- Back to Home »
- Harry Potter e o Prisioneiro de Azkaban »
- O servo de Lord Voldemort
Posted by :
Unknown
junho 06, 2014
Capítulo 19
— Encontrei isso ao pé do Salgueiro Lutador — disse Snape, atirando a capa para o lado, mas tendo o cuidado de manter a varinha apontada diretamente para o peito de Lupin.
— Muito útil, Potter, obrigado...
Snape estava ligeiramente sem fôlego, mas o rosto expressava contido triunfo.
— Vocês talvez estejam se perguntando como foi que eu soube que estavam aqui? — disse com os olhos brilhantes. Acabei de passar por sua sala, Lupin. Você esqueceu de tomar sua poção hoje à noite, então resolvi lhe levar um cálice. E foi uma sorte... Sorte para mim, quero dizer. Encontrei em cima de sua mesa um certo mapa. Bastou uma olhada para me dizer tudo que eu precisava saber. Vi você correr por essa passagem e desaparecer de vista.
— Severo... — começou Lupin, mas Snape atropelou-o.
— Eu disse ao diretor várias vezes que você estava ajudando o seu velho amigo Black a entrar no castelo, Lupin, e aqui tenho a prova. Nem mesmo eu poderia sonhar que você teria o topete de usar este lugar antigo como esconderijo...
— Severo, você está cometendo um engano — disse Lupin com urgência na voz. — Você não sabe de tudo, posso explicar, Sirius não está aqui para matar Harry...
— Mais dois para Azkaban esta noite — disse Snape, os olhos brilhando de fanatismo. — Vou ficar curioso para saber como que Dumbledore vai encarar isso... Ele estava convencido de que você era inofensivo, sabe, Lupin... Um Lobisomem manso...
— Seu tolo — disse Lupin com brandura. — Será que um ressentimento de criança é suficiente para mandar um homem inocente de volta a Azkaban?
BANGUE!
Cordas finas que lembravam cobras jorraram da ponta da varinha de Snape e se enrolaram em torno da boca de Lupin, dos seus punhos e tornozelos;
Ele perdeu o equilíbrio e caiu no chão, incapaz de se mexer. Com um rugido de cólera, Black avançou para Snape, mas este apontou a varinha entre os olhos de Black.
— É só me dar um motivo — sussurrou o professor. — É só me dar um motivo, e juro que faço.
Black se imobilizou. Teria sido impossível dizer qual dos dois rostos revelava mais ódio.
Harry continuou ali, paralisado, sem saber o que fazer ou em quem acreditar. Olhou para Rony e Hermione. Seu amigo parecia tão confuso quanto ele e ainda tentava segurar um Perebas rebelde. Hermione, porém, adiantou-se, hesitante, para Snape e disse, respirando com dificuldade:
— Professor... Não faria mal ouvirmos o que eles têm a dizer, f... faria?
— Senhorita Granger, a senhorita já vai enfrentar uma suspensão — bufou Snape. — A senhorita, Potter e Weasley estão fora dos limites da escola em companhia de um criminoso sentenciado e de um Lobisomem, pelo menos uma vez na sua vida, cale a boca.
— Mas se... Se houve um engano...
— FIQUE QUIETA, SUA BURRINHA! — berrou Snape, parecendo de repente muito perturbado. — NÃO FALE DO QUE NÃO ENTENDE! — Saíram algumas fagulhas da ponta de sua varinha, que continuava apontada para o rosto de Black. Hermione se calou. — A vingança é muito doce — sussurrou Snape para Black. — Como desejei ter o privilégio de apanhá-lo...
— Você é que vai fazer papel de tolo outra vez, Severo — rosnou Black. — Se esse garoto levar o rato dele até o castelo — e indicou Rony com a cabeça... — Eu vou sem criar caso...
— Até o castelo? — retrucou Snape, com voz insinuante. — Acho que não precisamos ir tão longe. Basta eu chamar os dementadores quando sairmos do salgueiro. Eles vão ficar muito satisfeitos em vê-lo, Black... Satisfeitos o suficiente para lhe dar um beijinho, eu me arriscaria a dizer...
A pouca cor que havia no rosto de Black desapareceu.
— Você... Você tem que ouvir o que tenho a dizer — disse ele, rouco. — O rato... Olhe aquele rato...
Mas havia um brilho alucinado nos olhos de Snape que Harry nunca vira antes. O professor parecia incapaz de ouvir.
