e que aceleraram o passo demonstrando nervosismo, depois o olho girou para a nuca do professor e observou-os virar o canto, só então ele voltou a falar:
— Entrem.
Afastou-se, então, para deixá-los entrar em sua sala de aula vazia, entrou em seguida mancando, e fechou a porta.
— O senhor o encontrou? — perguntou Harry sem preâmbulos.— O Sr. Crouch?
— Não — respondeu Moody. Ele foi até a escrivaninha, sentou-se, esticou a perna de pau com um breve gemido e puxou um frasco de bolso.
— O senhor usou o mapa? — perguntou Harry.
— Naturalmente — disse o professor tomando um gole do frasco. — Fiz igualzinho a você, Potter. Convoquei o mapa do meu escritório para a Floresta. O homem não estava em lugar algum.
— Então ele desaparatou? — perguntou Rony.
— Não se pode desaparatar nos terrenos da escola, Rony! — disse Hermione. — Não existem outras maneiras que ele poderia ter usado para desaparecer, existem, professor?
O olho mágico de Moody estremeceu ao pousar em Hermione.
— Você é outra que poderia pensar numa carreira de auror — disse ele à garota. — Sua cabeça funciona na direção certa, Granger.
Hermione corou de prazer.
— Bem, ele não estava invisível — falou Harry —, o mapa mostra pessoas invisíveis. Então ele deve ter deixado Hogwarts.
— Mas com as próprias pernas? — perguntou Hermione ansiosa. — Ou alguém o fez deixar?
— É, alguém poderia ter feito isso, montar o Crouch numa vassoura e levar ele embora, não poderia? — perguntou Rony depressa, olhando esperançoso para Moody, como se também quisesse ouvir que tinha talento para auror.
— Não podemos excluir um seqüestro — rosnou Moody.
— Então — disse Rony — o senhor acha que ele está em algum lugar de Hogsmeade?
— Poderia estar em qualquer lugar — respondeu Moody balançando a cabeça. — A única coisa de que temos certeza é que ele não está aqui.
O professor deu um grande bocejo, suas cicatrizes se esticaram e sua boca torta deixou entrever que lhe faltavam vários dentes. Então disse:
— Agora, Dumbledore me contou que vocês três se imaginam investigadores, mas não há nada que possam fazer por Crouch. O Ministério vai procurá-lo agora, Dumbledore já mandou uma notificação. Potter, e você se concentre na terceira tarefa.
— Quê? — disse Harry. — Ah, sim...
Ele ainda não parara um instante sequer para pensar no labirinto desde que deixara Krum na noite anterior.
— Deve ser bem a sua praia, essa — disse o professor, erguendo os olhos para Harry e coçando o queixo barbado e cheio de cicatrizes. — Pelo que Dumbledore me contou, você já conseguiu fazer coisas parecidas muitas vezes. Venceu uma série de obstáculos que guardavam a Pedra Filosofal no primeiro ano, não foi?
— Nós ajudamos — disse Rony depressa. — Eu e Mione ajudamos.
Moody riu.
— Bem, então ajude-o a treinar para esse e ficarei muito surpreso se ele não vencer. Nesse meio tempo... Vigilância constante, Potter. Vigilância constante. — Ele tomou mais um longo gole do frasco de bolso e seu olho mágico girou para a janela. Por ali via-se a vela principal do navio de Durmstrang.
— Vocês dois — seu olho normal estava posto em Rony e Hermione — fiquem colados no Potter, sim? Eu estou de olho nas coisas, mas assim mesmo... Nunca há olhos demais para se vigiar.
Sirius devolveu a coruja dos garotos na manhã seguinte. Ela esvoaçou ao lado de Harry no mesmo instante em que uma coruja castanho-amarelada pousou diante de Hermione, trazendo um exemplar do Profeta Diário no bico. Ela apanhou o jornal, deu uma olhada nas primeiras páginas e disse:
— Ela não ouviu falar do Crouch! — comentou antes de se juntar a Rony e Harry para ler o que Sirius mandara dizer sobre os misteriosos acontecimentos da antevéspera.

“Harry,
Que brincadeira é essa de sair para a Floresta Proibida com Vítor Krum?
Quero que você jure, na volta deste correio, que não vai sair andando com mais ninguém à noite. Há alguém perigosíssimo em Hogwarts. Para mim está muito claro que esse alguém queria impedir Crouch de ver Dumbledore e você provavelmente esteve a poucos passos dele no escuro. Poderia ter sido morto.
O seu nome não foi parar no Cálice de Fogo por acaso. Se alguém está tentando atacá-lo, essa é a última chance. Fique perto de Rony e Hermione, não saia da Grifinória tarde da noite e se prepare para a terceira tarefa. Pratique estuporamento e desarmamento. Algumas azarações viriam a calhar. Não há nada que você possa fazer por Crouch. Não se exponha e se cuide. Estarei esperando a carta em que me dará sua palavra de que não vai mais ultrapassar os limites da escola.
