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Unknown
junho 06, 2014
Capítulo 20
Voltar ao túnel foi difícil. Lupin, Pettigrew e Rony tiveram que se virar de lado para consegui-lo; Lupin continuava a cobrir Pettigrew com a varinha. Harry os via avançar lentamente pelo túnel em fila indiana. Bichento sempre à frente. Harry logo atrás de Black, que continuava a fazer Snape flutuar à frente com a cabeça mole batendo sem parar no teto baixo. O menino tinha a impressão de que Black não estava fazendo nada para evitar as batidas.
— Você sabe o que isso significa? — perguntou Black abruptamente a Harry enquanto faziam seu lento progresso pelo túnel. — Entregar Pettigrew?
— Você fica livre... — respondeu Harry.
— É. Mas eu também sou, não sei se alguém lhe disse, eu sou seu padrinho.
— Eu soube — disse Harry.
— Bem... Os seus pais me nomearam seu tutor — disse Black formalmente. — Se alguma coisa acontecesse a eles...
Harry esperou. Será que Black queria dizer o que ele achava que queria?
— Naturalmente, eu vou compreender se você quiser ficar com seus tios — disse Black. — Mas... Bem... Pense nisso. Depois que o meu nome estiver limpo... Se você quiser uma... Uma casa diferente...
Uma espécie de explosão ocorreu no fundo do estômago de Harry.
— Quê, morar com você? — perguntou, batendo a cabeça, sem querer, numa pedra saliente do teto. — Deixar a casa dos Dursley?
— Claro, achei que você não ia querer — disse Black apressadamente. — Eu compreendo, só pensei que...
— Você ficou maluco? — disse Harry com a voz quase tão rouca quanto à de Black. — Claro que quero deixar a casa dos Dursley! Você tem casa? Quando é que eu posso me mudar?
Black virou-se completamente para olhar o garoto; a cabeça de Snape raspou o teto, mas Black não parecia se importar.
— Você quer? — perguntou ele. — Sério?
— Sério! — respondeu Harry.
O rosto ossudo de Black se abriu no primeiro sorriso verdadeiro que Harry já o tinha visto dar. A diferença que fazia era espantosa, como se uma pessoa dez anos mais nova se projetasse através da máscara de fome; por um instante ele se tornou reconhecível como o homem que estava rindo no casamento dos pais de Harry.
Os dois não se falaram mais até chegar ao fim do túnel. Bichento saiu correndo à frente; evidentemente apertara o nó do tronco com a pata, porque Lupin, Pettigrew e Rony subiram penosamente, mas não houve ruídos de galhos ferozes.
Black fez Snape passar pelo buraco, depois se afastou para Harry e Hermione passarem. Finalmente todos conseguiram sair.
Os jardins estavam muito escuros agora; as únicas luzes vinham das janelas distantes do castelo. Sem dizer uma palavra, eles começaram a andar. Pettigrew continuava a arquejar e, ocasionalmente, a choramingar. A cabeça de Harry zumbia. Ele ia deixar os Dursley. Ia morar com Sirius Black, o melhor amigo dos seus pais...
Sentia-se atordoado... Que iria acontecer quando dissesse aos Dursley que ia morar com o preso que tinham visto na televisão!
— Um movimento errado, Pedro — ameaçou Lupin que ia à frente. Sua varinha continuava apontada de viés para o peito de Pettigrew.
Em silêncio eles avançaram pelos jardins, as luzes do castelo crescendo com a aproximação. Snape continuava a flutuar de maneira fantasmagórica à frente de Black, o queixo batendo no peito. Então...
Uma nuvem se mexeu. Inesperadamente surgiram sombras escuras no chão. O grupo foi banhado pelo luar. Snape se chocou com Lupin, Pettigrew e Rony, que pararam abruptamente. Black congelou. Ele esticou um braço para fazer Harry e Hermione pararem.
O garoto viu a silhueta de Lupin. O professor enrijecera. Então as pernas de Harry começaram a tremer.
— Ah, não! — exclamou Hermione. — Ele não tomou a poção hoje à noite. Ele está perigoso!
— Corram — sussurrou Black. — Corram. Agora.
Mas Harry não podia correr. Rony estava acorrentado a Pettigrew e Lupin. Ele deu um salto para frente, mas Black o abraçou pelo peito e o atirou para trás.
