Posted by : Unknown junho 05, 2014

Capítulo 31


— Dumbledore também acha que Você-Sabe-Quem está se fortalecendo outra vez? — sussurrou Rony.
Tudo que Harry vira na Penseira, e quase tudo que Dumbledore lhe contara e mostrara depois, ele agora estava dividindo com Rony e Hermione — e, é claro, com Sirius, a quem Harry enviara uma coruja assim que saíra do escritório do diretor. Mais uma vez os três garotos ficaram acordados até tarde na sala comunal, discutindo os acontecimentos até que a cabeça de Harry começou a rodar, até que ele compreendeu o que Dumbledore quisera dizer quando falara em uma cabeça ficar tão cheia de pensamentos que era um alívio esvaziá-la.
Rony ficou olhando fixamente para as chamas na lareira.
Harry achou que o viu estremecer levemente, embora a noite não estivesse fria.
— E ele confia em Snape? — tornou a perguntar Rony. — Confia realmente em Snape, mesmo que o cara tenha sido um Comensal da Morte?
— Sim — disse Harry.
Hermione não falava havia dez minutos. Estava sentada com a testa apoiada nas mãos, fitando os joelhos. Harry pensou que ela também faria bom uso de uma Penseira.
— Rita Skeeter — murmurou ela finalmente.
— Como é que você pode estar preocupada com ela agora? — indagou Rony, incrédulo.
— Não estou preocupada com ela — respondeu Hermione para os próprios joelhos. — Só estou pensando... Lembra o que ela me disse no Três Vassouras? "Sei coisas sobre Ludo Bagman que a deixariam de cabelo em pé”. Era a isso que ela estava se referindo, não é? Ela fez a cobertura do julgamento, sabia que ele tinha passado informações para os Comensais da Morte. E Winky, também, lembra: “O Sr. Bagman é um bruxo malvado”. O Sr. Crouch provavelmente ficou furioso quando Bagman se livrou da prisão, e comentou isso em casa.
— É, mas Bagman não passou informações de propósito, passou? — Hermione deu de ombros.
— E Fudge acha que Madame Maxime atacou Crouch? — perguntou Rony se virando para Harry outra vez.
— É — respondeu Harry — mas só está dizendo isso porque o Sr. Crouch desapareceu perto da carruagem da Beauxbatons.
— Nunca pensamos nela, não é mesmo? — disse Rony, lentamente. — E olhem que ela positivamente tem sangue de gigante, e não quer nem admitir...
— Claro que não — disse Hermione secamente, erguendo os olhos. — Olha só o que aconteceu com o Hagrid quando a Rita descobriu quem era a mãe dele. Olha só o Fudge tirando conclusões apressadas sobre ela, só porque a mãe é meio giganta. Quem precisa desse tipo de preconceito? Eu provavelmente diria que tinha ossos grandes se soubesse o que me esperava por dizer a verdade.
Hermione consultou seu relógio de pulso.
— Não praticamos nada! — exclamou, chocada. — Vamos fazer a Azaração de Impedimento! Amanhã temos que meter as caras nela pra valer! Vamos Harry você precisa descansar.
Os dois garotos subiram lentamente para o dormitório. Enquanto vestia o pijama, Harry olhou para a cama de Neville. Fiel à palavra dada a Dumbledore, não falara a Rony e Hermione sobre os pais do garoto. Depois que tirou os óculos e se meteu na cama, ficou imaginando como devia ser a pessoa ter pais vivos, mas incapazes de reconhecê-la. Ele sempre despertava simpatia nos estranhos por ser órfão, mas ao escutar os roncos de Neville, concluiu que o colega a merecia mais do que ele.
Deitado no escuro, Harry sentiu um assomo de raiva e ódio contra as pessoas que haviam torturado o Sr. e a Sra. Longbottom... Lembrou-se dos risos e caçoadas dos espectadores quando o filho de Crouch e os companheiros foram arrastados para fora do tribunal pelos dementadores... Compreendeu o que sentiram... Então lembrou-se do rosto extremamente branco do garoto que gritava e percebeu, com um sobressalto, que ele morrera no ano seguinte...
Fora Voldemort, pensou Harry fitando, no escuro, o dossel da cama, tudo acabava apontando para Voldemort... Ele é quem tinha separado aquelas famílias, quem tinha arruinado todas aquelas vidas...
Rony e Hermione precisavam estar revisando as matérias para os exames, que terminariam no dia da terceira tarefa, em lugar disso, estavam devotando todas as energias a ajudar Harry a se preparar.
— Não se preocupe — disse Hermione brevemente, quando Harry comentou isso com eles, e disse que não se importava de continuar a praticar sozinho.
— Pelo menos vamos tirar notas máximas em Defesa contra as Artes das Trevas, nunca teríamos descoberto tantas azarações em aula.
— Bom treinamento para quando formos aurores — comentou Rony excitado, experimentando uma Azaração de Impedimento em uma vespa que entrara zumbindo na sala, e fazendo-a estacar no ar.
Quando entrou o mês de junho, a atmosfera do castelo se tornou mais uma vez elétrica e tensa. Todos aguardavam com ansiedade a terceira tarefa, que se realizaria uma semana antes do fim do trimestre. Harry praticava azarações em todos os momentos de folga. Sentia-se mais confiante com relação a esta tarefa do que a qualquer das anteriores. Mas, apesar de difícil e perigosa, como certamente seria, Moody tinha razão.
Harry conseguira passar por criaturas monstruosas e atravessar barreiras mágicas antes, e desta vez, recebera aviso, tivera a chance de se preparar para aquilo que o aguardava.
Cansada de surpreendê-los por toda a escola, a Professora Minerva dera a Harry permissão para usar a sala de Transformação vazia na hora do almoço. Ele não tardou a dominar a Azaração de Impedimento, um feitiço para retardar e obstruir atacantes, oFeitiço Redutor lhe permitiria explodir objetos sólidos em seu caminho, o Feitiço dos Quatro Pontos, uma descoberta útil de Hermione que faria sua varinha apontar para o norte, permitindo-lhe, assim, verificar se estava se deslocando na direção certa dentro do labirinto.
Mas ele ainda estava tendo problemas com o Feitiço Escudo. Este lançava uma parede temporária e invisível em torno dele e o protegia de pequenos feitiços, Hermione conseguiu desfazê-la com uma bem colocada Azaração das Pernas Bambas. Harry bambeou pela sala uns bons dez minutos, até a garota ter tido tempo para achar a contra-azaração.