— Vamos, todos. — Snape estalou os dedos e as pontas das cordas que amarravam Lupin voaram para suas mãos. — Eu puxo o Lobisomem. Talvez os dementadores tenham um beijo para ele também...
Antes que se desse conta do que estava fazendo, Harry atravessou o quarto em três passadas e bloqueou a porta.
— Saia da frente, Potter, você já está suficientemente encrencado — rosnou Snape. — Se eu não estivesse aqui para salvar sua pele...
— O Profº. Lupin poderia ter me matado cem vezes este ano — disse Harry. — Estive sozinho com ele montes de vezes, tomando aulas de defesa contra dementadores. Se ele estava ajudando Black, por que não me liquidou logo?
— Não me peça para imaginar como funciona a cabeça de um Lobisomem — sibilou Snape. — Saia da frente, Potter.
— O SENHOR É PATÉTICO! — berrou Harry. — SÓ PORQUE ELES FIZERAM O SENHOR DE BOBO NA ESCOLA, O SENHOR NÃO QUER NEM ESCUTAR...
— SILÊNCIO! NÃO ADMITO QUE FALEM ASSIM COMIGO! — gritou Snape, parecendo mais louco que nunca. — Tal pai, tal filho, Potter! Acabei de salvar seu pescoço; você devia me agradecer de joelhos! Teria sido bem feito se Black o tivesse matado! Você teria morrido como seu pai, arrogante demais para acreditar que poderia ter se enganado com um amigo... Agora saia da frente, ou eu vou fazer você sair. SAIA DA FRENTE, POTTER!
Harry se decidiu em uma fração de segundo. Antes que Snape pudesse sequer dar um passo em sua direção, o garoto ergueu a varinha.
— Expelliarmus — berrou, só que sua voz não foi a única a gritar. Houve uma explosão que fez a porta sacudir nas dobradiças; Snape foi levantado e atirado contra a parede, depois escorregou por ela até o chão, um filete de sangue escorrendo por baixo dos cabelos. Fora nocauteado.
Harry olhou para os lados. Rony e Hermione também tinham tentado desarmar Snape exatamente no mesmo instante. A varinha do professor voou no ar descrevendo um arco e caiu em cima da cama, ao lado de Bichento.
— Você não devia ter feito isso — censurou Black olhando para Harry. — Devia tê-lo deixado comigo...
Harry evitou o olhar de Black. Não tinha certeza, mesmo agora, de que agira certo.
— Atacamos um professor... Atacamos um professor... — choramingou Hermione, olhando assustada para o inconsciente Snape. — Ah, vamos nos meter numa confusão tão grande...
Lupin lutava para se livrar das cordas. Black se abaixou depressa e o desamarrou. O professor se ergueu, esfregando os braços onde as cordas o tinham machucado.
— Obrigado, Harry — agradeceu.
— Não estou dizendo com isso que já acredito no senhor — disse o garoto.
— Então está na hora de lhe apresentarmos alguma prova. Você, garoto... Me dê o Pedro, por favor. Agora.
Rony apertou Perebas mais junto ao peito.
— Nem vem — disse o garoto com a voz fraca. — O senhor está tentando dizer que Black fugiu de Azkahan só para pôr as mãos em Perebas? Quero dizer... — e olhou para Harry e Hermione à procura de apoio —, tudo bem, vamos dizer que Pettigrew pudesse se transformar em rato, há milhões de ratos, como é que Black vai saber qual é o que está procurando se estava trancafiado em Azkaban?
— Sabe, Sirius, a pergunta é justa — disse Lupin, virando-se para Black com a testa ligeiramente franzida. — Como foi que você descobriu onde estava o rato?
Black enfiou uma das mãos, que lembravam garras, dentro das vestes e tirou um pedaço de papel amassado, que ele alisou e mostrou aos outros.
Era a foto de Rony com a família, que aparecera no Profeta Diário no último verão, e ali, no ombro de Rony, estava Perebas.
— Onde foi que você arranjou isso? — perguntou Lupin a Black, perplexo.
— Fudge — disse Black. — Quando ele foi inspecionar Azkaban no ano passado, me cedeu o jornal que levava. E lá estava Pedro, na primeira página... no ombro desse garoto... Reconheci-o na mesma hora... Quantas vezes o vi se transformar? — a legenda dizia que o menino ia voltar para Hogwarts... Onde Harry estava...