Sirius”.

— Quem é ele para me fazer sermão por ultrapassar os limites da escola? — disse Harry ligeiramente indignado enquanto dobrava a carta de Sirius e a guardava no bolso interno das vestes. — Depois de tudo que ele aprontou na escola!
— Ele está preocupado com você! — lembrou Hermione com rispidez. — E o mesmo se aplica a Moody e Hagrid! Por isso escute o que eles estão lhe dizendo!
— Ninguém nem tentou me atacar este ano — disse Harry. — Ninguém nem me fez absolutamente nada...
— Exceto colocarem o seu nome no Cálice de Fogo — disse Hermione. — E devem ter tido um bom motivo para isso, Harry. Snuffles tem razão. Talvez estejam esperando a hora certa. Talvez a terceira tarefa seja a que vão pegar você.
— Olhem — disse Harry impaciente —, digamos que Snuffles tenha razão e alguém estuporou Krum para seqüestrar Crouch. Bem, ele estaria escondido entre as árvores perto de nós, certo? Mas esperou eu estar fora do caminho para agir, não foi? Portanto não está parecendo que eu seja o alvo deles, não é?
— Eles não poderiam fazer parecer um acidente se tivessem matado você na Floresta. Mas se você morresse durante a tarefa...
— Eles não se importaram de atacar Krum, não foi? Por que não aproveitaram para acabar comigo também? Poderiam ter feito parecer que Krum e eu tínhamos duelado ou outra coisa qualquer.
— Harry, eu também não entendo — disse Hermione desesperada. — Só sei que há um monte de coisas estranhas acontecendo e que não estou gostando nada... Moody está certo, Snuffles está certo, você tem que começar a treinar logo para a terceira tarefa. E não se esqueça de responder a Sirius e prometer que não vai sair por aí sozinho outra vez.
Os jardins de Hogwarts nunca pareceram mais convidativos do que quando Harry foi obrigado a permanecer no castelo. Nos dias que se seguiram ele passou quase todo o tempo livre na biblioteca com Hermione e Rony, consultando livros sobre azarações ou então em salas de aula desocupadas, em que eles entravam às escondidas para praticar. Harry se concentrou no Feitiço Estuporante, que ele nunca usara antes. O problema era que sua prática exigia certos sacrifícios de Rony e Hermione.
— Não podíamos seqüestrar Madame Nor-r-ra? — sugeriu Rony durante a hora de almoço na segunda-feira, ainda deitado de barriga para cima no meio da sala de Feitiços, onde acabara de ser estuporado e reanimado por Harry pela quinta vez seguida. — Vamos estuporar a gata para variar. Ou quem sabe você podia usar o Dobby, Harry, aposto que ele faria qualquer coisa para ajudar você. Não estou reclamando nem nada — o garoto se levantou esfregando as costas —, mas estou todo doído...
— Bem, você sempre sai de cima das almofadas, não é? — disse Hermione com impaciência, rearrumando a pilha de almofadas usadas para o ,Feitiço Expulsório que Flitwick deixara guardadas em um armário. — Experimente cair de costas!
— Quando a gente está sendo estuporado, não consegue mirar muito bem, Hermione! — defendeu-se Rony aborrecido. — Por que você não experimenta uma vez?
— Bem, acho que Harry já pegou o jeito — disse a garota apressada. — E não precisamos nos preocupar com o desarmamento, porque ele já sabe fazer isso há séculos... Acho que hoje à noite devíamos começar algumas azarações.
A garota percorreu com os olhos a lista que tinham feito na biblioteca.
— Gosto da cara desta aqui — disse ela —, da Azaração de Impedimento. Deve retardar qualquer coisa que esteja tentando atacar você, Harry. Vamos começar por ela.
A sineta tocou. Apressadamente eles enfiaram as almofadas no armário de Flitwick e saíram com cautela da sala de aula.
— Vejo vocês no jantar! — disse Hermione e foi para a aula de Aritmancia, enquanto Harry e Rony seguiam para a aula de Adivinhação na Torre Norte.
Grandes feixes de sol, radiosamente dourados, vindos das altas janelas, cortavam o corredor. O céu lá fora estava tão intensamente azul que parecia esmaltado.
— Vai estar uma sauna na sala da Trelawney, ela nunca apaga aquela lareira — comentou Rony, quando começaram a subir a escada circular que levava à escada prateada e ao alçapão.