— Mas você continua se saindo realmente bem — disse Hermione encorajando Harry e consultando a lista que fizera para riscar o que ele já aprendera. — Alguns desses devem ser uma mão na roda.
— Venham só dar uma espiada nisso — disse Rony que estava parado junto à janela. Contemplava os jardins. — Que será que o Malfoy está aprontando?
Harry e Hermione foram ver. Malfoy, Crabbe e Goyle estavam parados à sombra de uma árvore lá embaixo. Crabbe e Goyle pareciam estar vigiando alguma coisa, os dois abafavam risinhos. Malfoy tampava a boca com a mão e falava para dentro dela.
— Parece até que ele está usando um walkie-talkie — disse Harry curioso.
— Não pode estar — lembrou Hermione. — Já disse a vocês dois que esse tipo de coisa não funciona em Hogwarts. Vamos, Harry — acrescentou ela energicamente, dando as costas à janela e voltando ao meio da sala — vamos experimentar outra vez o Feitiço Escudo.
Sirius agora mandava corujas diariamente. Do mesmo modo que Hermione, ele parecia querer se concentrar em fazer Harry concluir a última tarefa, antes de se preocupar com outra coisa. Em cada carta ele lembrava ao afilhado que fosse o que fosse que acontecesse fora dos muros de Hogwarts não era responsabilidade do garoto, nem estava em seu poder influenciar nada.
“Se Voldemort está realmente voltando a se fortalecer — escreveu ele —, minha prioridade é garantir a sua segurança. Ele não pode sequer alimentar esperanças de pegá-lo enquanto você estiver sob a proteção de Dumbledore, mas mesmo assim, não corra riscos: concentre-se em atravessar esse tal labirinto em segurança, depois poderemos voltar nossa atenção para outros assuntos.”
O nervosismo de Harry foi crescendo à medida que o dia vinte e quatro de junho se aproximava, mas nem tanto quanto nas tarefas anteriores. Por um lado, ele se sentia confiante de que, desta vez, fizera tudo que pudera para se preparar para a tarefa. Por outro, esse era o último esforço e, independentemente de se dar bem ou mal, o torneio enfim terminaria, o que seria um enorme alívio. O café foi uma reunião barulhenta à mesa da Grifinória, na manhã da terceira tarefa. O correio coruja apareceu, trazendo para Harry um cartão de boa sorte de Sirius.
Era apenas um pedaço de pergaminho, dobrado com a impressão de uma pata enlameada, Harry gostou assim mesmo. Uma coruja-das-torres chegou trazendo para Hermione seu exemplar do Profeta Diário, como habitualmente. Ela abriu o jornal, deu uma olhada na primeira página, cuspiu a boca cheia de suco de abóbora, sujando todo o jornal.
— Que foi? — exclamaram Harry e Rony juntos, olhando para garota.
— Nada — disse Hermione depressa, tentando esconder o jornal, mas Rony agarrou-o.
Ele arregalou os olhos para a manchete e disse:
— Nem pensar. Hoje não. Essa vaca velha.
— Que foi? — perguntou Harry. — Rita Skeeter de novo?
— Não — respondeu Rony, e do mesmo modo que Hermione, tentou esconder o jornal.
— Fala de mim, não é? — perguntou Harry.
— Não — disse Rony, num tom que não convencia ninguém.
Mas antes que Harry pudesse pedir para ver o jornal, Draco Malfoy gritou lá da mesa da Sonserina, do outro lado do salão.
— Ei, Potter! Potter! Como é que está a sua cabeça? Você está se sentindo legal? Tem certeza de que não vai endoidar para cima da gente?
Malfoy segurava um exemplar do Profeta Diário, também. Os alunos ao redor da mesa da Sonserina deram risadinhas e se viraram nas cadeiras para ver a reação de Harry.
— Me deixa ver isso — pediu Harry a Rony. — Me dá isso aqui.
Com muita relutância Rony entregou o jornal. Harry virou-o e deparou com a própria foto, sob uma gigantesca manchete.

“HARRY POTTER PERTURBADO E PERIGOSO”
O garoto que derrotou Aquele-Que-Não-Deve-Ser-Nomeado encontra-se instável e possivelmente perigoso, escreve nossa repórter especial Rita Skeeter. Há poucos dias vieram à luz provas assustadoras do estranho comportamento de Harry Potter, que lançam dúvidas sobre suas qualificações para competir em um torneio rigoroso como o Tribruxo, ou até mesmo para freqüentar a Escola de Hogwarts.
O Profeta Diário está em condições de afirmar, com exclusividade, que Potter regularmente desmaia na escola, e com freqüência se queixa de dor na cicatriz que tem na testa (relíquia de um feitiço com que Você-Sabe-Quem tentou matá-lo).
Na última segunda-feira, no meio de uma aula de Adivinhação, a repórter do Profeta Diário presenciou a saída intempestiva de Potter da sala de aula, dizendo que sua cicatriz o incomodava em demasia para que pudesse continuar em classe.
É possível dizem os maiores especialistas do Hospital St. Mungus para Doenças e Acidentes Mágicos, que o cérebro de Potter tenha sido afetado pelo ataque que sofreu de Você-Sabe-Quem, e que sua insistência em dizer que a cicatriz continua a doer seja uma expressão de sua arraigada confusão.
"Talvez até esteja fingindo": opinou um especialista, "o que poderia ser um mecanismo para receber atenção”.
O Profeta Diário, no entanto, descobriu fatos preocupantes sobre Harry Potter, que Alvo Dumbledore, diretor de Hogwarts, tem cuidadosamente ocultado do público bruxo.
"Potter é ofidioglota" revela Draco Malfoy, um quartanista de Hogwarts. "Há uns dois anos, houve uma série de ataques a estudantes, e quase todos pensaram que Potter era o responsável depois que o viram perder a cabeça em um Clube de Duelos e açular uma cobra contra um colega. O episódio foi abafado. Mas ele também faz amizade com lobisomens e gigantes. Achamos que ele é capaz de qualquer coisa para ter algum poder.”
Ofidioglossia, ou a capacidade de conversar com as cobras, é tradicionalmente considerada uma Arte das Trevas. Com efeito, o ofidioglota mais famoso dos nossos tempos não é outro senão Você-Sabe-Quem. Um membro da Liga de Defesa contra as Artes das Trevas, que prefere se manter anônimo, declarou que consideraria qualquer bruxo ofidioglota "merecedor de investigação”.