— Meu Deus — exclamou Lupin baixinho, olhando de Perebas para a foto no jornal e de volta ao rato. — A pata dianteira...
— Que é que tem a pata? — disse Rony em tom de desafio.
— Tem um dedinho faltando — afirmou Black.
— Claro — murmurou Lupin. — Tão simples... Tão genial... Ele mesmo o cortou?
— Pouco antes de se transformar — confirmou Black. — Quando eu o encurralei, ele gritou para a rua inteira que eu havia traído Lílian e Tiago. Então, antes que eu pudesse lhe lançar um feitiço, ele explodiu a rua com a varinha escondida às costas, matou todo mundo em um raio de seis metros, e fugiu para dentro do bueiro com os outros ratos...
— Você já ouviu falar, não Rony? — perguntou Lupin. — O maior pedaço do corpo de Pedro que acharam foi o dedo.
— Olha aqui, Perebas com certeza brigou com outro rato ou coisa parecida! Ele está na minha família há séculos, certo...
— Doze anos, para sermos exatos — disse Lupin. — Você nunca estranhou que ele tenha vivido tantos anos?
— Nós... Nós cuidamos bem dele!
— Mas ele não está com um aspecto muito saudável no momento, não é? — comentou Lupin. — Imagino que esteja perdendo peso desde que ouviu falar que Sirius fugiu...
— Ele tem andado apavorado com aquele gato maluco! — justificou Rony, indicando com a cabeça Bichento, que continuava a ronronar na cama.
Mas isso não era verdade, ocorreu a Harry de repente... Perebas já estava com cara de doente antes de conhecer Bichento... Desde que Rony voltara do Egito... Desde que Black escapara...
— O gato não é maluco — disse Black, rouco. Ele estendeu a mão ossuda e acariciou a cabeça peluda de Bichento. — É o gato mais inteligente que já encontrei. Reconheceu na mesma hora o que Pedro era. E quando me encontrou, percebeu que eu não era cachorro. Levou um tempinho para confiar em mim. No fim eu consegui comunicar a ele o que estava procurando e ele tem me ajudado...
— Como assim? — murmurou Hermione.
— Ele tentou trazer Pedro a mim, mas não pôde... Então roubou para mim as senhas de acesso à Torre da Grifinória... Pelo que entendi, ele as tirou da mesa-de-cabeceira de um garoto...
O cérebro de Harry parecia estar fraquejando sob o peso do que ouvia. Era absurdo... Contudo...
— Mas Pedro soube o que estava acontecendo e se mandou... — falou Black. — Este gato... Bichento, foi o nome que lhe deu?... Me disse que Pedro tinha sujado os lençóis de sangue... Suponho que tenha se mordido... Ora, fingir-se de morto já tinha dado certo uma vez...
Essas palavras sacudiram o torpor mental de Harry.
— E sabe por que é que ele se fingiu de morto? — perguntou o garoto impetuosamente. — Porque sabia que você ia matar ele como tinha matado os meus pais!
— Não — disse Lupin. — Harry...
— E agora você veio acabar com ele!
— É verdade, vim — disse Black, lançando um olhar maligno a Perebas.
— Então eu devia ter deixado Snape levar você! — gritou Harry.
— Harry — disse Lupin depressa —, você não está vendo? Todo este tempo pensamos que Sirius tinha traído seus pais e que Pedro o perseguira... Mas foi o contrário, você não está vendo? Pedro traiu sua mãe e seu pai... Sirius perseguiu Pedro...
— NÃO É VERDADE! — berrou Harry. — ELE ERA O FIEL DO SEGREDO DELES! ELE DISSE ISSO ANTES DO SENHOR APARECER. ELE CONFESSOU QUE MATOU MEUS PAIS!
O garoto apontava para Black, que sacudia a cabeça devagarinho; de repente seus olhos fundos ficaram excessivamente brilhantes.
— Harry... Foi o mesmo que ter matado — disse, rouco. — Convenci Lílian e Tiago a entregarem o segredo a Pedro no último instante, convenci-os a usar Pedro como fiel do segredo, em vez de mim... A culpa é minha, eu sei... Na noite em que eles morreram, eu tinha combinado de procurar Pedro para verificar se ele continuava bem, mas quando cheguei ao esconderijo ele não estava. Mas não havia sinais de luta. Achei estranho. Fiquei apavorado. Corri na mesma hora direto para a casa dos seus pais. E quando vi a casa destruída e os corpos deles... Percebi o que Pedro devia ter feito. O que eu tinha feito.