— Deixe-o comigo... CORRA!
Ouviu-se um rosnado medonho. A cabeça de Lupin começou a se alongar. O seu corpo também. Os ombros se encurvaram. Pelos brotavam visivelmente de seu rosto e suas mãos, que se fechavam transformando-se em patas com garras. Os pêlos de Bichento ficaram outra vez em pé e ele estava recuando...
Quando o Lobisomen se empinou, batendo as longas mandíbulas, Sirius desapareceu do lado de Harry. Transformara-se. O enorme cão semelhante a um urso saltou para frente. Quando o Lobisomen se livrou da algema que o prendia, o cão agarrou-o pelo pescoço e puxou-o para trás, afastando-o de Rony e Pettigrew. Atracaram-se, mandíbula contra mandíbula, as garras se golpeando...
Harry parou petrificado com a visão, demasiado absorto com a batalha para prestar atenção em outra coisa. Foi o grito de Hermione que o alertou...
Pettigrew tinha mergulhado para apanhar a varinha caída de Lupin. Rony, mal equilibrado na perna enfaixada, caiu. Houve um estampido, um clarão... e Rony ficou estirado, imóvel, no chão. Outro estampido... Bichento voou pelo ar e tornou a cair na terra fofa.
— Expelliarmus! — berrou Harry apontando a própria varinha para Pettigrew; a varinha de Lupin voou muito alto e desapareceu de vista. — Fique onde está! — gritou Harry, correndo em frente.
Tarde demais. Pettigrew se transformara. Harry viu seu rabo pelado passar pela algema no braço estendido de Rony e o ouviu correr pelo gramado.
Um uivo e um rosnado prolongado e surdo ecoaram; Harry se virou e viu o Lobisomen fugindo; galopando para a floresta...
— Sirius, ele fugiu, Pettigrew se transformou — berrou Harry.
Black sangrava; havia cortes profundos em seu focinho e nas costas, mas ao ouvir as palavras de Harry ele tornou a se levantar depressa e, num instante, o ruído de suas patas foi morrendo até cessar ao longe.
Harry e Hermione correram para Rony.
— Que foi que Pettigrew fez com ele? — sussurrou Hermione. Os olhos de Rony estavam apenas semicerrados, a boca frouxa e aberta; sem dúvida, estava vivo, eles o ouviam respirar, mas não parecia reconhecer os amigos.
— Não sei.
Harry olhou desesperado para os lados. Black e Lupin, os dois tinham ido embora... Não havia mais nenhum adulto em sua companhia exceto Snape, que ainda flutuava, inconsciente, no ar.
— É melhor levarmos os dois para o castelo e contarmos a alguém — disse Harry, afastando os cabelos dos olhos, tentando pensar direito. — Vamos...
Mas então, para além do seu campo de visão, eles ouviram latidos, um ganido; um cachorro em sofrimento...
— Sirius — murmurou Harry, olhando para o escuro.
Ele teve um momento de indecisão, mas não havia nada que pudessem fazer por Rony naquele momento, e pelo que ouviam, Black estava em apuros...
Harry saiu correndo, Hermione em seu encalço. Os latidos pareciam vir da área próxima ao lago. Eles saíram desabalados naquela direção, e Harry, correndo sem parar, sentiu o frio sem perceber o que devia significar...
Os latidos pararam abruptamente. Quando os garotos chegaram ao lago viram o porquê Sirius se transformara outra vez em homem. Estava caído de quatro, com as mãos na cabeça.
— Nããão — gemia —, Nããão... Por favor...
Então Harry os viu. Dementadores, no mínimo uns cem deles, deslizando em torno do lago num grupo escuro que vinha em sua direção. O menino se virou, o frio de gelo seu conhecido, penetrando suas entranhas, a névoa começando a obscurecer sua visão; eles não estavam somente surgindo da escuridão por todo o lado; estavam cercando-os...
— Hermione, pense em alguma coisa feliz! — berrou Harry, erguendo a varinha, piscando furiosamente para tentar clarear sua visão, sacudindo a cabeça para livrá-la da leve gritaria que começara dentro dela... “Eu vou morar com o meu padrinho. Vou deixar os Dursley”.