“Pessoalmente, eu encararia com muita suspeita qualquer pessoa que conversasse com cobras, pois esses animais em geral são usados nos piores tipos de magia negra e historicamente, são associados com bruxos malignos!” Da mesma forma "qualquer um que procure a companhia de criaturas selvagens como lobisomens e gigantes me parece ter inclinação para a violência":
Alvo Dumbledore deveria, sem dúvida, refletir se um garoto desses pode realmente competir no Torneio Tribruxo. Há quem receie que Potter possa apelar para as Artes das Trevas em seu desespero de vencer o torneio, cuja terceira tarefa será realizada hoje à noite.

— Acho que ela está deixando de gostar de mim, não? — comentou Harry despreocupado, dobrando o jornal.
Na mesa da Sonserina, Malfoy, Crabbe e Goyle riam-se dele, davam pancadinhas na cabeça, faziam caretas grotescas imitando loucos e agitavam as línguas como cobras.
— Como foi que ela soube que a sua cicatriz doeu na aula de Adivinhação? — perguntou Rony. — Não havia como ela ter estado presente, não havia como poder ter ouvido...
— A janela estava aberta — disse Harry. — Eu a abri para respirar.
— Você estava no alto da Torre Norte — lembrou Hermione. — Sua voz não podia ter sido ouvida lá embaixo nos jardins!
— Bem, você é quem anda pesquisando métodos mágicos de grampear! — disse Harry. — Me diga você como foi que ela conseguiu!
— Estou tentando — defendeu-se Hermione. — Mas eu... Mas...
Uma expressão estranha e sonhadora subitamente apareceu no rosto de Hermione. Ela ergueu uma das mãos e correu os dedos pelos cabelos.
— Você está legal? — perguntou Rony, erguendo as sobrancelhas para a amiga.
— Estou — respondeu Hermione sem fôlego. Ela tornou a correr os dedos pelos cabelos e levou a mão à boca, como se estivesse falando para um walkie-talkie invisível. Harry e Rony se entreolharam.
— Tive uma idéia — disse Hermione, olhando para o espaço. — Acho que sei... Porque desse jeito ninguém poderia ver... Nem Moody... E ela poderia ter chegado até o peitoril da janela... Mas isso é proibido... Decididamente é proibido... Acho que a pegamos! Me dêem dois segundinhos na biblioteca, só para ter certeza!
Dizendo isso, Hermione agarrou a mochila e saiu correndo do Salão Principal.
— Oi! — gritou Rony para ela. — Temos exame de História da Magia dentro de dez minutos! Caracas — disse o garoto tornando a se virar para Harry —, ela deve realmente odiar aquela Skeeter para se arriscar a perder o início do exame. Que é que você vai fazer na sala do Binns, reler livros?
Dispensado dos testes de fim de trimestre por ser campeão no torneio, até ali Harry se sentara no fundo das salas de exame, pesquisando novas azarações para a terceira tarefa.
— Acho que sim — respondeu Harry para Rony; mas nesse instante a Professora Minerva vinha contornando a mesa da Grifinória em direção a ele.
— Potter, os campeões vão se reunir na câmara vizinha ao salão depois do café — anunciou ela.
— Mas a tarefa só vai ser à noite! — exclamou Harry, derramando, sem querer, ovos mexidos na roupa, receoso de que tivesse se enganado na hora.
— Eu sei disso, Potter. As famílias dos campeões foram convidadas para assistir à última tarefa, entende. É apenas uma oportunidade para você cumprimentá-los.
Ela se afastou. Harry acompanhou-a com o olhar, boquiaberto.
— Ela não está esperando que os Dursley apareçam, está? — perguntou a Rony sem entender.
— Sei lá. Harry é melhor eu me apressar ou vou chegar tarde à sala do Binns. A gente se vê depois.
Harry terminou o café da manhã num salão que ia lentamente se esvaziando. Viu Fleur Delacour se levantar da mesa da Corvinal e se juntar a Cedrico, na hora em que o rapaz atravessava o salão para entrar na câmara.
Krum saiu daquele seu jeito curvado para se reunir a eles logo depois. Harry continuou onde estava. Na realidade não queria entrar na câmara. Não tinha família — ou pelo menos nenhuma família que fosse aparecer para vê-lo arriscar a vida. Mas no instante em que começou a se levantar, pensando que seria melhor ir à biblioteca reler mais algumas azarações, a porta da câmara se abriu e Cedrico pôs a cabeça para fora.
— Harry, anda, eles estão esperando por você!
Absolutamente perplexo, Harry se levantou. Não era possível que os Dursley estivessem ali, era? O garoto atravessou o salão e abriu a porta que levava à câmara. Cedrico e os pais estavam logo à entrada. Vitor Krum, a um canto, falava muito depressa em búlgaro com o pai e a mãe de cabelos escuros.
Herdara o nariz adunco do pai. Do outro lado da sala, Fleur algaraviava em francês com a mãe. Sua irmãzinha, Gabrielle, segurava a mão da mãe. Ela acenou para Harry, que retribuiu o aceno. Então ele viu a Sra. Weasley e Gui parados diante da lareira, sorrindo para ele.
— Surpresa! — disse animada a Sra. Weasley, quando Harry, todo sorriso, se encaminhou para eles.
— Pensamos em vir ver você, Harry! — Ela se curvou e lhe deu um beijo na bochecha.
— Você está bem? — cumprimentou Gui, sorrindo para o garoto e apertando sua mão. — Carlinhos queria vir, mas não pôde tirar licença. Ele me contou que você esteve incrível na tarefa com o Rabo-Córneo húngaro.
Fleur Delacour, Harry notou, espiava Gui, com grande interesse, por cima do ombro da mãe. O garoto percebeu que ela não fazia objeção alguma a cabelos compridos e brincos com dentes pendurados.
— Foi muita gentileza da senhora — murmurou Harry a Sra. Weasley. — Pensei por um momento... Os Dursley...
— Hum — resmungou a Sra. Weasley contraindo os lábios. Ela sempre se abstinha de criticar os Dursley diante de Harry, mas seus olhos faiscavam sempre que eles eram mencionados.
— Estou achando o máximo voltar aqui — comentou Gui, correndo os olhos pela câmara (Violeta, a amiga da Mulher Gorda, piscou para ele lá do seu quadro).
— Não revejo a escola há cinco anos. Aquele quadro do cavaleiro doidão ainda está por aí? Sir Cadogan?
— Ah, está — respondeu Harry, que conhecera Sir Cadogan no ano anterior.
— E a Mulher Gorda? — indagou Gui.
— Ela já estava aqui no meu tempo — comentou a Sra. Weasley. — Ela me passou um carão daqueles uma noite em que eu vinha voltando para o dormitório às quatro horas da manhã...