A voz dele se partiu. Ele virou as costas.
— Basta — disse Lupin, e havia um tom inflexível em sua voz que Harry nunca ouvira antes. — Tem uma maneira de provar o que realmente aconteceu. Rony, me dê esse rato.
— Que é que o senhor vai fazer com ele se eu der? — perguntou Rony, tenso.
— Obrigá-lo a se revelar — disse Lupin. — Se ele for realmente um rato, não se machucará.
Rony hesitou. Então, finalmente estendeu a mão e entregou Perebas a Lupin. O rato começou a guinchar sem parar, se contorcendo, os olhinhos negros saltando das órbitas.
— Está pronto, Sirius? — perguntou Lupin.
Black já apanhara a varinha de Snape na cama. Aproximou-se de Lupin e do rato que se debatia e seus olhos úmidos pareceram, de repente, arder em seu rosto.
— Juntos? — perguntou em voz baixa.
— Acho melhor — confirmou Lupin, segurando Perebas apertado em uma das mãos e a varinha na outra. — Quando eu contar três. UM... DOIS... TRÊS!
Lampejos branco-azulados irromperam das duas varinhas; por um instante, Perebas parou no ar, o corpinho cinzento revirando-se alucinadamente, Rony berrou, o rato caiu e bateu no chão. Seguiu-se novo lampejo ofuscante e então...
Foi como assistir a um filme de uma árvore em crescimento. Surgiu uma cabeça no chão; brotaram membros; um momento depois havia um homem onde antes estivera Perebas, apertando e torcendo as mãos. Bichento bufava e rosnava na cama; os pelos das costas eriçados.
Era um homem muito baixo, quase do tamanho de Harry e Hermione.
Seus cabelos finos e descoloridos estavam malcuidados e o cocuruto da cabeça era careca.
Tinha o aspecto flácido de um homem gorducho que perdera muito peso em pouco tempo. A pele estava enrugada, quase como a pelagem do Perebas, e havia um ar ratinheiro em volta do seu nariz fino e dos olhos muito miúdos e lacrimosos. Ele olhou para os presentes, um a um, respirando raso e depressa. Harry viu seus olhos correrem para a porta e voltarem.
— Ora, ora, olá, Pedro — saudou-o Lupin educadamente, como se fosse freqüente ratos virarem velhos colegas de escola à sua volta.
— Há quanto tempo!
— S... Sirius R... Remo. — Até a voz de Pettigrew lembrava um guincho. Novamente seus olhos correram para a porta. — Meus amigos... Meus velhos amigos...
A varinha de Black se ergueu, mas Lupin agarrou-o pelo pulso, lançando-lhe um olhar de censura, depois tornou a se virar para Pettigrew, com a voz leve e displicente.
— Estávamos tendo uma conversinha, Pedro, sobre os acontecimentos da noite em que Lílian e Tiago morreram. Você talvez tenha perdido os detalhes enquanto guinchava na cama...
— Remo — ofegou Pettigrew, e Harry observou que se formavam gotas de suor em seu rosto lívido —, você não acredita nele, acredita...? Ele tentou me matar, Remo...
— Foi o que ouvimos dizer — respondeu Lupin, mais friamente. — Eu gostaria de esclarecer algumas coisas com você, Pedro, se você quiser ter...
— Ele veio tentar me matar outra vez! — guinchou Pettigrew de repente, apontando para Black, e Harry percebeu que o homem usara o dedo médio, porque lhe faltava o indicador. — Ele matou Lílian e Tiago e agora vai me matar também... Você tem que me ajudar, Remo...
O rosto de Black parecia mais caveiroso que nunca ao fixar os olhos fundos em Pettigrew.
— Ninguém vai tentar matá-lo até resolvermos umas coisas — disse Lupin.
— Resolvermos umas coisas? — guinchou Pettigrew, mais uma vez olhando desesperado para os lados, registrando as janelas pregadas e, mais uma vez, a única porta. — Eu sabia que ele viria atrás de mim! Sabia que ele voltaria para me pegar! Estou esperando isso há doze anos!
— Você sabia que Sirius ia fugir de Azkaban? — perguntou Lupin, com a testa franzida. — Sabendo que ninguém jamais fez isso antes?
— Ele tem poderes das trevas com os quais a gente só consegue sonhar! — gritou Pettigrew com voz aguda. — De que outro jeito fugiria de lá? Suponho que Aquele-Que-Não-Deve-Ser-Nomeado tenha lhe ensinado alguns truques!