E ele estava certo. A sala mal iluminada estava incomodamente quente. A fumaça da lareira perfumada estava mais densa que nunca. Harry sentiu a cabeça tontear ao se dirigir a uma das janelas de cortinas corridas. Enquanto a Professora Sibila estava olhando para o outro lado, tentando soltar o xale de um abajur, ele abriu a janela uns dois dedinhos e tornou a se sentar em sua cadeira forrada de chintz, de modo que uma brisa suave correu pelo seu rosto. Ele se sentiu muitíssimo confortável.
— Meus queridos — disse a professora, sentando-se em sua bergere diante da turma e percorrendo-a com seus olhos estranhamente aumentados —, estamos quase no fim dos nossos estudos sobre adivinhação planetária. Hoje, no entanto, teremos uma excelente oportunidade de examinar os efeitos de Marte, porque ele está em uma posição muitíssimo interessante neste momento. Se vocês todos olharem para cá, eu vou diminuir a luz...
Ela acenou com a varinha e as luzes se apagaram. A lareira ficou sendo a única fonte de claridade. A Professora Sibila se curvou e tirou de baixo da poltrona um modelo do sistema solar, protegido por uma redoma de vidro. Era uma bela peça, cada uma das luas cintilantes estavam dispostas em torno dos nove planetas e do sol esbraseado, todos suspensos no ar sob o vidro. Harry acompanhou indolentemente a professora começar a apontar o ângulo fascinante que Marte formava com Netuno.
A fumaça muito perfumada o envolveu e a brisa vinda da janela brincou pelo seu rosto. Ele ouviu um inseto zumbir suavemente em algum lugar atrás da cortina. Suas pálpebras começaram a pesar...
Ele estava cavalgando às costas de um corujão, voando por um claro céu azul em direção a uma casa velha e coberta de hera, situada no alto de uma encosta.
Eles foram voando cada vez mais baixo, o vento passando agradavelmente pelo rosto de Harry, até chegarem a uma janela escura e desmantelada no primeiro andar da casa, pela qual entraram. Agora estavam voando por um corredor sombrio e chegaram a um quarto bem no final... cruzaram a porta entraram nesse quarto escuro cujas janelas estavam pregadas...
Harry desmontara das costas do corujão... E observou-o esvoaçar pelo quarto e pousar em uma poltrona virada de costas para ele... Havia duas formas escuras no chão ao lado da cadeira... As duas se mexiam... Uma era uma enorme cobra... A outra, um homem... Um homem baixo, meio careca, um homem com olhos aquosos e um nariz pontudo... Ele arfava e soluçava no tapete diante da lareira...
— Você está com sorte, Rabicho — disse uma voz fria e aguda do fundo da poltrona em que o corujão pousara. — Você tem de fato muita sorte. O seu erro não chegou a arruinar tudo. Ele está morto.
— Milorde! — ofegou o homem no chão. — Milorde, estou... Estou tão satisfeito... E tão arrependido...
— Nagini — disse a voz fria —, você está sem sorte. Afinal, não é hoje que vou lhe dar Rabicho para comer... Mas não se incomode, não se incomode... Ainda tem o Harry Potter...
A cobra sibilou. Harry viu a língua dela se agitar.
— Agora, Rabicho — disse a voz fria —, talvez mais um lembrete de por que não vou tolerar mais nenhum erro seu...
— Milorde... Não... Eu suplico...
A ponta de uma varinha ergueu-se do fundo da poltrona. Mirou Rabicho.
— Crucio — disse a voz fria.
Rabicho berrou, berrou como se cada nervo do seu corpo estivesse em fogo, os berros encheram os ouvidos de Harry, ao mesmo tempo que a cicatriz em sua testa queimou de dor; ele estava berrando, também... Voldemort iria ouvi-lo, saberia que ele estava ali...
— Harry! Harry.
Harry abriu os olhos. Estava caído no chão da sala da Professora Sibila, cobrindo o rosto com as mãos. Sua cicatriz ardia com tanta intensidade que seus olhos chegavam a lacrimejar. A dor fora real. A turma inteira estava parada à volta dele, e Rony se ajoelhara de um lado, com uma expressão de terror no rosto.
— Você está bem? — perguntou.
— É claro que não está! — disse a professora, parecendo alvoroçadíssima. Seus grandes olhos miraram Harry, ameaçadores. — Que foi, Potter? Uma premonição? Uma aparição? Que foi que você viu?
— Nada — mentiu Harry. Ele se sentou. Sentia os próprios tremores. Não conseguia parar de olhar para todo lado, para as sombras às suas costas. A voz de Voldemort soara tão próxima...
— Você estava apertando sua cicatriz! — disse a professora. — Você estava rolando no chão, apertando sua cicatriz! Ora vamos, Potter, eu tenho experiência nesses assuntos!
Harry levantou a cabeça para olhá-la.
— Preciso ir à ala hospitalar, acho. Dor de cabeça muito forte.