— E o que é que a senhora estava fazendo fora do dormitório às quatro horas da manhã? — perguntou Gui olhando a Sra. Weasley, admirado.
Ela sorriu, os olhos cintilando.
— Seu pai e eu saímos para dar um passeio à noite. Ele foi pego por Apolíneo Pringle, era o zelador naquela época, seu pai ainda tem as marcas.
— Quer fazer o tour da escola com a gente, Harry? — perguntou Gui.
— Ah, OK. — disse Harry e os três se dirigiram à porta que levava ao Salão Principal. Ao passarem por Amos Diggory, o bruxo se virou.
— Aí está você, não é? — disse ele, olhando Harry de alto a baixo. — Aposto como não está se sentindo tão cheio de si agora que Cedrico superou a sua pontuação, não?
— Quê? — exclamou Harry.
— Não dê atenção a ele — pediu Cedrico a Harry, em voz baixa, erguendo as sobrancelhas para o pai. — Ele anda aborrecido desde o artigo da Rita Skeeter sobre o Torneio Tribruxo, sabe, porque ela fez de conta que você era o único campeão de Hogwarts.
— Mas ele não se deu ao trabalho de corrigi-la, não é? — disse Amos Diggory, em voz suficientemente alta para Harry ouvir quando ia se encaminhando para a porta com a Sra. Weasley e Gui. — Mas... Você vai mostrar a ele, Cedrico. Já o venceu uma vez, não foi?
— Rita Skeeter sai do caminho dela para provocar confusões, Amos! — disse a Sra. Weasley zangada. — Era de se esperar que você soubesse disso, já que trabalha no Ministério!
O Sr. Diggory pareceu que ia dizer alguma coisa, irritado, mas sua mulher pôs a mão em seu braço e ele simplesmente encolheu os ombros e virou as costas.
Harry teve uma manhã muito agradável passeando pela propriedade ensolarada com Gui e a Sra. Weasley, mostrando-lhes a carruagem de Beauxbatons e o navio de Durmstrang. A Sra. Weasley se mostrou intrigada com o Salgueiro Lutador, que fora plantado depois que ela terminara a escola, e lembrou-se longamente do guarda-caça antes de Hagrid, um homem chamado Ogg.
— Como vai o Percy? — perguntou Harry, quando davam a volta às estufas.
— Nada bem — respondeu Gui.
— Ele está muito aborrecido — disse a Sra. Weasley, baixando a voz e olhando para os lados. — O Ministério quer abafar o desaparecimento do Sr. Crouch, e Percy foi convocado para um interrogatório sobre as instruções que o Sr. Crouch tem-lhe mandado. Aparentemente o Ministério pensa que elas talvez não tenham sido escritas por Crouch. Percy está sob uma enorme tensão. Não vão deixá-lo substituir o chefe, como quinto juiz, hoje à noite. Cornélio Fudge virá fazer isso.
Os três voltaram ao castelo para almoçar.
— Mamãe... Gui! — exclamou Rony, fazendo cara de espanto, ao se reunir à mesa da Grifinória. — Que é que vocês estão fazendo aqui?
— Viemos assistir à última tarefa do Harry! — disse a Sra. Weasley animada. — Devo confessar, é uma bela mudança não ter que cozinhar. Como foi o seu exame?
— Ah... OK... Não consegui me lembrar dos nomes de todos os duendes rebeldes, por isso inventei alguns. Tudo bem — acrescentou servindo-se de um pastel galês, sob o olhar severo da mãe —, todos eles têm nomes tipo Bodrode o Barbudo, Urgue o Impuro, não foi difícil.
Fred, Jorge e Gina vieram fazer companhia a eles também e Harry se divertiu tanto que quase se sentiu de volta à Toca, esquecera-se de se preocupar com a tarefa da noite e somente quando Hermione apareceu, já na metade do almoço, foi que ele se lembrou de que a garota tivera uma idéia sobre Rita Skeeter.
— Vai nos contar...?
Hermione balançou a cabeça num aviso e olhou para a Sra. Weasley.
— Olá, Hermione — disse a Sra. Weasley muito mais formalmente do que de costume.
— Olá — respondeu a garota, seu sorriso hesitante diante da expressão fria no rosto da senhora. Harry olhou para as duas, em seguida disse:
— Sra. Weasley, a senhora não acreditou naquele besteirol que a Rita Skeeter escreveu no Semanário das Bruxas, acreditou? Porque Mione não é minha namorada.
— Ah! — exclamou a Sra. Weasley. — Não... É claro que não!
Mas ela se tornou bem mais calorosa para com Hermione depois disso.
Harry, Gui e a Sra. Weasley passaram a tarde em um longo passeio ao redor do castelo, depois voltaram ao Salão Principal para o banquete da noite. Ludo Bagman e Cornélio Fudge haviam se sentado à mesa dos professores. Bagman parecia bem animado, mas Cornélio Fudge, ao lado de Madame Maxime, estava sério e calado. Madame Maxime se concentrava no prato a sua frente, e Harry achou que seus olhos pareciam vermelhos. Hagrid não parava de olhar para os lados dela na mesa.
Havia mais pratos do que de costume, mas o garoto, que estava começando a se sentir realmente nervoso, não comeu muito. Quando o teto encantado no alto começou a desbotar de azul para um violáceo crepuscular, Dumbledore se ergueu à mesa dos professores e fez-se silêncio.
— Senhoras e senhores, dentro de cinco minutos, vou pedir a todos que se encaminhem para o estádio de Quadribol para assistir à terceira e última tarefa do Torneio Tribruxo. Os campeões, por favor, queiram acompanhar o Sr. Bagman ao estádio agora.
Harry se levantou. Todos os colegas da Grifinória o aplaudiram, os Weasley e Hermione lhe desejaram boa sorte e ele se dirigiu à porta do Salão Principal com Cedrico, Fleur e Krum.
— Está se sentindo bem, Harry? — perguntou Bagman, quando desciam os degraus da entrada para os jardins. — Confiante?
— Estou OK... — Era um pouco verdade; estava nervoso, mas não parava de repassar mentalmente todas as azarações e feitiços que praticara enquanto andavam, e a idéia de que era capaz de lembrar de todos eles o fazia se sentir melhor.
Os campeões entraram no estádio de Quadribol, que estava totalmente irreconhecível. Uma sebe de seis metros corria a toda volta. Havia uma abertura bem diante deles: a entrada para o imenso labirinto. A passagem além parecia escura e sinistra.