Black começou a rir, uma risada horrível, sem alegria, que encheu o quarto todo.
— Voldemort me ensinou alguns truques?
Pettigrew se encolheu como se Black tivesse brandido um chicote contra ele.
— Que foi, se apavorou de ouvir o nome do seu velho mestre? — perguntou Black. — Não o culpo, Pedro. O pessoal dele não anda muito satisfeito com você, não é mesmo?
— Não sei o que você quer dizer com isso, Sirius... — murmurou Pettigrew, respirando mais rapidamente que nunca. Todo o seu rosto brilhava de suor agora.
— Você não andou se escondendo de mim esses doze anos. Andou se escondendo dos seguidores de Voldemort. Eu soube de umas coisas em Azkaban, Pedro... Todos pensam que você está morto ou já o teriam chamado a prestar contas... Ouvi-os gritar todo o tipo de coisa durante o sono. Parece que acham que o traidor os traiu também. Voldemort foi à casa dos Potter confiando em uma informação sua... E Voldemort perdeu o poder lá. E nem todos os seguidores dele foram parar em Azkaban, não é mesmo? Ainda há muitos por aí, esperando a hora, fingindo que reconheceram seus erros... Se chegarem, a saber, que você continua vivo, Pedro...
— Não sei... Do que está falando... — respondeu Pettigrew, mais esganiçado que nunca. Ele enxugou o rosto na manga e ergueu os olhos para Lupin. — Você não acredita nessa... Nessa loucura, Remo...
— Devo admitir, Pedro, que acho difícil compreender por que um homem inocente iria querer passar doze anos sob a forma de um rato.
— Inocente, mas apavorado! — guinchou Pettigrew. — Se os seguidores de Voldemort estivessem atrás de mim, seria porque mandei um dos seus melhores homens para Azkaban, o espião, Sirius Black!
O rosto de Black se contorceu.
— Como é que você se atreve? — rosnou ele, parecendo de repente o cachorro do tamanho de um urso que ele fora há pouco.
— Eu, espião do Voldemort? Quando foi que andei espreitando gente mais forte e mais poderosa do que eu? Agora você, Pedro, jamais vou entender por que não reparei desde o começo que você era o espião; você sempre gostou de amigos grandalhões que o protegessem, não é mesmo? Você costumava nos acompanhar... A mim e ao Remo... E ao Tiago...
Pettigrew tornou a enxugar o rosto; estava quase ofegando, sem ar.
— Eu, espião... Você deve ter perdido o juízo... Nunca... Não sei como pode dizer uma...
— Lílian e Tiago só fizeram de você o fiel do segredo porque eu sugeri — sibilou Black, tão venenosamente que Pettigrew deu um passo atrás. — Achei que era o plano perfeito... Um blefe... Voldemort com certeza viria atrás de mim, jamais sonharia que os dois usariam um sujeito fraco e sem talento como você... Deve ter sido a hora mais sublime de sua vida infeliz quando você contou a Voldemort que podia lhe entregar os Potter.
Pettigrew resmungava, perturbado; Harry entreouvia palavras como "extravagante" e "demência", mas não conseguia deixar de prestar mais atenção à palidez do rosto de Pettigrew e ao jeito com que seus olhos continuavam a correr para as janelas e a porta.
— Profº. Lupin — disse Hermione timidamente. — Posso... Posso dizer uma coisa?
— Claro, Hermione — disse Lupin cortesmente.
— Bem... Perebas... Quero dizer, esse... Esse homem... Ele dormiu no quarto de Harry durante três anos. Se está trabalhando para Você-Sabe-Quem, como é que ele nunca tentou fazer mal a Harry antes?
— Taí! — exclamou Pettigrew com voz esganiçada, apontando para Hermione a mão mutilada. — Muito obrigado! Está vendo, Remo? Nunca toquei em um fio de cabelo de Harry! Por que iria fazer isso?
— Vou lhe dizer o porquê — falou Black. — Porque você nunca fez nada, nem a ninguém nem para ninguém, sem saber o que poderia ganhar com isso. Voldemort está foragido há doze anos, dizem que está semimorto. Você não ia matar bem debaixo do nariz de Alvo Dumbledore, por causa de um bruxo moribundo que perdeu todo o poder, ia? Não, você ia querer ter certeza de que ele era o valentão do colégio antes de voltar para o lado dele, não ia? Por que outra razão você procurou uma família de bruxos para o acolher? Para ficar de ouvido atento às novidades, não é mesmo, Pedro? Caso o seu velho protetor recuperasse a antiga força e fosse seguro se juntar a ele...