Ele se forçou a pensar em Black, e somente em Black, e começou a cantar:
—Expecto Patronum! Expecto Patronum!
Black estremeceu, rolou de barriga para cima e ficou imóvel no chão, pálido como a morte.
“Ele vai ficar bem. Eu vou morar com ele”.
— Expecto Patronum! Hermione, me ajude! Expecto Patronum...
— Expecto... — murmurou Hermione — Expecto... Expecto...
Mas ela não conseguia. Os dementadores estavam mais próximos, agora a menos de três metros deles. Formavam uma muralha sólida em torno de Harry e Hermione, cada vez mais próximos...
— EXPECTO PATRONUM! — berrou Harry, tentando abafar a gritaria em seus ouvidos. — EXPECTO PATRONUM!
Um fiapinho prateado saiu de sua varinha e pairou como uma névoa diante dele. No mesmo instante, Harry sentiu Hermione desmaiar ao seu lado. Estava só... Completamente só...
— Expecto... Expecto Patronum...
Harry sentiu os joelhos baterem na grama fria. O nevoeiro nublou seus olhos. Com um enorme esforço, ele lutou para se lembrar... Sirius era inocente... Inocente... “Ele vai ficar bem... Eu vou morar com ele...”
— Expecto Patronum! — exclamou.
À luz fraca do seu Patrono disforme, ele viu um dementador parar, muito perto dele. Não conseguiu atravessar a nuvem de névoa prateada que Harry conjurara.
A mão morta e viscosa deslizou para fora da capa. Ela fez um gesto como se quisesse varrer o Patrono para o lado.
— Não... Não... — ofegou Harry. — Ele é inocente... Expecto... Expecto Patronum...
Ele sentia que os dementadores o observavam, ouvia a respiração deles vibrar como um vento maligno ao seu redor, O dementador mais próximo parecia estar avaliando-o. Então ergueu as duas mãos podres... E baixou o capuz para trás.
Onde devia haver olhos, havia apenas uma pele sarnenta e cinza, esticada por cima das órbitas vazias. Mas havia uma boca... Um buraco escancarado e disforme, que sugava o ar com o ruído de uma matraca que anuncia a morte.
Um terror paralisante invadiu Harry de modo que ele não conseguia se mexer nem falar. Seu Patrono piscou e desapareceu.
O nevoeiro branco o cegava. Ele tinha que lutar...
— Expecto Patronum...
Ele não conseguia ver... Ao longe ouvia os gritos já familiares...
— Expecto Patronum...
Ele tateou pela névoa à procura de Sirius, e encontrou seu braço... Os dementadores não iam levá-lo...
Mas um par de mãos pegajosas e fortes, de repente, se fechou em torno do pescoço de Harry. Forçavam-no a erguer o rosto... Ele sentiu seu hálito... Ia se livrar dele primeiro... Harry sentiu seu hálito podre... Sua mãe gritava em seus ouvidos... Ia ser a última coisa que ele ouviria...
E então, através do nevoeiro que o afogava, ele achou que estava vendo uma luz prateada que se tornava cada vez mais forte... Ele sentiu que estava emborcando na grama...
O rosto no chão, demasiado fraco para se mexer, nauseado e trêmulo, Harry abriu os olhos. O dementador devia tê-lo soltado. A luz ofuscante iluminava o gramado a seu redor... Os gritos tinham cessado, o frio estava diminuindo...
Alguma coisa estava obrigando os dementadores a recuar... Girava em torno dele, de Black e Hermione... Os dementadores estavam se afastando... O ar reaquecia...
Com cada grama de força que ele conseguiu reunir, Harry ergueu a cabeça uns poucos centímetros e viu um animal envolto em luz, distanciando-se a galope através do lago. Os olhos embaçados de suor, Harry tentou distinguir o que era...
Era fulgurante como um unicórnio. Lutando para se manter consciente, viu-o diminuir o galope ao chegar à margem oposta do lago. Por um momento, Harry viu, à sua claridade, alguém que lhe dava as boas-vindas... Erguendo a mão para lhe dar uma palmadinha... Alguém que lhe pareceu estranhamente familiar... Mas não podia ser...
Harry não entendeu. Não conseguiu mais pensar. Sentiu que suas últimas forças o abandonavam e sua cabeça bateu no chão quando ele desmaiou.