Cinco minutos mais tarde, as arquibancadas começaram a se encher, o ar vibrou com as vozes excitadas e o ruído dos pés de centenas de estudantes que ocupavam seus lugares. O céu se tornara azul profundo e límpido, e as primeiras estrelas começavam a surgir. Hagrid, o Professor Moody, a Professora Minerva e o Professor Flitwick entraram no estádio e se aproximaram de Bagman e dos campeões.
Usavam grandes estrelas vermelhas e luminosas nos chapéus, todos, exceto Hagrid, que carregava a dele nas costas do colete de pele de toupeira.
— Vamos patrulhar o lado externo do labirinto — disse a professora aos campeões. — Se estiverem em apuros, e quiserem ser socorridos, disparem faíscas vermelhas para o ar e um de nós irá buscá-los, entenderam?
Os campeões confirmaram com um aceno de cabeça.
— Podem começar, então! — disse Bagman, animado, para os quatro patrulheiros.
— Boa sorte, Harry — sussurrou Hagrid, e os quatro saíram em diferentes direções para se postar em torno do labirinto. Bagman, então, apontou a varinha para a garganta e murmurou "Sonorus", e sua voz magicamente amplificada ressoou pelas arquibancadas.
— Senhoras e senhores, a terceira e última tarefa do Torneio Tribruxo está prestes a começar! Deixe-me lembrar a todos o placar atual! Empatados em primeiro lugar, com oitenta e cinco pontos cada, o Sr. Cedrico Diggory e o Sr. Harry Potter, os dois da Escola de Hogwarts!
Os vivas e as palmas fizeram os pássaros saírem voando da Floresta Proibida para o céu crepuscular.
— Em segundo lugar, com oitenta pontos, o Sr. Vítor Krum, do Instituto Durmstrang!— Mais aplausos. — E, em terceiro lugar, a Srta. Fleur Delacour, da Academia de Beauxbatons!
Harry conseguiu apenas reconhecer a Sra. Weasley, Gui, Rony e Hermione aplaudindo Fleur educadamente, mais ou menos no meio das arquibancadas. Ele acenou para os amigos que retribuíram o aceno, sorrindo.
— Então... Quando eu apitar, Harry e Cedrico! —, anunciou Bagman. — Três... Dois... Um...
O bruxo soprou com força o apito e Harry e Cedrico correram para a entrada do labirinto. As sebes altaneiras lançavam sombras escuras sobre a trilha e, talvez porque fossem tão altas e densas ou porque fossem encantadas, o barulho dos espectadores que as cercavam silenciou no instante em que os rapazes entraram no labirinto. Harry quase se sentiu novamente embaixo da água. Puxou a varinha, murmurou: “Lumus" e ouviu Cedrico fazer o mesmo atrás dele.
Depois de andarem uns cinqüenta metros, os garotos chegaram a uma bifurcação. Entreolharam-se.
— Até mais — disse Harry e tomou a trilha da esquerda, enquanto Cedrico tomou a da direita.
Harry ouviu o apito de Bagman uma segunda vez. Krum acabara de entrar no labirinto. Harry se apressou. A trilha que escolhera parecia completamente deserta.
Ele se virou à direita e continuou depressa, mantendo a varinha acima da cabeça, tentando ver o mais longe possível. Mesmo assim, não havia nada à vista.
O apito de Bagman soou ao longe uma terceira vez. Todos os campeões agora estavam no interior do labirinto.
Harry não parava de olhar para trás. Tinha a sensação familiar de que alguém o vigiava. O labirinto foi ficando mais escuro a cada minuto que se passava, porque o céu no alto ia ganhando um matiz azul-marinho. Ele chegou a uma segunda bifurcação.
— Me oriente — sussurrou ele à varinha, segurando-a deitada na palma da mão.
A varinha fez um giro completo e apontou para a direita, para a sebe maciça. Para ali ficava o norte, e ele sabia que precisava seguir para noroeste para chegar ao centro do labirinto. Faria melhor se tomasse a trilha da esquerda e tornasse a seguir para a direita assim que pudesse.
A trilha à frente também estava vazia e quando Harry chegou a uma curva à direita e entrou por ela, encontrou mais uma vez o caminho livre. Harry não sabia o porquê, mas a falta de obstáculos começava a deixá-lo nervoso. Com certeza já deveria ter encontrado algum a essa altura? Tinha a impressão de que o labirinto o estava induzindo a uma falsa sensação de segurança. Então ouviu um movimento bem atrás dele. Ergueu a varinha, pronto a atacar, mas seu facho de luz recaiu sobre Cedrico, que acabara de sair correndo da trilha do lado direito.
Cedrico parecia gravemente abalado. A manga de suas vestes fumegava.
— Os explosivins de Hagrid! — sibilou ele. — Estão enormes, escapei por um triz!
Cedrico sacudiu a cabeça e desapareceu de vista por outra trilha.
Interessado em guardar uma boa distância entre ele próprio e os explosivins, Harry retomou depressa o seu caminho. Então, ao fazer uma curva ele viu... Um dementador deslizava em sua direção. Três metros e meio de altura, o rosto oculto pelo capuz, as mãos podres e cobertas de feridas estendidas à frente, ele avançava às cegas, tateando em direção ao garoto. Harry ouviu sua respiração vibrante, sentiu um frio pegajoso se apoderar dele, mas sabia o que precisava fazer...
Chamou à mente o pensamento mais feliz que pôde, se concentrou com todas as forças no pensamento de sair do labirinto e comemorar com Rony e Hermione, ergueu a varinha e exclamou:
— Expecto Patronum!
Um veado prateado irrompeu da ponta da varinha de Harry e avançou à galope para o dementador, que recuou e tropeçou na barra das vestes... Harry nunca vira um dementador tropeçar.
— Espere ai! — gritou ele, avançando na cola do seu patrono prateado. — Você é um bicho-papão! Ridikulus!
Ouviu-se um grande estalo e o transformista explodiu, deixando atrás apenas uma fumacinha. O veado prateado desapareceu de vista. Harry desejou que ele tivesse podido ficar, seria agradável ter uma companhia... Mas continuou o seu caminho o mais depressa e silenciosamente que pôde, apurando os ouvidos, a varinha, mais uma vez, erguida no alto.
Esquerda... Direita... Novamente à esquerda... Em duas ocasiões ele foi dar em trilhas sem saída. Harry executou o Feitiço dos Quatro Pontos mais uma vez e descobriu que se afastara demais para leste.
Retrocedeu, tomou a trilha à direita e viu uma estranha névoa dourada flutuando mais adiante. Aproximou-se cautelosamente, apontando para a névoa o facho de luz da varinha. Parecia algum tipo de encantamento. Ele se perguntou se seria capaz de explodi-la para desimpedir o caminho.