Pettigrew abriu a boca e tornou a fechá-la várias vezes. Parecia ter perdido a capacidade de falar.
— Hum... Sr. Black... Sirius? — disse Hermione.
Black se assustou ao ouvir alguém tratá-lo assim, com tanta polidez, e encarou Hermione como se nunca tivesse visto nada parecido.
— Se o senhor não se importar que eu pergunte, como... Como foi que o senhor fugiu de Azkaban, se não usou artes das trevas?
— Muito obrigado — exclamou Pettigrew, acenando freneticamente com a cabeça na direção da garota. — Exatamente! Precisamente o que eu...
Mas Lupin o fez calar com um olhar. Black franziu ligeiramente a testa para Hermione, mas não porque estivesse aborrecido com ela. Parecia estar considerando a pergunta.
— Não sei como foi que fugi — disse lentamente. — Acho que a única razão por que nunca perdi o juízo é porque sabia que era inocente. Isto não era um pensamento feliz, então os dementadores não podiam sugá-lo de mim... Mas serviu para me manter lúcido e consciente de quem eu era... Me ajudou a conservar meus poderes quando tudo se tornava... Excessivo... Eu conseguia me transformar na cela... Virar cachorro. Os dementadores não conseguem enxergar, sabe... — Ele engoliu em seco. — Aproximam-se das pessoas se alimentando de suas emoções... Eles percebiam que os meus sentimentos eram menos... Menos humanos, menos complexos quando eu era cachorro... Mas achavam, é claro, que eu estava perdendo o juízo como todos os prisioneiros de lá, por isso não se incomodavam. Mas eu fiquei fraco, muito fraco, e não tinha esperança de afastá-los sem uma varinha... Mas, então, vi Pedro naquela foto... E compreendi que ele estava em Hogwarts com Harry... Perfeitamente colocado para agir, se lhe chegasse a menor notícia de que o partido das trevas estava reunindo forças novamente...
Pettigrew sacudia a cabeça, murmurando em silêncio, mas todo o tempo seus olhos se fixavam em Black como se estivesse hipnotizado.
—... Pronto para atacar no momento em que se certificasse de que contava com aliados... E para entregar o último Potter. Se lhes entregasse Harry, quem se atreveria a dizer que traíra Lord Voldemort? Pedro seria recebido de volta com todas as honras... Então, entendem, eu tinha que fazer alguma coisa. Era o único que sabia que ele continuava vivo...
Harry se lembrou do que o Sr. Weasley contara à mulher: "Os guardas dizem que ele anda falando durante o sono... sempre as mesmas palavras... Ele está em Hogwarts”.
— Era como se alguém tivesse acendido uma fogueira na minha cabeça, e os dementadores não pudessem destruí-la... Não era um pensamento feliz... Era uma obsessão... Mas isso me deu forças, clareou minha mente. Então, uma noite quando abriram a porta para me trazer comida, eu passei por eles em forma de cachorro... Para eles é tão difícil perceberem emoções animais que ficaram confusos... Eu estava magro, muito magro... O bastante para passar entre as grades... Ainda como cachorro nadei até a costa... Viajei para o norte e entrei escondido nos terrenos de Hogwarts, como cachorro. Desde então vivi na floresta, exceto nas horas em que saía para assistir ao Quadribol, é claro. Você voa bem como o seu pai, Harry...
Black se virou para o garoto, que não evitou seu olhar.
— Acredite-me — disse, rouco. — Acredite-me, Harry. Nunca traí Tiago e Lílian. Teria preferido morrer a traí-los.
E, finalmente, Harry acreditou. A garganta apertada demais para falar, fez um aceno afirmativo com a cabeça.
— Não!
Pettigrew caíra de joelhos como se o aceno de Harry fosse a sua sentença de morte. Arrastou-se de joelhos, humilhou-se, as mãos juntas diante do peito como se rezasse.
— Sirius... Sou eu... Pedro... Seu amigo... Você não...
Black deu um chute no ar e Pettigrew se encolheu.
— Já tem sujeira suficiente nas minhas vestes sem você tocar nelas — exclamou Black.