— Meu querido, sem dúvida você foi estimulado pelas extraordinárias
vibrações premonitórias da minha sala! Se você sair agora, poderá perder a oportunidade de ver mais longe do que jamais...
— Eu não quero ver nada, a não ser um remédio para minha dor de cabeça.
Harry se levantou. A turma recuou. Todos pareciam nervosos.
— Vejo você mais tarde — murmurou ele para Rony e, apanhando a mochila, rumou para o alçapão, sem dar atenção à Professora Sibila, que revelava no rosto uma grande frustração, como se alguém a tivesse privado de um prazer real.
Quando Harry chegou ao fim da escada, porém, não rumou para a ala hospitalar. Não tinha a menor intenção de ir até lá. Sirius lhe dissera o que fazer se a cicatriz tornasse a doer e ele ia seguir o conselho do padrinho: ir direto ao escritório de Dumbledore. Ele atravessou os corredores, decidido, pensando no que vira no sonho... Fora tão vívido como o outro que o despertara na Rua dos Alfeneiros... Ele repassou mentalmente os detalhes, procurando se certificar de que não os esqueceria... Ouvira Voldemort acusar Rabicho de cometer um erro... Mas a coruja trouxera boas notícias, o erro fora consertado, alguém estava morto... Por isso Rabicho não ia servir de alimento para a cobra... Em seu lugar, Harry é quem iria...
O garoto passou direto pela gárgula que guardava a entrada do escritório de Dumbledore sem reparar. Ele piscou, olhou em volta, percebeu a distração, refez seus passos e parou diante do ornato. Então se lembrou que não conhecia a senha.
— Sorvete de limão? — experimentou.
A gárgula não se moveu.
— OK. — disse Harry encarando-a. — Drops de pêra. Varinha. alcaçuz. Delícia gasosa. Chicle de baba-bola. Feijõezinhos de todos os sabores... Ah, não, ele não gosta desses, ou gosta?... Ah, abra logo, será que não pode? — exclamou o garoto aborrecido. — Eu realmente preciso ver o diretor, é urgente!
A gárgula continuou imóvel.
Harry chutou-a, mas não conseguiu nada, exceto sentir uma dor excruciante no dedão do pé.
— Sapo de chocolate! — berrou com raiva, parado num pé só. — Pena de açúcar! Torrão de barata! A gárgula ganhou vida e saltou para o lado. Harry piscou os olhos.
— Torrão de barata! — exclamou admirado. — Eu estava só brincando...
Ele passou depressa pela abertura nas paredes e pisou no patamar de uma escada em espiral, que se deslocou lentamente para o alto, ao mesmo tempo em que as portas se fechavam às suas costas, levando-o até uma porta de carvalho polido com uma maçaneta de latão. Ele ouviu vozes no escritório. Saltou da escada em movimento e hesitou, escutando.
— Dumbledore, receio não ver a relação, não a vejo mesmo! — Era a voz do Ministro da Magia, Cornélio Fudge. — Ludo diz que Berta é perfeitamente capaz de se perder. Concordo que era de esperar que, a esta altura, ela já tivesse sido encontrada, mas mesmo assim, não temos evidência alguma de crime, Dumbledore, nenhuma. Quanto ao desaparecimento dela estar ligado ao de Bartô Crouch!
— E o que é que o senhor acha que aconteceu com Bartô Crouch, ministro? — perguntou Moody num rosnado.
— Vejo duas possibilidades, Alastor — disse Fudge. — Ou Crouch finalmente enlouqueceu, o que é muito provável e tenho certeza de que você concorda, dada a sua história pessoal, perdeu o juízo e saiu vagando por aí...
— Ele vagou muitíssimo depressa, se esse for o caso, Cornélio — comentou Dumbledore calmamente.
— Ou então, bem... — Fudge pareceu constrangido. — Bem, não vou julgar até depois de ver o local onde ele foi encontrado, mas você diz que foi um pouco além da carruagem da Beauxbatons? Dumbledore, você sabe quem é aquela mulher?
— Considero-a uma diretora competente e uma excelente dançarina — acrescentou Dumbledore rapidamente.
— Ora, vamos Dumbledore! — disse Fudge irritado. — Você não acha que pode estar predisposto a favorecê-la por causa de Hagrid? Nem todos eles são inofensivos, se é que se pode chamar Hagrid de inofensivo, com aquela fixação monstruosa que ele tem...
— Tenho tantas suspeitas de Madame Maxime quanto tenho de Hagrid — disse Dumbledore com a mesma calma. — Acho que é possível que você esteja predisposto a condená-la, Cornélio.
— Será que podemos fechar esta discussão? — rosnou Moody.
— Sim, sim, vamos descer aos jardins, então — disse Cornélio impaciente.
— Não, não é isso — falou Moody —, é que Potter quer dar uma palavra com você, Dumbledore. Ele está aí do outro lado da porta.

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