— Reducto! — ordenou.
O feitiço atravessou a névoa, deixando-a intacta. O garoto concluiu que devia ter sabido: o Feitiço Redutor só servia para objetos sólidos. Que aconteceria se ele atravessasse a névoa? Valeria a pena arriscar ou deveria retroceder?
Ele ainda hesitava, quando um grito rompeu o silêncio.
— Fleur? — berrou Harry.
Silêncio. Ele olhou para todos os lados. Que acontecera com a garota? Seu grito parecia ter vindo de algum lugar à frente. O garoto inspirou profundamente e atravessou a névoa encantada.
O mundo virou de cabeça para baixo. Harry ficou pendurado no chão, os cabelos em pé, os óculos balançando fora do nariz, ameaçando cair no céu infinito.
Ele os segurou na ponta do nariz e continuou pendurado, aterrorizado.
Tinha a sensação de que seus pés estavam grudados na grama, que agora se transformara em teto. Abaixo, o céu pontilhado de estrelas se estendia infinitamente. Harry sentiu que se tentasse mexer um pé, despencaria da terra de vez. Pense, disse a si mesmo, enquanto todo o seu sangue afluía à cabeça, pense...
Mas nenhum dos feitiços que praticara se destinava a combater uma repentina inversão de terra e céu. Ousaria mexer um pé?
Ele ouviu o sangue latejar com força em seus ouvidos. Tinha duas opções — tentar se mexer ou disparar faíscas vermelhas e ser socorrido e desqualificado da tarefa.
Harry fechou os olhos para evitar contemplar o espaço infinito abaixo dele e puxou o pé direito com toda a força que pôde do teto gramado. Imediatamente o mundo se endireitou. Harry caiu para frente de joelhos num chão maravilhosamente sólido. Sentiu-se por algum tempo mole de susto. Inspirou profundamente para se firmar, então tornou a se levantar e avançou correndo, lançando olhares para trás por cima do ombro, enquanto fugia da névoa dourada, que piscou para ele inocentemente ao luar.
O garoto parou na junção de duas trilhas e olhou para os lados à procura de algum sinal de Fleur. Tinha certeza de que fora a garota que ouvira gritar. Com que será que ela deparara? Estaria bem?
Não havia faíscas vermelhas no alto — será que isto significava que conseguira se livrar do problema ou estaria em tal apuro que nem conseguira apanhar a varinha? Harry tomou a trilha à direita com uma sensação de crescente inquietação... Mas, ao mesmo tempo, não conseguiu deixar de pensar, menos um campeão...
A Taça estava em algum lugar ali perto e, pelo jeito, Fleur não estava mais competindo. Ele chegara até ali, não chegara? E se, de fato, conseguisse vencer?
Por um instante fugaz, e pela primeira vez desde que se fora feito campeão, ele reviu aquela imagem de si mesmo, erguendo a Taça do Tribruxo diante do resto da escola...
Por uns dez minutos não encontrou nada, exceto trilhas sem saída. Duas vezes tomou a mesma trilha errada. Finalmente encontrou um novo caminho e começou a andar depressa por ele, a luz da varinha oscilando, fazendo sua sombra bruxulear e se distorcer pelos lados da sebe. Então ele virou mais uma vez e deu de cara com umexplosívín.
Cedrico tinha razão — era enorme. Três metros de comprimento, lembrava mais um escorpião gigante do que qualquer outra coisa. Seu longo ferrão estava revirado para trás. A grossa armadura refulgia à luz da varinha, que Harry apontava para ele.
— Estupefaça!
O feitiço bateu no escudo do explosívín e ricocheteou; Harry se abaixou bem a tempo, mas sentiu cheiro de cabelos queimados, chamuscara o alto da cabeça. O explosívínsoltou um jorro de chamas da cauda e voou para cima do garoto.
— Impedimenta!— berrou Harry. O feitiço bateu mais uma vez no escudo do explosivine voltou; Harry cambaleou alguns passos para trás e caiu.
— IMPEDIMENTA!
O explosívín estava a centímetros dele quando se imobilizou — o garoto conseguira atingi-lo na barriga carnuda e sem escudo. Ofegando, Harry se impeliu para longe e correu, com todas as forças, na direção oposta — a Azaração de Impedimento não era permanente, o explosivin recobraria o uso das pernas a qualquer momento.
Harry seguiu pela trilha da esquerda e não encontrou saída, seguiu pela da direita e tampouco encontrou saída, obrigando-se a parar, com o coração acelerado, ele executou mais uma vez o Feitiço dos Quatro Pontos, retrocedeu e escolheu uma trilha que o levasse para noroeste.
Já ia caminhando apressado pela nova trilha havia alguns minutos, quando ouviu alguma coisa na trilha paralela à sua, que o fez estacar.
— Que é que você está fazendo? — berrou a voz de Cedrico. — Que diabo você pensa que está fazendo?
E então Harry ouviu a voz de Krum.
— Crucio!
O ar se encheu repentinamente com os gritos de Cedrico. Horrorizado, Harry avançou correndo por sua trilha, tentando encontrar uma passagem para a de Cedrico. Quando não apareceu nenhuma, ele tentou novamente o Feitiço Redutor. Não foi eficiente, mas queimou um buraquinho na sebe, pelo qual Harry enfiou a perna, chutando os galhos emaranhados até eles cederem deixando uma abertura, com esforço Harry a atravessou, rasgando as vestes e, ao olhar para a direita, viu Cedrico se debatendo e se contorcendo no chão, sob o olhar de Krum.
Harry se endireitou e apontou a varinha para Krum na hora em que o rapaz ergueu a cabeça. Krum deu as costas e começou a correr.
— Estupefaça!— berrou Harry.
O feitiço atingiu Krum pelas costas; ele parou instantaneamente, caiu de borco e ficou imóvel, com a cara na grama. Harry correu para Cedrico, que parara de se contorcer, mas continuava deitado no chão arfando, as mãos cobrindo o rosto.
— Você está bem? — perguntou Harry rouco, agarrando Cedrico pelo braço.
— Estou — ofegou ele. — É... Eu não acredito... Ele se aproximou de mim pelas costas... Eu o ouvi e, quando me virei, ele estava empunhando a varinha apontada para mim...
Cedrico se levantou. Ainda tremia. Ele e Harry olharam para Krum.
— Eu não acredito... Achei que ele era legal — comentou Harry, contemplando Krum.
— Eu também.
— Você ouviu Fleur gritar há algum tempo?
— Ouvi. Você acha que Krum a pegou também?
— Não sei — disse Harry lentamente.