— Remo! — esganiçou-se Pettigrew, virando-se para Lupin, implorando com as mãos e os joelhos no chão. — Você não acredita nisso... Sirius não teria lhe contado se eles tivessem mudado os planos?
— Não, se pensasse que eu era o espião, Pedro. Presumo que foi por isso que você não me contou, Sirius? — perguntou ele, pouco interessado, por cima da cabeça de Pettigrew.
— Me perdoe, Remo — disse Black.
— Tudo bem, Almofadinhas, meu velho amigo — respondeu Lupin, que agora enrolava as mangas das vestes. — E você me perdoa por acreditar que você fosse o espião?
— Claro. — E a sombra de um sorriso perpassou o rosto ossudo de Black. Ele, também, começou a enrolar as mangas. — Vamos matá-lo juntos?
— Acho que sim — concordou Lupin sombriamente.
— Vocês não me matariam... Não vão me matar... — exclamou Pettigrew. — E correu para Rony.
— Rony... Eu não fui um bom amigo... Um bom bichinho? Você não vai deixá-los me matarem, Rony, vai... Você está do meu lado, não está?
Mas Rony olhava Pettigrew com absoluto nojo.
— Eu deixei você dormir na minha cama! — exclamou ele.
— Bom garoto... Bom dono... — Pettigrew se arrastou até Rony — você não vai deixá-los fazerem isso... Eu fui o seu rato... Fui um bom bicho de estimação...
— Se você foi um rato melhor do que foi um homem, não é coisa para se gabar, Pedro — disse Black com aspereza.
Rony, empalidecendo ainda mais de dor, puxou a perna quebrada para longe do alcance de Pettigrew. Ainda de joelhos, este se virou e cambaleou para frente, agarrando a bainha das vestes de Hermione.
— Garota meiga... Garota inteligente... Você... Você não vai deixar que eles... Me ajude.
Hermione puxou as vestes para longe das mãos de Pettigrew e recuou contra a parede, horrorizada.
Pettigrew continuou ajoelhado, tremendo descontroladamente, e foi virando lentamente a cabeça para Harry.
— Harry... Harry... Você é igualzinho ao seu pai... Igualzinho...
— COMO É QUE VOCÊ SE ATREVE A FALAR COM HARRY? — rugiu Black. — COMO TEM CORAGEM DE OLHAR PARA ELE? COMO TEM CORAGEM DE FALAR DE TIAGO NA FRENTE DELE?
— Harry — sussurrou Pettigrew, arrastando-se em direção ao garoto, com as mãos estendidas. — Harry, Tiago não iria querer que eles me matassem... Tiago teria compreendido, Harry... Teria tido piedade...
Black e Lupin avançaram ao mesmo tempo, agarraram Pettigrew pelos ombros e o atiraram de costas no chão, O homem ficou ali, contorcendo-se de terror, olhando fixamente para os dois.
— Você vendeu Lílian e Tiago a Voldemort — disse Black, que também tremia. — Você nega isso?
Pettigrew prorrompeu em lágrimas. A cena era terrível, ele parecia um bebezão careca, encolhendo-se.
— Sirius, Sirius, o que é que eu podia ter feito? O Lord das Trevas... Você não faz idéia... Ele tem armas que você não imagina... Tive medo, Sirius, eu nunca fui corajoso como você, Remo e Tiago. Eu nunca desejei que isso acontecesse... Aquele-Que-Não-Deve-Ser-Nomeado me forçou...
— NÃO MINTA! — berrou Black. — VOCÊ ANDOU PASSANDO INFORMAÇÕES PARA ELE DURANTE UM ANO ANTES DE LILIAN E TIAGO MORREREM! VOCÊ ERA ESPIÃO DELE!
— Ele estava assumindo o poder em toda parte! — exclamou Pettigrew. — Que é que eu tinha a ganhar recusando o que me pedia?
— Que é que você tinha a ganhar lutando contra o bruxo mais maligno que já existiu? — perguntou Black, com uma terrível expressão de fúria no rosto. — Apenas vidas inocentes, Pedro!
— Você não entende! — choramingou Pettigrew. — Ele teria me matado, Sirius!
— ENTÃO VOCÊ DEVIA TER MORRIDO! — rugiu Black. — MORRER EM VEZ DE TRAIR SEUS AMIGOS! COMO TERÍAMOS FEITO POR VOCÊ!
Black e Lupin estavam ombro a ombro, as varinhas erguidas.
— Você devia ter percebido — disse Lupin com a voz controlada —, que se Voldemort não o matasse, nós o mataríamos. Adeus, Pedro.
Hermione cobriu o rosto com as mãos e se virou para a parede.
— NÃO! — berrou Harry. E se adiantou, colocando-se entre Pettigrew e as varinhas. — Vocês não podem matá-lo — disse afobado. — Não podem.
Black e Lupin fizeram cara de espanto.
— Harry esse verme é a razão por que você não tem pais — rosnou Black. — Esse covardão teria olhado você morrer, sem levantar um dedo. Você ouviu o que ele disse. Dava mais valor à pele nojenta do que a toda sua família.
— Eu sei — ofegou Harry. — Vamos levar Pedro até o castelo. Vamos entregar ele aos dementadores. Ele pode ir para Azkaban... Mas não o matem.
— Harry! — exclamou Pettigrew, e atirou os braços em torno dos joelhos de Harry. — Você... Obrigado... É mais do que eu mereço... Obrigado...
— Tire as mãos de cima de mim — vociferou Harry empurrando as mãos de Pettigrew, enojado. — Não estou fazendo isso por você. Estou fazendo isso porque acho que meu pai não ia querer que os melhores amigos dele virassem assassinos... Por sua causa.
Ninguém se mexeu nem fez qualquer ruído exceto Pettigrew, cuja respiração saía em arquejos, e ele levava as mãos ao peito.
Black e Lupin se entreolharam. Então, com um único movimento, baixaram as varinhas.
— Você é a única pessoa que tem o direito de decidir, Harry — disse Black. — Mas pense... Pense no que ele fez...
— Ele pode ir para Azkaban — repetiu Harry. — Se alguém merece aquele lugar é ele...
Pettigrew continuava a arquejar às costas do garoto.
— Muito bem — disse Lupin. — Saia da frente, então.
Harry hesitou.
— Vou amarrá-lo — disse Lupin. — Só isso, juro.
Harry saiu do caminho. Cordas finas saíram da varinha de Lupin, desta vez, e no momento seguinte Pettigrew estava se revirando no chão, amarrado e amordaçado.
— Mas se você se transformar, Pedro — rosnou Black, a varinha também apontada para Pettigrew —, nós o mataremos. Concorda, Harry?
Harry olhou a figura lastimável no chão e concordou com a cabeça de modo que Pettigrew pudesse vê-lo.
— Certo — disse Lupin, subitamente eficiente. — Rony, não sei consertar ossos tão bem quanto Madame Pomfrey, por isso acho melhor só imobilizar sua perna até o entregarmos na ala hospitalar.
Ele foi até Rony, se abaixou, tocou a perna dele com a varinha e murmurou:
— Férula! — Ataduras se enrolaram à perna de Rony e a prenderam firmemente a uma tala. Depois, o professor ajudou o garoto a se levantar; Rony, desajeitado, apoiou no chão o peso da perna e não fez careta.
— Está melhor. Obrigado.
— E o Profº. Snape? — perguntou Hermione com a voz fraquinha, contemplando o professor encostado à parede.
— Ele não tem nenhum problema sério — disse Lupin se curvando para Snape e tomando seu pulso. — Vocês só se entusiasmaram um pouquinho demais. Continua desacordado. Hum... Talvez seja melhor não o reanimarmos até estar a salvo no castelo. Podemos levá-lo assim...
Lupin murmurou:
— Mobilicorpus!— Como se fios invisíveis tivessem sido amarrados aos pulsos, pescoço e joelhos de Snape, ele foi posto de pé, a cabeça pendendo molemente, como a de um títere grotesco. Ele flutuava a alguns centímetros do chão, os pés frouxos sacudindo.
Lupin apanhou a Capa da Invisibilidade e guardou-a em segurança no bolso.
— E dois de nós devemos nos acorrentar a essa coisa — disse Black, cutucando Pettigrew com o pé. — Só para garantir.
— Eu faço isso — disse Lupin.
— E eu — disse Rony decidido, mancando até o prisioneiro.
Black conjurou pesadas algemas do nada; e logo Pettigrew estava novamente de pé, o braço esquerdo preso ao direito de Lupin, o direito preso ao esquerdo de Rony. O garoto estava muito sério.
Parecia ter tomado a verdadeira identidade de Perebas como uma ofensa pessoal. Bichento saltou com leveza da cama e abriu caminho para fora do quarto, o rabo de escovinha elegantemente erguido no ar.