— Vamos deixá-lo aqui? — perguntou Cedrico.
— Não — disse Harry. — Acho que devíamos disparar faíscas vermelhas. Alguém virá apanhá-lo... Do contrário ele provavelmente será comido por um explosívín.
— E seria bem merecido — murmurou Cedrico, mas ainda assim, ergueu a varinha e disparou uma chuva de faíscas vermelhas para o ar, que pairaram sobre Krum, marcando o local em que ele se encontrava.
Harry e Cedrico ficaram ali no escuro por um momento, olhando a toda volta. Então Cedrico falou:
— Bem... Suponho que seja melhor a gente ir...
— Quê? Ah... Sim... Certo...
Foi um momento estranho. Ele e Cedrico unidos por breves instantes contra Krum — agora o fato de serem adversários ocorria a ambos. Eles continuaram pela trilha escura sem falar, então Harry virou-se para a esquerda e Cedrico para a direita. O ruído dos passos do rapaz não tardou a desaparecer.
Harry seguiu caminho, continuando a usar o Feitiço dos Quatro Pontos, para se certificar de que caminhava na direção correta. Agora a competição estava entre ele e Cedrico. O desejo de chegar à Taça primeiro ardia em seu peito como nunca antes, mas ele não conseguia acreditar no que acabara de ver Krum fazer. O uso de uma Maldição Imperdoável em um ser humano significava uma sentença de prisão perpétua em Azkaban, fora o que Moody dissera. Krum com certeza não poderia ter desejado a Taça Tribruxo tanto assim... Harry se apressou.
De vez em quando ele chegava a trilhas sem saída, mas a escuridão crescente lhe dava a certeza de que estava se aproximando do centro do labirinto.
Então, quando seguia por uma trilha longa e reta, ele mais uma vez percebeu um movimento, e a luz de sua varinha incidiu sobre uma criatura extraordinária, uma que ele só vira sob a forma de ilustração no seu Livro Monstruoso dos Monstros.
Era uma esfinge. Tinha o corpo de um enorme leão, grandes patas com garras e um longo rabo amarelado que terminava em um tufo de pêlos castanhos.
A cabeça, porém, era de mulher. Ela virou os olhos amendoados para Harry quando ele se aproximou.
O garoto ergueu a varinha hesitante.
A esfinge não estava agachada como se fosse saltar, mas andava de um lado para outro da trilha, bloqueando seu avanço. Então falou, com uma voz profunda e rouca:
— Você está muito próximo do seu objetivo. O caminho mais rápido é passando por mim.
— Então... Então será que a senhora podia se afastar, por favor? — disse Harry, sabendo qual seria a resposta.
— Não — disse ela, continuando a sua patrulha. — Não, a não ser que você decifre o meu enigma. Se acertar de primeira, deixo-o passar. Se errar, eu o ataco. Permaneça em silêncio, e eu o deixarei partir ileso.
O estômago de Harry escorregou alguns centímetros. Hermione é que era boa nesse tipo de coisa e não ele. O garoto avaliou suas chances. Se o enigma fosse muito difícil, ele podia se calar, ir embora sem se machucar e tentar encontrar um caminho alternativo para o centro.
— OK. — respondeu ele. — Pode me dizer o enigma?
A esfinge se sentou nos quartos traseiros, bem no meio da trilha e recitou:

Primeiro pense no lugar reservado aos sacrifícios,
Seja em que templo for.
Depois, me diga que é que se
desfolha no inverno e torna a brotar na primavera?
E finalmente, me diga qual é o objeto que tem som,
luz e ar e flutua na superfície do mar?
Agora junte tudo e me responda o seguinte,
Que tipo de criatura você não gostaria de beijar?

Harry encarou-a boquiaberto.
— Podia, por favor, repetir... Mais devagar? — pediu hesitante.
A esfinge pestanejou, sorriu e repetiu o enigma.
— Todas as pistas levam ao nome da criatura que eu não gostaria de beijar? — perguntou Harry.
A esfinge meramente sorriu, aquele sorriso misterioso. Harry interpretou-o como um "sim". Começou a pensar. Havia muitos animais que ele não gostaria de beijar, seu pensamento imediato foi um explosívín, mas alguma coisa lhe disse que não era a resposta correta. Ele teria que tentar decifrar as pistas...
— O lugar reservado aos sacrifícios — murmurou Harry, encarando a esfinge —, seja em que templo for... Hum... Seria... Um altar. Não, esta não seria a minha resposta! Uma... Ara? Vou voltar a isso depois... poderia me dar a pista seguinte, por favor?
O animal fabuloso repetiu as linhas seguintes do enigma.
— A última coisa a desaparecer no inverno e a reaparecer na primavera nas árvores da floresta — repetiu Harry. — Hum... Não faço idéia... Árvores... Galhos... Rama... Pode me dizer o último trecho outra vez?
Ela repetiu as últimas quatro linhas.
— O objeto que tem som, luz e ar e flutua na superfície do mar... — disse Harry. — Hum... Isso seria... Hum... Espere aí, uma bóia?
A esfinge sorriu.
— Ara... Hum... Ara... Rama... — disse Harry, agora era ele quem estava andando para lá e para cá. — Uma criatura que eu não gostaria de beijar... Uma ararambóia!
A esfinge abriu um sorriso maior. Levantou-se, esticou as pernas dianteiras e então se afastou para um lado e o deixou passar.
— Obrigado! — disse Harry e, admirado com a própria genialidade, prosseguiu correndo.
Tinha que estar perto agora, tinha que estar... A varinha lhe dizia que estava na direção exata, desde que não deparasse com nada horripilante, ele poderia ter uma chance... À frente precisou escolher entre duas trilhas.
— Me oriente! — sussurrou mais uma vez à varinha, e ela deu um giro e apontou para a da direita.
Harry saiu correndo por ela e viu uma luz adiante.
A Taça Tribruxo brilhava num pedestal a menos de cem metros a sua frente. Harry mal saíra correndo quando um vulto escuro se precipitou sobre a trilha à sua frente.
Cedrico ia chegar primeiro. O rapaz estava correndo o mais rápido que podia em direção à Taça, e Harry percebeu que nunca o alcançaria, Cedrico era muito mais alto, tinha pernas muito mais compridas...
Então, Harry viu um vulto imenso por cima da sebe à sua esquerda, deslocando-se ligeiro pela trilha que cortava a sua, ia tão depressa que Cedrico estava prestes a colidir com ele, e com os olhos na Taça, o rapaz não vira o vulto...
— Cedrico! — berrou Harry. — À sua esquerda!
O garoto virou a cabeça em tempo de se atirar para além vulto e evitar colidir com ele, mas, em sua pressa, tropeçou. Harry viu a varinha voar da mão dele, ao mesmo tempo em que uma enorme aranha entrava na trilha e começava a avançar para o rapaz.
— Estupefaça! — berrou Harry, o feitiço atingiu o gigantesco corpo da aranha, negro e peludo, mas produziu tanto efeito quanto se o garoto tivesse atirado uma simples pedra nela, a aranha estremeceu, virou-se e correu para Harry.
— Estupefaça! Impedimenta! Estupefaça!
Mas não adiantou — a aranha ou era demasiado grande ou tão mágica que os feitiços só conseguiam irritá-la, Harry viu de relance, horrorizado, oito olhos negros e brilhantes e pinças afiadas como navalhas, antes que a aranha estivesse sobre ele.
O inseto ergueu-o no ar com as patas dianteiras, debatendo-se como louco, Harry tentou chutá-lo, sua perna fez contato com as pinças e no momento seguinte ele sentiu uma dor excruciante, ouviu Cedrico gritar "Estupefaça!” também, mas o feitiço do rapaz produziu tanto efeito quanto o de Harry, o garoto ergueu a varinha quando a aranha tornou a abrir as pinças e gritou "Expelliarmus!”
Funcionou, o Feitiço para Desarmar fez a aranha largá-lo, o que significou que Harry caiu três metros e tanto sobre uma perna já machucada, que se dobrou sob seu corpo. Sem parar para pensar, ele mirou bem alto sob a barriga da aranha, como fizera comexplosívín, e gritou "Estupefaça!" na mesma hora em que Cedrico gritava o mesmo.
Os dois feitiços combinados fizeram o que um sozinho não conseguira — a aranha tombou de lado, achatando uma sebe próxima, e espalhando na trilha um emaranhado de pernas peludas.
— Harry! — ele ouviu Cedrico gritar. — Você está bem? Ela caiu em cima de você?
— Não! — gritou Harry em resposta. Ele examinou a perna. Sangrava muito.
Ele viu uma secreção grossa e pegajosa que saíra das pinças da aranha em suas vestes rasgadas. Então, tentou se levantar, mas a perna tremia demais e se recusava a sustentar seu peso. Ele se apoiou na sebe, tentando recuperar o fôlego e olhou para os lados.
Cedrico estava a pouquíssima distância da Taça Tribruxo que refulgia às suas costas.
— Pegue a Taça, então — disse Harry arfante para Cedrico. — Pegue logo. Você chegou ao centro.
Mas Cedrico não se mexeu. Continuou parado olhando para Harry. Em seguida virou-se para olhar a Taça. Harry percebeu a expressão desejosa no rosto do rapaz à luz dourada do objeto. Cedrico se virou mais uma vez para Harry que agora se amparava na sebe para se manter de pé. Cedrico inspirou profundamente.
— Você pega. Você é que deveria vencer. Você salvou minha vida duas vezes neste labirinto.
— Não é assim que a coisa deve funcionar — disse Harry. Sentiu raiva, sua perna doía muito, seu corpo doía inteiro do esforço para se desvencilhar da aranha e, apesar de tudo isso, Cedrico o vencera, da mesma forma que o vencera na hora de convidar Cho para o baile. — Quem chegar à Taça primeiro ganha os pontos. E foi você. Estou lhe dizendo, não vou vencer nenhuma corrida com essa perna assim.
Cedrico deu alguns passos em direção à aranha estuporada, afastando-se da Taça e balançou a cabeça.
— Não — disse.
— Pare de ser nobre — retrucou Harry irritado. — Pegue logo a Taça para a gente poder ir embora daqui.
Cedrico observou Harry se aprumar, segurando-se com força na sebe.
— Você me falou dos dragões — disse Cedrico. — Eu teria perdido a primeira tarefa se você não tivesse me prevenido sobre o que me esperava.
— Tive ajuda nisso — retorquiu Harry, tentando enxugar a perna ensangüentada com as vestes. — Você me ajudou com o ovo, estamos quites.
— Eu tive ajuda com o ovo para começar — disse Cedrico.
— Continuamos quites — repetiu Harry, experimentando a perna, desajeitado, ela tremeu violentamente quando o garoto se apoiou nela, tinha torcido o tornozelo quando a aranha o largara.
— Você devia ter ganho mais pontos na segunda tarefa — teimou Cedrico. — Você ficou para trás para salvar todos os reféns. Eu é que deveria ter feito isso.
— Eu fui o único campeão suficientemente burro para levar aquela música a sério! — disse Harry com amargura. — Pegue a Taça!
— Não.
Cedrico pulou por cima do emaranhado de pernas da aranha para se juntar a Harry, que o encarou. Cedrico falava sério. Estava dando as costas a uma glória que a Casa da Lufa-Lufa não experimentava havia séculos.
— Anda — disse o rapaz. Dava a perceber que aquela atitude estava lhe custando cada centímetro de determinação que possuía, mas havia firmeza em seu rosto, cruzara os braços, parecia decidido.
Harry olhou de Cedrico para a Taça. Por um momento fulgurante ele se viu saindo do labirinto, segurando-a. Viu-se erguendo a Taça Tribruxo no alto, ouviu os berros dos espectadores, viu o rosto de Cho iluminado de admiração, mais claramente do que jamais o vira... E então a imagem se dissolveu e ele se viu encarando o rosto teimoso e sombrio de Cedrico.
— Os dois — disse Harry.
— Quê?
— Levamos a Taça ao mesmo tempo. Ainda é uma vitória Hogwarts. Empatamos.
Cedrico encarou Harry. Descruzou os braços.
— Você... Você tem certeza?
— Tenho. Tenho... Nós nos ajudamos, não foi? Nós dois chegamos aqui. Vamos levá-la, juntos.
Por um instante, Cedrico pareceu que não conseguia acreditar no que estava ouvindo, então seu rosto se abriu num sorriso.
— Negócio fechado. Venha até aqui.
Ele agarrou o braço de Harry pela axila e ajudou-o a mancar até o pedestal onde estava a Taça.
Quando a alcançaram, os dois estenderam a mão para cada uma das asas.
— Quando eu disser três, certo? — disse Harry — Um... Dois... Três...
Ele e Cedrico apertaram as asas.
Instantaneamente, Harry sentiu um solavanco dentro do umbigo. Seus pés deixaram o chão. Ele não conseguiu soltar a mão da Taça Tribruxo, ela o puxava para diante, num vendaval colorido, Cedrico ao seu lado.

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